Jornal Correio Braziliense

Economia

Presidente da CBIC defende a continuidade do programa Minha Casa, Minha Vida

O encarecimento e a escassez de terrenos destinados à construção de moradia popular nas regiões metropolitanas empurram os conjuntos habitacionais das classes de baixa renda para áreas cada vez mais distantes. Essa transferência de grandes quantidades de trabalhadores para periferias longínquas exigirá dos governos maior capacidade de planejar a infraestrutura urbana e o transporte, na formação de minibairros.

A avaliação é do presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção Civil (CBIC), Paulo Safady Simão, que em entrevista ao Correio, explica o boom do mercado imobiliário brasileiro e a redução nos custos das obras, além de alertar para o risco de falta de material de construção e expor os avanços no financiamento da habitação de interesse social.

Simão comenta os resultados do programa Minha Casa, Minha Vida, que completa um ano na terça-feira sem que nenhuma moradia tenha sido entregue. Mas o presidente da CBIC evitar criticar a demora. O balanço preliminar mostra que 400 mil residências estão em construção e que as chaves começarão a chegar aos trabalhadores no segundo semestre de 2010. Segundo ele, será um longo período de transferência das casas aos proprietários, que só se concluirá depois de 2013.

;Temos que lutar para que esse plano não acabe. Claro que o próximo governo pode revê-lo. Mas é um programa que está dando certo e cumprirá a meta inicial de 800 mil unidades;, garante. Simão também explica como, em uma única canetada, o número de famílias sem teto no país passou de 6,8 milhões para 5,5 milhões sem que nenhuma moradia tivesse sido construída para atender à demanda reprimida.

Mercado
Até 2004, o mercado imobiliário funcionava praticamente só com o segmento classe A, no qual as pessoas possuíam dinheiro para comprar imóveis. O crédito era escasso e o público comprador, reduzido. Depois, começaram a surgir recursos, outras classes sociais voltaram a ter condições de compra da casa própria e o mercado foi inundado com financiamentos do SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo), com recursos do FGTS e com o atendimento à classe de interesse social. Antes, a baixa renda era esquecida. Trabalhava-se com a poupança, mas com faixas de renda média para cima. Há dois anos, falar que a poupança financiava famílias com renda abaixo de 10 salários mínimos era um sacrilégio. O pessoal nem examinava porque os recursos eram reduzidos.

Legislação
Com a Lei n; 10.931, de 2004, houve uma mudança profunda. Melhoraram a transparência e as garantias. Mais recursos foram movimentados e, a partir disso, o mercado passou a trabalhar com todas as faixas de renda. Em 2009, por exemplo, foram R$ 34 bilhões só em recursos da poupança e, hoje, os bancos oferecem financiamento para famílias com renda de até cinco salários mínimos. Se a pessoa tem condição de pagar, há imóvel para ele. O financiamento para a classe média também cresceu muito.

Procura
A novidade é que, agora, há procura pelo atendimento à moradia de interesse social. O FGTS passou a se concentrar no financiamento à população com renda familiar de até seis salários mínimos para baixo, onde o problema do deficit habitacional é maior, até porque os bancos estão atendendo a população com faixa de renda entre seis e 10 salários mínimos.

Transparência
As pessoas melhoraram de renda e têm maior capacidade de pagamento. Os bancos passaram a trabalhar com essas faixas de renda, os produtos (oferta de imóveis de diferentes padrões) também melhoram, as regras ficaram mais transparentes.

Minha Casa, Minha Vida 1
Temos que lutar para que esse plano não acabe. Claro que o próximo governo pode revê-lo. Mas é um programa que está dando certo e cumprirá a meta inicial de 800 mil unidades. Há um ciclo de construção. Na terça-feira, completa-se um ano do programa. Em dezembro, tínhamos 275,5 mil unidades contratadas e, hoje, temos 400 mil. São casas em edificação em diversas fases. Essas 275,5 mil contratadas até o fim de 2009 teoricamente serão entregues no fim de 2010 e as outras, nos anos seguintes.

