O Banco Central seguiu o script traçado pelo mercado e manteve a taxa básica de juros (Selic) em 8,75% ao ano. Mas, apesar de esperada, a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) - a primeira com o presidente do BC, Henrique Meirelles, filiado a um partido político - reforçou o discurso de uma ala de economistas de que, antes de elevar os juros, o BC aumentará os depósitos compulsórios, afrouxados em outubro do ano passado, auge da crise mundial. Na opinião do economista Paulo Leme, diretor do banco Goldman Sachs, é muito provável que, já em dezembro próximo, o BC pegue de volta parte dos R$ 100 bilhões liberados depois do estouro da bolha imobiliária americana para suprir a falta de crédito no sistema financeiro nacional.
[SAIBAMAIS]"A economia brasileira vive um excelente momento. Com o dinamismo atual, que resultou em crescimento entre 2% e 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre, está claro que chegou o momento de se retirarem os estímulos dados pelo governo. E isso passa pelo aumento dos compulsórios, num primeiro momento, e, depois, pela alta dos juros", disse Leme. Segundo ele, no cenário mais provável é de que a Selic só suba a partir do último trimestre de 2010, quando, efetivamente, o crescimento econômico poderá resultar em pressões inflacionárias. "Estamos projetando uma alta de 3,25 pontos percentuais, dos atuais 8,75% para 12%", afirmou. "Mas não descartamos a possibilidade de os juros já aumentarem a partir do segundo trimestre", acrescentou.
No entender do diretor do Goldman Sachs, como não há perspectivas de o governo reduzir os gastos correntes (com pessoal e com o funcionamento da máquina) nem de os bancos públicos tirarem o pé do acelerador do crédito, caberá ao BC reverter os estímulos monetários na tentativa de manter a inflação dentro das metas. Ele ressaltou que, nesse momento, o aumento dos compulsórios tenderá a reduzir o crescimento do crédito e, por tabela, a demanda doméstica. "Como o BC injetou quase R$ 100 bilhões no mercado, estamos falando de 72% da base monetária (quantidade de dinheiro em circulação na economia). Multiplicado, esse dinheiro significa R$ 150 bilhões para crédito", explicou.
Suspense desfeito
Para Ricardo Denadai, economista sênior da Santander Asset Management, o aumento dos compulsórios realmente está no radar do BC. "Mas é importante ressaltar que a alta dos compulsórios não substitui a elevação dos juros, que tem efeito mais consistente para o controle da inflação", afirmou. A seu ver, a alta da Selic será inevitável, devido à forte recuperação da atividade econômica. "Acreditamos que os juros vão começar a subir a partir de abril do ano que vem. Apostamos em uma elevação de três pontos percentuais, para 11,75%. Esse movimento será suficiente para manter a inflação próxima de 4,5% no ano que vem e em 2011, mesmo com o PIB avançando cerca de 5%", frisou.
No atual momento, o mais importante na visão de Denadai, foi que o BC optou por soltar um comunicado sem sustos para justificar sua decisão. Havia um suspense entre os analistas sobre a possibilidade de o Copom soltar uma nota muito diferente da que se viu na reunião de setembro, quando se interrompeu o processo de baixa dos juros. "Qualquer palavra muito diferente do comunicado anterior poderia ser mal interpretado. Certamente, o BC usará a ata do Copom, onde há mais espaço, para traçar um quadro mais claro de como está vendo a economia, em especial, a força do mercado de trabalho", disse. "O BC não quis sancionar a euforia do mercado", emendou.
Pelas projeções da economista Zeina Latif, do Banco ING, não há riscos inflacionários à vista pelo menos até o fim de 2010, quando os juros deverão subir. Segundo o economista-chefe da SLW Asset Management, Carlos Thadeu Filho, não há porque os juros subirem ao longo do ano que vem, pois a inflação não vai superar o centro da meta, de 4,5%. Foi justamente essa perspectiva que levou presidente da Federação do Comércio do Rio de Janeiro (Fecormércio-RJ), Orlando Diniz, a criticar a postura conservadora do Copom em manter a Selic em 8,75%. Para o BC, essa taxa é compatível com um cenário inflacionário benigno e para a recuperação da atividade econômica.