Jornal Correio Braziliense

Economia

Alta superior a 70% no preço da carne leva supermercados a negociar com fazendeiros

Nos últimos nove anos, o preço do churrasco passou a amargar a boca dos brasileiros. Entre 2002 e 2010, a inflação das maminhas, picanhas e costelas disparou mais de 70%. No bolso do consumidor, o corte da carne saltou de R$ 10 para R$ 17 o quilo. Alta expressiva foi patrocinada pela forte concentração no setor frigorífico, dominado por grandes grupos. Agora, esse oligopólio passa a ter um contraponto. Redes varejistas de supermercado estão indo ao campo, comprando rebanhos e fazendo parcerias com pequenos e médios produtores de gado. Resultado: os frigoríficos precisam disputar espaço e preço nas prateleiras com essas novas marcas de carne.

Os efeitos dessa tendência no varejo já começam a ser sentidas pelo consumidor em forma de preços menores e de promoções. Mas, como ainda é uma produção recente, a carne dos grandes abatedouros continua majoritária nos açougues. ;Os frigoríficos estão com a faca e o queijo na mão. O pequeno pecuarista tem pouco poder de barganha. Quem pode fazer alguma coisa, tanto do ponto de vista de preço quanto do ambiental, são as redes varejistas;, afirma Daniela Lerda, coordenadora da Unidade de Conhecimento Aplicado do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio).

Até 2006, os preços da proteína de gado vinham em desaceleração. Mas, em 2007, quando começou a onda de fusões e aquisições de abatedouros e frigoríficos, o custo desse alimento disparou. Alguns produtos chegaram até a superar 20% de alta. O varejo então passou a tentar reduzir a dependência em relação a esse mercado extremamente concentrado. A rede Walmart lançou o Clube de Produtores. Em vez de comprar somente dos frigoríficos, o grupo foi ao campo e fechou parcerias com pequenos pecuaristas e associações. Com a compra direta, reduziu os próprios custos e aumentou a renda do produtor. ;Hoje, representa uma quantidade expressiva da carne que comercializamos;, afirma Yuri Feres, gerente de Sustentabilidade do Walmart, sem querer dizer qual é a participação da marca própria nesse segmento.

Redução de custo
Atualmente, 6 mil pequenos produtores fornecem para a rede diversos alimentos, entre eles, carne vermelha. ;Esse projeto tem um impacto grande em desenvolvimento social, já que oferecemos treinamento e toda a produção é baseada em práticas sustentáveis para evitar prejuízos ao meio ambiente;, destaca Feres. ;Isso não é filantropia. A vantagem é que nós conseguimos trazer produtos mais frescos, com qualidade superior e a preços menores. Tudo isso ajuda a reduzir a dependência de grandes fornecedores, mas o foco principal é o consumidor;, diz.

O grupo Pão de Açúcar também seguiu na mesma linha: produção própria com impactos ambientais reduzidos. Hoje, mantém contratos com 40 fazendas e todos os animais recebem material genético selecionado. No momento, 43 mil vacas estão inseminadas. ;E vamos comprar todos os nascimentos;, explica Vágner Giomo, gerente de Desenvolvimento e Formação Técnica de Carne do grupo. ;A gente remunera pela qualidade e pelo volume;, emenda.

O produtor rural Marcelo Pimenta é um dos pecuaristas que tem acordo com o Pão de Açúcar. Para ele, as vantagens vieram em forma de modernização da fazenda, redução de custos da ração e ganhos na venda dos bois. ;Não sou uma mega-fazenda e por isso não consigo atrair um grande frigorífico. Minha produção não é interessante para eles. Quando vendo para um, o preço é menor e ainda tenho de aumentar a gordura do boi, o que é muito caro;, relatou o pecuarista, que tem uma fazenda em Bela Vista de Goiás.

Para 2011, o Pão de Açúcar pretende inseminar 55 mil vacas e, a cada ano, ampliar o rebanho em 10 mil animais. Com essa parceria com as fazendas, criou a marca Taeq, que tem entre 5% e 7% de todas as vendas de carne em 17 lojas. ;A gente programa as unidades que vão inaugurar e projeta a demanda delas para essa carne. Depois, quanto mais o cliente for comprando desse produto e se fidelizando, mais nós vamos expandindo as inseminação;, diz Fabiana Farah, consultora técnica de Carnes e Aves do Pão de Açúcar.

1 - Atestado
A certificação da carne visa a reconhecer a origem do boi e a comprovar que a criação e o abate ocorreram de acordo com práticas de pequeno impacto ambiental. No caso do Brasil, ainda indica onde os animais foram criados, para evitar a pecuária em áreas de preservação e protegidas, como em algumas regiões da Amazônia. A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) realiza um estudo para tentar implementar um programa de certificação entre os seus filiados. O objetivo é pressionar os fornecedores a venderem somente carne socioambientalmente corretas.