O presidente Luiz Inácio Lula da Silva exigiu nesta segunda-feira na Organização Internacional do Trabalho (OIT) uma atitude mais dura para com os paraísos fiscais e os especuladores que causaram a crise econômica atual, ao mesmo tempo em que pediu uma nova ordem econômica mundial que recompense a produção e não a especulação.
"Entendemos que esta crise exige das empresas, dos trabalhadores e dos governos uma atitude mais dura", declarou Lula em Genebra, na abertura de uma reunião da OIT dedicada às consequências da recessão econômica. "Não se pode conviver com paraísos fiscais", declarou Lula na Suíça, justamente um país que figura na lista cinza de paraísos fiscais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômicos (OCDE), mas sem citar nomes.
"Não se pode conviver com um sistema financeiro que especula com papéis e papéis sem gerar um posto de trabalho, sem produzir um sapato, uma camisa ou até uma gravata", completou Lula, que foi ovacionado pelos representantes de 183 Estados, e de várias empresas e sindicatos.
"Quem trabalha com papel, vendendo papel, comprando papel, sem produzir nada, acaba por quebrar um dia. E foi isto o que aconteceu", lamentou Lula, na véspera de uma viagem para a Rússia, onde participará na primeira reunião de cúpula dos BRIC, que reúne quatro potências emergentes (Brasil, Rússia, Índia e China).
Além de Lula, o presidente francês Nicolas Sarkozy e a presidente argentina Cristina Kirchner também investiram contra os especuladores e pediram uma regulação maior dos mercados. Igualmente exigiram mudanças para que não ocorra novamente uma crise como a atual.
A presidenta argentina pediu uma estratégia global contra a crise que leve em conta a economia real mediante uma maior regulação, mais investimentos em infraestruturas e a participação da OIT no G20.
Já Sarkozy insistiu numa revisão geral para que reconstruir um sistema financeiro orientado para os empresários e não para os especuladores. "Eu digo a todos os chefes de Estado e de Governo do G20 que para cada um de nós é uma responsabilidade histórica", declarou o presidente francés.
O presidente brasileiro, por sua vez, aproveitou a visita a Genebra para criticar outra vez a atitude das instituições financeiras multilaterais. "Nas crises dos anos 80 e 90, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (Bird) tinham todas as soluções para os países pobres. Agora, quando a crise acontece nos Estados Unidos, no Japão e na Europa, nem o FMI nem o Banco Mundial têm proposta alguma para solucionar a crise", criticou.
Lula também criticou os bancos, especialmente as agências de classificação de risco.
"Bancos importantes que medem todo o dia o risco no Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai, Peru, África do Sul, Angola, Moçambique, ou seja, os bancos que eram tão especialistas em medir nosso risco, não pararam nem um só instante para medir os próprios riscos. E quebraram", ironizou.
"Nós, os mortais, os seres humanos normais, nunca conseguimos entender por que o petróleo saiu dos 30 dólares para os 130 dólares.
"Quem trabalha com papel, vendendo papel, comprando papel, sem produzir nada, um dia quebra. E isso aconteceu. Esse momento exige de empresários, de trabalhadores, de governos uma atitude mais dura. Não podemos conviver com paraísos fiscais. Não podemos viver com um sistema financeiro que especula com papéis sem gerar postos de trabalho, sem produzir um sapato, uma camisa ou uma gravata".
Mais cedo, em um discurso no Conselho de Direitos Humanos da ONU, Lula defendeu justamente uma nova ordem mundial, que recompense a produção e não a especulação.
"Como dirigente de um país em desenvolvimento, espero que da crise surja uma nova ordem internacional que recompense a produção e não a especulação", afirmou o presidente do Brasil.
"Esta nova ordem também deve respeitar as normas meio ambientais viáveis e transformar o comércio internacional em um instrumento de desenvolvimento para uma distribuição mais justa da riqueza", completou.
Também denunciou no discurso, muito aplaudido pelos membros do Conselho, os "efeitos perversos" da crise, que afeta os emigrantes e os mais pobres, que não são os responsáveis pela recessão que afeta vários países.
Lula recordou que prestar atenção aos direitos humanos é uma parte indispensável de qualquer estratégia para superar os efeitos da crise mundial que explodiu em setembro de 2008.
"A crise financeira, que nasceu da desregulamentação das economias mais ricas, não é um pretexto para estimular o descumprimento das obrigações de cada Estado com a promoção e a proteção dos direitos humanos", explicou o presidente.
"Também não deve levar ao descumprimento dos compromissos com os mais necessitados", completou, antes de lembrar que o Congresso do Brasil acaba de aprovar uma lei que regulariza a situação de milhares de emigrantes.