Minha Casa, Minha Vida 2
Há condições para a entrega de 2 milhões de unidades habitacionais entre 2011 e 2014. O governo cogitava fazer mais do que 2 milhões e nós ponderamos que é preciso avançar com calma porque está faltando mão de obra e a indústria de material está com a capacidade próxima de 90% (a maioria está investindo). É mais prudente irmos com o pé no chão. Dois milhões de unidades representam 500 mil por ano e cada vez fica mais difícil porque os terrenos vão ficando mais distantes, por exemplo.

Minibairros
Fizemos uma proposta que foi aceita na segunda fase do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) ao núcleo do trabalho do governo que fará o detalhamento do Minha Casa, Minha Vida 2: trabalhar com planejamento, porque os conjuntos serão mais distantes. Faltam áreas para construção nos grandes centros, e, por isso, será necessário infraestrutura, transporte, creche, escola, posto de saúde. Na verdade, é o planejamento de minibairros. E, dois, teremos que ter estrutura educacional para orientar os moradores a viver em condomínio. Propomos que o governo contrate uma administração privada para ensinar os moradores a gerenciar condomínios habitacionais. Não tenho dúvida de que partiremos para isso.

Inadimplência
A inadimplência dos contratos novos é baixa e está inferior a 2%. Na década de 80, chegou a quase 30%. E, antes da Lei n; 10.931, variava entre 10% e 12%. Não há interesse em se tomar o imóvel de ninguém. Se uma pessoa tem problema, o banco pode chamá-la para negociar porque a legislação também prevê isso. O banco também não tem interesse em tomar o imóvel de ninguém, ele quer é vender. A novidade fica por conta do programa Minha Casa, Minha Vida, que supre uma lacuna enorme, que é a da moradia de interesse social, principalmente para famílias com renda inferior a três salários mínimos.

Custos da obra
Foram reduzidos impostos, taxas de cartório, taxas de administração e isso provocou queda significativa dos custos marginais das obras. Os impostos federais caíram de 7% para 1% e isso levou muitos municípios a mexerem no ISS (Imposto sobre Serviços). Os gastos com cartório também foram reduzidos, chegando, em alguns casos, a zero. Os juros tiveram uma diminuição dramática, juntamente com as taxas cobradas pelas prefeituras. Na faixa de renda até três salários mínimos, a cobrança do seguro foi eliminada e, agora, há um fundo para garantir a inadimplência. Ele é mantido com 0,5% do valor da prestação e funciona. Tudo isso deixou o custo total da obra e criou um subsídio no Orçamento da União, sem o qual não seria possível atender famílias de baixa renda.

Deficit habitacional
No cálculo do deficit, há o item inadequação, que são as moradias impróprias para habitação, que não preenchem os preceitos mínimos para alguém morar. Isso continua aumentando, e estamos falando de barracos, favelas, palafitas e moradias em encostas. O outro grande componente é a coabitação, quando há até quatro famílias morando em uma mesma casa. Os pesquisadores da Fundação Getulio Vargas voltaram a perguntar se essas pessoas gostariam de mudar e ter a casa própria. Nesse questionamento, quem respondeu que está satisfeito dividindo a casa saiu da estatística. Com isso, o deficit caiu de 6,8 milhões para 5,5 milhões. Ou seja, não se criou nenhuma casa e o deficit caiu expressivamente. Eu perguntei: ;Essas pessoas falaram isso mesmo?; E me responderam que é verdade, porque algumas dessas famílias moram com aposentados que assumem as despesas com água, luz e tributos. Outra mudança é que recentemente ocorreu uma correção no dado. Nessa revisão, houve redução de 500 mil famílias no cálculo do deficit.

Cidadania
Um estudo das Nações Unidas mostra a diferença da evolução dos jovens cujas famílias possuem casa própria em comparação com aqueles que não possuem. Os impactos são na saúde, na educação e na questão social. O que se constatou foi que os jovens que crescem em casa própria têm um lugar para estudar, um endereço fixo e não precisam ficar na rua. Quando essa casa possui saneamento e água tratada, a evolução na saúde fica clara. É impressionante como faz diferença, esse jovem cuja família possui uma residência própria e com acesso a infraestrutura tem a oportunidade de uma vida mais cidadã.