Diversão e Arte

Músicos falam da falta das rodas de choro e de planos para o futuro

Sete figurinhas carimbadas em rodas de música da cidade falam sobre a falta que esses encontros fazem durante a pandemia

A existência da Escola Brasileira de Choro Raphael Rabello, criada há 22 anos, foi determinante para o surgimento de um expressivo número de instrumentistas, que dedicam-se ao estilo musical, tido como gênese da MPB. Alguns seguiram carreira solo, outros formaram grupos, mas há também os que, mesmo sem fazer parte de nenhum conjunto regional, participam das rodas de choro que ocorrem em vários pontos da cidade, principalmente na Asa Norte.

Entre elas, tem as que se tornaram tradicionais, outras foram criadas mais recentemente; mas todas estão sempre abertas à participação de músicos avulsos, que costumam dar canja. Com o advento da pandemia, todos esses encontros deixaram de ser realizados temporariamente. Ouvidos pelo Correio, sete chorões falam sobre a falta que fazem as rodas; e relatam o que têm feito em tempo de quarentena, além do que projetam, para quando tudo voltar à normalidade.


Fernando César 

Coordenador da Escola Brasileira de Choro Raphael Rabello, Fernando César comandou a retomada da roda de choro, que existiu nos primórdios do Clube de Choro. Mas, com apenas duas edições, nas primeiras quintas-feiras de março, teve que ser interrompida por conta da covid-19. Segundo o mestre de violão 7 cordas, o que houve de mais frustrante foi a não realização do Seminário Euro-Brasileiro de Choro, que o Clube do Choro promoveria em abril, com a participação de 40 músicos, incluindo estrangeiros. “Nesse período de isolamento social, a Escola de Choro vem oferecendo aulas on-line em três períodos. Tenho ocupado o tempo também ministrando aulas particulares, produzindo e disponibilizando vídeos. Quem acessar, poderá tocar ou cantar junto. O primeiro foi uma releitura de Carinhoso (Pixinguinha), em 23 de abril, Dia Nacional do Choro”, conta. “Selecionado no Arte como respiro, edital do Itaú Cultural, estou aguardando a data para a apresentação de três composições de minha autoria”, acrescenta.

Ian Coury 

Um dos maiores talentos da nova geração da música brasiliense, o jovem bandolinista Ian Coury adiou vários eventos agendados, como shows que faria na Cervejaria Criolina (Setor de Oficinas Sul) e no Terraço Shopping (Sudoeste), e a roda de choro que liderava, quinzenalmente, no restaurante Bier Fass, no Pontão do Lago Sul. O coronavírus o levou a se manter em casa, onde se dedica ao estudo de música e à gravação, mixagem e masterização de vídeos em seu home studio. “Fui selecionado em primeiro lugar, entre concorrentes do Brasil, para cursar faculdade na Berklee Scholl of Music, e teria que estar em Boston (Estados Unidos), em setembro”, revela. “Mas, com a pandemia, não sei se haverá adiamento da viagem. No momento, busco, por meio da música, tornar a vida das pessoas mais leve, com aulas on-line de bandolim”, complementa.

Tiago Tunes 

Outro destaque entre os novos chorões em Brasília, o também bandolinista Tiago Tunes estava fazendo gravações e shows com a violonista Jussara Dantas, além de comandar uma roda de choro na creperia C’est si Bon (213 Norte) e na Quituart (Lago Norte), antes da covid-19. “Na quarentena, venho compondo, tocando e ouvindo discos de músicos que admiro, como o flautista carioca Esurdo Neves e o acordeonista gaúcho Bebê Kremer”, diz, “Quando este pandemônio passar, vou dividir um projeto didático com o violonista Henrique Neto, para aplicativo de choro, com playback, para a galera tocar junto”, antecipa.


Carlos Valença 

Uma das mais concorridas e longevas rodas de choro de Brasília é a da banca de jornais e revistas da 208 Sul, promovida aos sábados, a partir das 10h, pelo violonista e proprietário do estabelecimento, Carlos Valença. “Há sete anos, movimentamos o fim de semana aqui na quadra com a roda de samba, que reúne músicos profissionais e amadores de diferentes gerações. Embora tenha um grupo básico, estamos sempre abertos à participação de outros instrumentistas”, explica Valença. “Pena que, por causa do vírus, tivemos que interromper. Mas vamos voltar logo que eu tenha a autorização para reabrir a banca e retomar nossos encontros. Em casa, continuo tocando e, por WhatsApp, continuo mantendo contato com os participantes mais frequentes”, observa o violonista, que tem planos para, no retorno, produzir um documentário sobre a roda.


Pedro Ceolin 

Choro fingido é o nome da roda que ocorre no Bar do Alfredo, na 404 Norte. “É uma roda de choro diferente das outras, uma vez que nenhum dos participantes é profissional da música. Somos instrumentistas amadores nos reunindo pelo prazer de tocar, há três anos, e a concorrência é grande”, comenta o bandolinista Pedro Ceolin. Ele costuma tomar parte também de rodas no bar Sem Chorumelas, na Asa Norte. Ele e seus companheiros estão desolados, pois o coronavírus os proíbe de fazer uma das coisas que gostam.


Léo Araújo 

Em dezembro último, o violonista Léo Araújo passou a organizar uma roda de choro, às quartas-feiras, na Verri Gastronomia (215 Norte) intitulada Choro da Quinze. Ele integra o grupo fixo, formado por Dudu Maia (bandolim), Vitor Adonai (clarineta) e Luiz Ungarelli (pandeiro), que, eventualmente, conta com a participação de outros músicos, incluindo Pedro Vasconcellos (cavaquinho), Antônio Melo (violão) e Pedro Berto (bandolim). Ex-estudante da Escola Brasileira de Choro, Léo, que atualmente faz o curso para bacharel em música e composição na UnB, fala que, em tempo de covid-19, tem pesquisado músicas para incorporar ao repertório do conjunto. “Me ocupo também com aulas de violão e teoria musical para alguns alunos; e estou em fase de pré-produção de um EP, de composições de minha autoria”, ressalta.

Lucas Parente 

Há um ano, o Tombado Bar, na 206 Norte, passou a ter um movimento maior às sextas-feiras, com a realização do Choro Raiz, projeto criado por Lucas Parente. Ex-aluno da Escola de Música de Brasília da Escola Brasileira de Choro, o cavaquinista que agora faz o curso de licenciatura em música na UnB tem atuado também como produtor, função que exerce no Live Lounge do Life Resort, na Vila Planalto. Como a pandemia o obrigou a manter-se em casa, Parente estabeleceu uma rotina que inclui estudo de música e produção de vídeos. “Tenho, também, dado aulas particulares on-line, mas nada se compara às rodas de choro e aos shows, com a presença do público”, comenta, sem esconder o quanto aguarda a volta das atividades presenciais, como o Choro Raiz e as apresentações no Mercado do Café, na 509 Sul.