A decisão do governo de taxar os rendimentos da caderneta de poupança que excederem os R$ 50 mil foi acertada, mas deve ser encarada como um paliativo. ;É uma metodologia para esse movimento de transição. Mas, provavelmente no futuro, esse modelo terá de ser repensado;, afirmou o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco Cappi, em entrevista concedida durante visita ao Correio. O executivo comentou que o país deverá crescer ;ao redor de 6%; no próximo ano, elogiou o mercado interno e antecipou estudo da área econômica do banco que projeta que os investimentos no setor produtivo deverão girar em torno de R$ 1,3 trilhão até 2012. Leia os principais pontos da entrevista.
Crise econômica
A crise teve dois momentos. E, curiosamente, o momento mais agudo dela fez aniversário ontem (dia 15), quando se passou a ter quebras de bancos de investimentos, como o Lehman Brothers, e o mundo entrou em um grau de expectativa muito grande. Sentimos que vínhamos crescendo a taxas muito consistentes até setembro de 2008, e a partir daí houve um rearranjo do cenário. Com esses olhos em 2009, a visão do Bradesco é bastante otimista.
Mercado interno
A crise pegou o Brasil em condições de sustentabilidade. Nós, praticamente, estávamos com a dívida externa zerada, com um caixa de reservas externas acima de US$ 200 bilhões, e o mercado interno deu condições para o governo exercer uma política anticíclica muito eficiente. O governo flexibilizou os recolhimentos de depósito compulsório, criou instrumentos financeiros que deram liquidez a pequenos e médios bancos, acionou o Fundo Garantidor de Crédito, o FGC, que deu o suporte, e fez a intermediação da venda de carteiras entre instituições financeiras. Então nós praticamente não sentimos a crise (da forma) como a Europa e os Estados Unidos ainda sentem.
Fragilidades
O que nós tivemos, e isso ficou no passado, foram alguns desajustes setoriais. Aquelas empresas que possuíam uma cadeia produtiva cujo círculo final acabava no mercado externo, principalmente as commodities (produtos com cotação internacional) agrícolas e metálicas, passaram por uma fase de ajuste de preço. Se compararmos o níquel, que tinha um valor histórico médio de US$ 17 mil a tonelada, esse número quase que bateu a US$ 40 mil, voltou a US$ 9 mil e hoje está em US$ 18 mil. A gente percebe que o mercado consumidor de commodities metálicas retomou o nível anterior.
Crescimento
Passamos um semestre sinalizando até um decréscimo do PIB (Produto Interno Bruto). As nossas projeções sempre estavam olhando o PIB deste ano ao redor de zero, e agora estamos tendo um segundo semestre que deve ser um semestre muito favorável. Anualizado hoje, o Brasil está crescendo a taxas superiores a 7%. Então é fácil imaginar que o ano que vem teremos um crescimento ao redor de 6%. A crise, hoje, é olhada pelo retrovisor. Nós fomos o último país a sentir a crise e nunca a sentimos no mesmo nível em que outros países chegaram a sentir, nós não sentimos. E fomos o primeiro a sair dela.
Poupança
A visão (da taxação dos recursos que excederem R$ 50 mil na poupança) é positiva. O governo escolheu uma metodologia para esse movimento de transição. Não poderíamos deixar como está e o governo foi pró-ativo ao criar uma tributação e fazer uma travessia. Mas, provavelmente, no futuro, esse modelo terá de ser repensado. Esse é um modelo de transição, porque o Brasil está dando certo e vai dar certo. O Brasil está no cenário internacional. E é muito previsível, em qualquer horizonte, em cinco anos, que a Selic (taxa básica de juros) tenha um viés de queda muito acentuada. Em um universo de dez anos, a Selic vai estar nivelada com taxas de juros internacionais. As soluções deverão ser outras.
Investimentos
Nossos economistas fizeram um estudo mostrando que, até 2012, se está esperando um investimento superior a R$ 1,3 trilhão no Brasil. No setor de infraestrutura urbana, e o meio circulante à habitação, a estimativa é de R$ 535 bilhões. O programa de investimentos no petróleo é de R$ 269 bilhões até 2012. Energia entra com R$ 141 bilhões e telecomunicações com R$ 77 bilhões. O país que vai ter a capacidade de investir mais de R$ 1,3 trilhão ; significa que a taxa de investimentos da economia vai se alterar, significa que está aumentando a taxa de investimentos do setor privado.
Baixa renda
Nós tivemos um fenômeno que foi fundamental para podermos vencer a crise: a incorporação de 20 milhões de pessoas que migraram da classe E em direção às classes C e D. O mercado interno passou a ser um ativo, quase que uma segurança para esse movimento de transição no Brasil. Nesse cenário, o Bradesco está posicionado, e até é o mote da nossa campanha, chamada de presença. Nós continuamos a investir. Esse ano nós já investimos R$ 4 bilhões. Investimos R$ 1,4 bilhão na aquisição do Banco IBI, que faz toda a operação de serviço financeiro da rede C do Brasil. Investimos R$ 1,4 bilhão em sistemas e ampliação da infraestrutura. Então hoje estamos atendendo a 93% dos municípios brasileiros. Estamos presentes em mais de cinco mil municípios e talvez essa presença nacional seja o melhor atestado para refletir um pouco do espírito com que o Bradesco olha para frente.
SulAmérica Seguros
Essa conversa (proposta de compra da SulAmérica Seguros pelo Bradesco) nunca existiu. O Bradesco tem um modelo que é um dos mais bem sucedidos no mundo, de integração entre bancos e seguros. Temos uma frase, que internamente virou quase que um mantra, que o Bradesco é uma moeda, uma moeda que tem duas faces. Uma face são os serviços financeiros, que constitui todos os serviços bancários, de crédito e de financiamento. Uma outra é o mundo da seguridade, que são os três elos básicos: seguros, previdência e captalização. Temos um modelo que se consolidou desde 1984, quando o Bradesco adquiriu 100% da antiga Atlântica Boa Vista. De 1984 até hoje, o Bradesco construiu o maior grupo segurador da América Latina.