Imagine consumidores exigentes, com alto poder aquisitivo e que gostam de comprar. Agora, lembre-se de que esse mercado tem potencial de R$ 111 bilhões anuais. Se o primeiro pensamento foi associado a algum pequeno país emergente, pode mudar de idéia. Trata-se do mercado GLS brasileiro.
A sigla (gays, lésbicas e simpatizantes) foi adotada para definir o nicho que engloba uma população economicamente ativa de 9,3 milhões de brasileiros. Os números podem ser ainda maiores, pois não levam em consideração os bissexuais, travestis e transexuais, que completam a sigla internacional LBGTT. Mundialmente, as cifras são mais robustas, assim como os investimentos. Nos EUA, por exemplo, os gastos com anúncios ultrapassaram US$ 220 milhões na mídia impressa gay e US$ 27 milhões na mídia online.
Nesse campo são poucas as pesquisas, especialmente em solo verde-amarelo. ;Diferentemente dos outros segmentos, o dos homossexuais não se baseia em nenhuma característica física perceptível, simples de mensurar;, explicam Franco Reinaudo e Laura Bacellar, autores do livro O mercado GLS.
Os levantamentos existentes levam a crer que 10% da população mundial, ou seja, 660 milhões de pessoas usam o pink money (dinheiro rosa). No Brasil, onde também vale a proporção, são cerca de 19 milhões de habitantes que se declaram gays ou lésbicas. Demorou, mas as empresas começaram a ver com outros olhos esse público. Sai de cena a percepção marginalizada e discriminatória e entra a tolerância, o respeito e a percepção de que diversidade pode ser um bom negócio.
;As coisas começaram a mudar no início dos anos 90, mas só agora o mercado começa a mostrar sinais de consolidação;, analisa Milton Santos, de 30 anos, presidente da ONG Estruturação, maior grupo LBGTT de Brasília. Ele conta que há 10 anos havia uma boate gay em Brasília e, as que eventualmente abriram, não sobreviveram. ;Hoje, há mais opções e mesmo assim são limitadas;, diz Santos.
A invisibilidade é um obstáculo na percepção dos clientes em potencial. Segundo o escritor Reinaudo Franco, que pesquisou o mercado GLS, ;apenas 3% dos homossexuais adotam papéis de gênero muito diferentes da norma social, ou seja, gays que se comportam de maneira afeminada ou lésbicas que assumem posturas masculinizadas;.
Aspectos como idade, ambiente familiar, local de moradia, educação e religião influenciam os homossexuais a assumirem sua opção e, por conseqüência, se tornarem consumidores do segmento GLS. Além disso, outras questões precisam ser levadas em consideração, como as diversidade dentro do grupo: assim como ocorre com os heterossexuais, formam-se tribos com características específicas.
Ignorar as múltiplas possibilidades do mercado é um erro comum entre empresários que querem investir nesse nicho. ;A idéia surge porque a pessoa conhece muitos homossexuais e acredita que esse é seu público consumidor. Nem chega a pensar em avaliar o mercado, independentemente do empreendimento;, comenta Ricardo Lucas Vianna, de 23 anos.
Lucas fez da diversão uma forma de renda. Graduado em marketing, ele mantém com três amigos uma agência de comunicação especializada no segmento. Entre os produtos está o portal ParouTudo. Referência no Centro-Oeste, o site tem mais de 40 mil acessos mensais e está hospedado no Mix Brasil, da UOL.
Turismo
A forma de tratamento dada ao público GLS é parte do treinamento oferecido pelo Naoum Plaza a seus funcionários. ;Ensinamos nossos funcionários a excluir completamente os preconceitos;, revela Helen Coelho, gerente de recepção do hotel. Desde a reserva, a equipe é orientada a deixar o consumidor à vontade. ;Perguntamos sempre se o cliente quer uma cama de casal ou de solteiro;, diz.
No Brasília Alvorada Hotel, o antigo Blue Tree, o público GLS é crescente. Por mês, cerca de 20 casais se hospedam lá. ;A maioria é estrangeira. Gente que passa por Brasília como porta de entrada para Pirenópolis e a Chapada dos Veadeiros;, afirma Daniel Braga, coordenador de serviços especiais.
Famosa em Brasília, a Festa da Lili é outro evento que faz parte do grupo de negócios voltados ao público GLS. Criada há três anos pela promotora Liliane Santana, a balada virou um marco na noite brasiliense não apenas para os casais homossexuais como também para o público heterossexual. ;Hoje, é uma festa mista;, garante Liliane. Cada evento é uma superprodução. A decoração vem de Curitiba e 80 funcionários são contratados incluindo um médico e uma equipe de UTI Móvel.
Desde que mudou para Brasília, Cristina da Cunha Cruz, de 32 anos, sentia falta de um lugar tranqüilo e aconchegante para ouvir música e curtir a noite com sua namorada. A busca terminou quando as duas resolveram montar o bar Dedo de Moça, em Taguatinga. ;Juntamos a fome com a vontade de comer;, comenta.
A liberdade sexual e a quebra de preconceitos com relação aos gays e lésbicas beneficiam outro tipo de mercado: o erótico. Os antes marginalizados sex shops ganham espaço e público: tanto hétero como homossexuais. ;Pelo menos 30% das minhas vendas são para homossexuais;, avalia Ana Cláudia Fraga, proprietária da Magia do Amor, loja erótica aberta há 9 anos. Na ótica de Ed Willian, da Idéia Sexy, a turma GLS prefere comprar pela internet para priorizar a discrição e conforto. O consumo de fragrâncias e objetos que estimulam o prazer por parte de homossexuais representa 60% do faturamento da Erotika Sex Shop.