A saturação dos grandes centros urbanos e a melhora da renda na classe C ocorrida nos últimos anos têm motivado as maiores construtoras do país a fugir do eixo Rio de Janeiro-São Paulo para apostar em empreendimentos em cidades menores nas regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste do Brasil. Aliadas a empresas locais de menor porte, que detêm conhecimento regional, essas companhias buscam expandir sua atuação em áreas onde a oferta imobiliária ainda é pequena, os terrenos são mais baratos e a prestação se encaixa perfeitamente na renda dos que sonham com a casa própria.
A tendência já completa três anos e, segundo o diretor da área de crédito do Banco do Brasil, Walter Malieni, é um dos motores do desenvolvimento do interior. "Justamente por isso é que o país vem crescendo para dentro", afirmou. A carteira de financiamento imobiliário do BB para pessoas jurídicas aumentou 45% no primeiro trimestre em relação ao mesmo período de 2009. São Paulo lidera os empréstimos, mas Goiânia já aparece no segundo lugar em número de projetos. Pesquisa encomendada pela revista Exame ao Ibope Inteligência confirma que o segmento está em franca expansão - ela apontou aumento médio de 22% nos preços de imóveis novos e usados nos últimos 12 meses.
Conhecimento
Para a construtora Gafisa, os planos de expansão para fora dos grandes centros vieram em função da abertura do capital da empresa em 2006 e da necessidade de gerar maior valor de mercado e interesse nos futuros acionistas. O modelo escolhido, segundo o diretor de Novos Negócios da empresa, Marcelo Melo, foi buscar parcerias com as construtoras locais. "Fomos até elas para aproveitar o conhecimento que já tinham daquele mercado e mantemos o sistema até hoje", explicou.
As pequenas construtoras também se beneficiaram desse modelo, aproveitando a capacidade tecnológica e a disponibilidade de recursos provenientes do mercado de capitais trazidas pela Gafisa. "Para as empreiteiras menores, é um bom negócio, porque sem isso elas não tinham condições de tocar vários projetos simultâneos", avaliou Malieni.
Outro atrativo para a interiorização da companhia foi a perspectiva de crescimento da economia e a ascensão dos mais pobres. "Logo que nos lançamos no plano de expansão, criamos um braço voltado para a baixa renda e, ao adquirir mais tarde a (construtora) Tenda, procurávamos nos antecipar à relevância desse segmento", atestou Melo.
A Odebrecht, que entrou no segmento imobiliário a partir de 2004 com a Odebrecht Realizações Imobiliárias (OR), também criou uma marca só para atender a população de baixa renda, a Bairro Novo. De acordo com o diretor da empresa em Brasília, Sérgio Roberto de Macedo, os projetos estão voltados para áreas onde o programa do governo Minha Casa, Minha Vida deve melhorar as condições de aquisição dos imóveis.
Para a MRV Engenharia, a classe C é a mais promissora da construção civil. O diretor comercial da empresa, José Lima Nunes Melo, no entanto, destaca que a atuação no segmento abre um desafio às companhias, que é a compra de áreas mais baratas. "Terreno é nossa matéria-prima. Antes, era fácil encontrar. Agora, os grandes centros estão lotados ou muito caros", lamentou.
A pesquisa do Ibope Inteligência confirma que alguns empreendimentos ainda em construção já custam o equivalente a R$ 10 mil por metro quadrado, realidade comum no Distrito Federal. A supervalorização, que começa já no terreno, se repete em outros centros urbanos. No caso da MRV, a solução encontrada para chegar a um custo viável para a baixa renda foi procurar espaços em regiões periféricas.
Alternativas
Em Valparaíso, município goiano distante 40km de Brasília, várias construtoras encontraram uma outra forma de atrair compradores. As empresas têm planos de construir praticamente uma nova cidade de até 50 mil unidades habitacionais para quem trabalha no DF, mas não quer pagar os preços do Plano Piloto.
Algumas dessas empreiteiras compraram parte do shopping da cidade, próximo aos novos empreendimentos, e o ampliaram. Além disso, as empresas estão levando infraestrutura de saneamento básico e mobilidade viária, para evitar engarrafamentos no futuro. A construção de praças e de áreas de lazer e a revitalização do comércio local também entraram nos projetos.
Essas novas cidades também tendem a ser mais comuns no futuro, segundo Malieni. Na sua visão, mesmo que os empreendimentos sejam voltados para a alta renda, exigirão outros projetos mais acessíveis, que deverão acompanhar a construção dos primeiros. "Você acaba tendo uma necessidade de mão de obra para serviços e comércio que justifica a aproximação desses trabalhadores", considerou.