Recado
“Quando o amor quer falar, a razão deve calar-se.”
Jean-François Regnard
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De gripezinhas e resfriadinhos
“É gripezinha”, diagnosticou Bolsonaro. Referia-se à Covid-19. Choveram críticas. Pancadas vieram da direita, da esquerda, do centro. Ufa! O presidente voltou atrás? Qual o quê! Gripezinha virou resfriadinho.
Resultado: o diminutivo entrou na agenda. Curiosos correram atrás do jeito camaleão de falar. Os diminutivos são criaturas irracionais. Exprimem a linguagem do coração. Cheios de emoção, falam de carinho, ódio, ironia. Chamar um livro pequeno de livrinho indica tamanho pequeno. Mas de amorzinho o gatão de 1,90m e 150kg denota afeto. Dizer que a garota é bonitinha não deve alegrá-la. Deu-se um jeitinho de afirmar que a moça é feia.
Ao referir-se a alguém como professorzinho, doutorzinho ou empregadinho, desqualifica-se o professor, o doutor, o empregado. Ofende-os. Se a gente adjetivar o substantivo, aumenta o poder da agressão. Quer algo mais pejorativo que advogadinho de porta de cadeia? Ou professorzinho do interior? Ou empregadinho de boteco? Mata sem dó.
Moral da história
O diminutivo enriquece a expressão. Mas não o faz de graça. Cobra preço. Vale a pena pagá-lo? Você decide. Você escolhe.
Fora!
Ao falar em gripezinha e resfriadinho, Sua Excelência reduziu a Covid-19 a zero à esquerda. Bobeou. Feliz, a gripezinha levantou a cabeça, esfregou as mãos e partiu pro ataque. Valha-nos, Deus! Vade retro, satanás! Xô! Xô! Xô!
Senhor diminutivo
Gripe deu gripezinha. Resfriado, resfriadinho. Por que a diferença? Guarde isto: o sufixo formador de diminutivos é —inho. Ele pede licença à vogal átona do fim da palavra e se emenda ao radical: casa (casinha), menino (menininho), garota (garotinha), livro (livrinho), gripe (gripinha), resfriado (resfriadinho).
A ponte
O zê, que aparece em -zinho e -zinha, é ilustre convidado. Ele funciona como ponte que liga o radical ao sufixo: café (cafezinho), sofá (sofazinho), caju (cajuzinho), mulher (mulherzinha), jornal (jornalzinho), lâmpada (lampadazinha).
Dois times
Há palavras flexíveis como cintura de político mineiro. Elas jogam nos dois times. É o caso de gripe. Uns dizem gripinha. Outros, gripezinha. É o caso, também, de resfriado. Ora é resfriadinho. Ora resfriadozinho. Também menino (menininho, meninozinho), mesa (mesinha, mesazinha), livro (livrinho, livrozinho).
Leitor pergunta
Li que pessoas foram às ruas para participar de “protestos a favor” do governo. Protesto não seria sinônimo de reclamação?
Walmir Lopes, Santos
Protesto joga em times opostos. Depende da preposição:
Protestos contra = oposição: Protestos contra o Congresso tomaram as ruas.
Protesto por, a favor = clamor: Foram às ruas para participar de protestos a favor do governo.