Jornal Correio Braziliense

Economia

Sem trigo argentino, pão fica mais caro

Suspensão de exportações complica situação da indústria brasileira

A Argentina voltou a suspender as exportações de trigo para o Brasil. Os registros, que deveriam ser abertos nesta semana para possibilitar os embarques em 5 de maio, foram cancelados pelo governo, surpreendendo mais uma vez os moinhos brasileiros. Esse adiamento complica ainda mais a situação da indústria brasileira, que, com estoques para até o final de maio, vai ter de buscar o cereal em outros mercados, principalmente na América do Norte. Além de ter preço mais alto, o trigo dos EUA e do Canadá também tem frete mais caro. E, enquanto uma importação de trigo argentino chega ao Brasil em menos de uma semana, a dos EUA demora pelo menos 40 dias. Chamado às pressas para a reunião nesta quarta-feira (23/04), em Buenos Aires, entre representantes dos dois governos, Luiz Martins, presidente do Conselho Deliberativo da Abitrigo (Associação Brasileira da Indústria do Trigo), diz que o fechamento das exportações, desta vez, é por tempo indeterminado. O resultado será aumento de custos para as indústrias e, conseqüentemente, mais repasse de preço ao consumidor. O que afetará ainda mais a inflação. Nos últimos 12 meses o pãozinho subiu 17% e a farinha de trigo 18% para o consumidor paulista, segundo a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). Na semana passada, a indústria já havia acenado com novos reajustes de 12% no pão e de 10% a 15% nas massas e nos biscoitos. Lawrence Pih, do moinho Pacífico, conta que moinhos esperavam o trigo argentino, mais barato, para contrabalançar com o que terão de importar de outros países, acrescenta Pih. "Com isso, poderíamos fazer uma melhor média de preços. Agora a situação está complicada". Pih diz que o governo tem de repensar o volume livre da TEC (Taxa Externa Comum, de 10%) a ser importado. O governo já liberou um milhão de toneladas, que devem ser importadas até julho. O aumento da cota sem a TEC é vital para a indústria, diz Christian Saigh, diretor do Sindustrigo (Sindicato da Indústria do Trigo). Na sua avaliação, o governo deveria liberar ao menos mais um milhão de toneladas antes da safra nacional, que ocorre no segundo semestre. O governo argentino inibe as exportações de trigo, mas impõe menos restrições às de farinha. As importações brasileiras do produto somaram 201,3 mil toneladas e US$ 73,6 milhões no primeiro trimestre deste ano ; o equivalente a R$ 121,9 milhões. O volume supera em 50% o de igual período de 2007, e os gastos, em 131%, de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento. Se o governo argentino permitisse as exportações, Pih diz que o trigo chegaria por US$ 400 a tonelada (ou R$ 662) em Santos. Já o dos EUA chega a US$ 460 (R$ 762). Além desses valores, os moinhos gastam outros US$ 32 (R$ 53) por tonelada com a colocação do produto no mercado interno. Os problemas no setor de trigo ocorrem porque a demanda global cresceu, houve quebra de safras em alguns dos principais produtores mundiais e os estoques são os menores das últimas décadas. O resultado final para o Brasil, que importa até 70% do trigo que consome, é a maior crise do setor nos últimos 20 anos. Os preços do trigo duplicaram no mercado externo, o que exige o dobro do fluxo de caixa para os moinhos brasileiros obterem o mesmo volume de produto importado.