Estados, municÃpios e estatais fizeram o que o governo federal não conseguiu em junho: economizaram recursos suficientes para que o setor público consolidado fechasse o mês com superávit primário. Enquanto a União contabilizou rombo de R$ 1,1 bilhão, o pior resultado para meses de junho desde 1998, os governos regionais apresentaram saldo positivo de R$ 2,5 bilhões e as estatais, de R$ 1,9 bilhão.
Feito o encontro de contas, o superávit ficou em R$ 3,3 bilhões, recuando 67% ante junho de 2008. Já o saldo acumulado em 12 meses, de R$ 59,9 bilhões, cravou 2,04% do Produto Interno Bruto (PIB), o menor patamar desde dezembro de 2001, situando-se, pela segunda vez seguida, abaixo da meta de 2,5% prometida pelo governo. Antes da crise, o compromisso era com uma economia de 3,8% do PIB para o pagamento de juros da dÃvida.
Esses números dispararam o sinal de alerta do mercado. Há o temor de que a ânsia gastadora do governo, embalada pelo discurso da necessidade de o Estado intervir na economia para amenizar os efeitos da crise mundial, leve a um descontrole fiscal, estimulando um processo inflacionário que obrigaria o Banco Central a aumentar a taxa básica de juros no ano que vem.
Essa visão, no entanto, é considerada alarmista pelo governo. Segundo o chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, é preciso considerar que os números atuais das contas públicas se referem a um perÃodo de crise, que derrubou a atividade econômica e fez o governo abrir mão de receitas, por meio do corte de tributos para setores considerados estratégicos, com o automobilÃstico. E mais: mesmo menor, o superávit de junho, de R$ 3,3 bilhões, ficou acima das estimativas do mercado, que variavam entre R$ 1,3 bilhão e R$ 2,8 bilhões.
"Toda a polÃtica anticÃclica ficou com o governo federal. Por isso, as receitas de estados e municÃpios não diminuÃram. Pelo contrário, a arrecadação com o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) aumentou 2,8% entre janeiro e maio deste ano em comparação com o mesmo perÃodo de 2008", afirmou Altamir. Ele ressaltou ainda que, no caso das estatais, os números são muito voláteis. As empresas tiveram superávit em junho, mas estão com déficit acumulado de R$ 1 bilhão nos primeiros seis meses do ano.
O economista do BC insistiu: "Posso garantir que mantemos o compromisso de fechar o ano com superávit de 2,5% e tudo indica que cumpriremos a meta de 3,3% no ano que vem. Além da retomada da atividade, que estimulará a arrecadação, veremos o impacto da queda dos juros (iniciada em janeiro deste ano)". Segundo ele, não há descontrole fiscal. "Passada a crise, os resultados (das contas públicas) tendem a melhorar", assegurou.
Despesa
O discurso de Altamir não convenceu o economista Cristiano Souza, do Banco Santander. "O superávit primário em queda só está refletindo o aumento de gastos com o governo, sobretudo com o funcionalismo público. As receitas com impostos caÃram por causa da crise, mas as despesas com a máquina continuaram aumentando", destacou. "Portanto, isso não é o que podemos chamar de polÃtica anticÃclica. O combate à crise teria que ser feito por meio do aumento dos investimentos", frisou. "Não dá para dizer que a situação fiscal está um descalabro, mas que está desconfortável, está", emendou
Tanto para Souza quanto para o professor Ricardo Rocha, do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), diante da atual deterioração do superávit primário e do processo lento de retomada a atividade econômica (que produzirá mais arrecadação), não há como o governo cumprir a meta deste ano, de 2,5%, nem a de 2010, de 3,3% do PIB. "Isso só seria possÃvel se o governo suspendesse todos os aumentos para os servidores e promovesse cortes severos nas despesas com o funcionamento da máquina. Mas isso não vai acontecer. Em agosto, há uma nova rodada de reajustes para o funcionalismo", destacou Rocha.