Jornal Correio Braziliense

Economia

Bolada que Gerdau pagou a funcionários gera ações na Justiça

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Falta espaço no Fórum do município de Ouro Branco, na região central do estado de Minas Gerais, para abrigar as pilhas de papéis que se formaram numa escalada de processos apresentados ao Judiciário municipal nos últimos cinco meses. Até a semana passada, 2 mil queixas se juntaram ao acervo que existia em dezembro, exigindo trabalho dobrado dos funcionários e das mesmas duas autoridades locais, um juiz e um promotor de Justiça. Mais da metade das ações envolve a partilha de bens e as pensões familiares pagas por ex-maridos contemplados na bolada de R$ 675 milhões oferecidos pelo grupo siderúrgico Gerdau por ações da Gerdau Açominas que estavam em mãos de empregados e ex-empregados desde a época da privatização da empresa, há 14 anos. O negócio foi acertado em novembro de 2007 entre a Gerdau e o clube de investimentos dos trabalhadores da Açominas (CEA), responsável por gerenciar o capital acionário deles na usina, principal fonte da receita tributária do município de 32 mil habitantes. Para os sócios, a satisfação foi como ganhar numa espécie de loteria. Cada um dos acionistas fundadores do CEA vai receber R$ 194.033, 74. Os não fundadores embolsarão R$ 64.591,45, dinheiro que será pago em 36 parcelas corrigidas à base de 102% da variação do CDI (Certificado de Depósito Interbancário). No fórum municipal lotado de processos, pelo menos outras 700 ações judiciais - estimativa difícil de ser feita, com o aumento do ritmo de trabalho no setor encarregado de encaminhá-los a julgamento - foram apresentadas por empregados e ex-empregados da Gerdau Açominas contra o CEA. Eles não foram incluídos na operação milionária, por terem vendido suas ações ao próprio clube antes mesmo de a empresa se reerguer da crise que quase a levou a falência, no fim dos anos 90, ou durante os últimos anos, sem imaginar uma proposta de compra dos papéis tão vantajosa. Convictos de que amargaram prejuízo, questionam a compra das ações pelo CEA. As desavenças correm boca a boca nas rodas de conversa nas ruas, mas encontrar alguém disposto a falar abertamente sobre a polêmica é uma tarefa que parece impossível. O promotor José Lourdes de São José, no cargo desde 1992, já deu o seu veredito. A quem o procura para pedir que interfira nas ações judiciais contra o CEA, vai logo avisando: essa é uma questão patrimonial, particular, em que não cabe a intervenção do Ministério Público. A radiopeão que circulava entre os empregados da Açominas nos anos mais duros da tentativa de recuperação da empresa levou trabalhadores a acreditar que uma falência era irreversível e, assim, se desfazerem das ações. Muitos apuraram dinheiro que acabou pagando a compra de quatro pneus anos atrás. Se não tivessem ouvido os espertinhos de plantão, hoje, poderiam estar rodando, como os colegas fazem questão de lembrar, num automóvel zero quilômetro. Justificativa semelhante a do promotor José Lourdes foi dada por Raimundo Nonato Roque de Carvalho, presidente do sindicato local dos metalúrgicos, a um grupo de ex-mulheres de trabalhadores da siderúrgica que pediram ajuda da instituição para convencer os ex-maridos a incluir o novo patrimônio que os sortudos estão embolsando na partilha de bens já feita ou em andamento. "São casos de pendência familiar, não se trata de assuntos para o sindicato atuar. Recomendamos que essas pessoas procurarem um advogado", diz Carvalho.