O ativismo on-line dos fãs de pop coreano não é novidade. No entanto, nas últimas semanas os stans - como são chamados os ávidos fãs do gênero — movimentaram a internet com reivindicações políticas e sociais.
“O fandom do k-pop internacional e além-Ásia. É ativo há pelo menos duas décadas, quando a Onda Coreana começou a se expandir para o mercado global de forma mais concreta e bem-sucedida. Como um grupo formado por cidadãos de diferentes idades, raças, gênero, contextos culturais, religiões e nacionalidades, os fãs fazem parte das sociedades nas quais estão inseridos e estão suscetíveis a diversas questões sociais que lhes são caras ou problemáticas. O ponto aqui é que ser fã não significa que é necessário estar diretamente envolvido em lutas de causas sociais, que, para boa parte dessas pessoas, fazer parte de uma comunidade em que elas possam se expressar e serem aceitas do seu jeito é prioritário, revolucionário e, obviamente, importante como indivíduos e partes ativas da sociedade”, conta a doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense, com pesquisa focada em Estudos asiáticos e Hallyu, Daniela Mazur.
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Apesar de não ser um grupo homogêneo, nos últimos dias, a comunidade se uniu para levantar algumas pautas. Nos Estados Unidos, os k-poppers tentaram esvaziar o comício do Presidente Donald Trump, em Oklahoma, em 20 de junho. Os fãs do gênero junto aos usuários do TikTok afirmaram ser responsáveis pelo baixo público do evento. Eles fizeram o registro on-line para participar do palanque, mas não compareceram a fim de boicotar o comício. No entanto, o porta-voz de Trump, Tim Murtaugh, afirmou em comunicado que o registro ao comício não significava presença.
O uso do espaço on-line para trocas e consumo dos conteúdos de k-pop é essencial para os fãs. Eles usam a internet para troca de informações, organização de eventos, tradução de conteúdo e outras atividades que rondam os fãs-clubes. “Subir hashtags, decifrar algoritmos e potencializar o engajamento são conhecimentos aprendidos e utilizados pelos fãs, que têm como grande objetivo usufruir e difundir o k-pop”, pontua a doutoranda.
Com a proximidade da internet, no mês passado, os stans também protestaram nas redes sociais contra o racismo e a violência policial durante o ápice da onda de protestos Black Lives Matter — em tradução livre, vidas negras importam. A polícia de Dallas pediu para os cidadãos enviarem vídeos de atividades ilegais de manifestantes durante os protestos. E os ativistas encheram o software com vídeos do universo do gênero musical, como apresentações e momentos das bandas BTS, Blackpink, EXO e Red Velvet. O material foi tão grande, que o aplicativo travou. “No caso da comunidade k-popper, outras pautas caras ao fandom podem se apresentar e se tornar ativismo em favor de causas sociais, já que o know-how de como impactar o cenário on-line faz parte do dia-a-dia e é implementado nessas ações. Os fãs de K-pop sabem da sua força, então estão utilizando-a”, afirma Mazur.
Apesar das últimas ações estarem focadas no cenário internacional, os kpoppers brasileiros também são ativos em pautas sociais. Como ocorreu no movimento #ARMYHelpThePlanet, em que o fandom brasileiro do BTS se posicionou em favor da preservação da Floresta Amazônica durante as fortes queimadas que aconteceram em 2019 e também ao posterior reflorestamento de áreas atingidas pelo fogo através de campanhas de arrecadação de doações.
Juntamente ao ativismo da comunidade chegaram os dilemas e os memes. A frase "k-popers, precisamos de vocês" repercutiu no Twitter e levanta uma problemática. “Meu grande problema com esse meme é enxergarem os k-poppers como super-heróis de causas que são muito maiores do que o fandom e apagarem movimentos sociais que estão há décadas lutando por destaque e justiça. É claro, como eu disse anteriormente, o fandom é formado por cidadãos, então faz parte da lógica da sociedade, obviamente pode e deve se posicionar em favor de questões sociais, mas é necessário cautela quando o colocamos nesse lugar de notoriedade”, finaliza.
*Estagiária sob supervisão de Igor Silveira