Recado
“Perdoe-me, senhora, se escrevi carta tão comprida. Não tive tempo de fazê-la curta.”
Voltaire
Para viver um grande amor
A novela começou com Jair Bolsonaro. Ele adora metáforas do vocabulário amoroso. Agora, encontrou a parceira ideal. Regina Duarte, convidada para assumir a Secretaria da Cultura, quer viver um grande amor. Dará certo? O primeiro passo é ter claro que o amor é cego, mas não é surdo. Impõe-se, por isso, todo o cuidado com as palavras. No início da relação, os verbos têm uma marca. São transitivos diretos.
Paquerar, namorar, abraçar e beijar dispensam intermediários. Mandam a preposição tentar outra freguesia: Maria paquera Luís. Luís paquera Maria. Maria namora Luís. Luís namora Maria. Maria abraça Luís. Luís abraça Maria. Maria beija Luís. Luís beija Maria.
Na substituição do nome pelo pronome, os atonozinhos o, a pedem passagem: Maria o paquera. Luís a paquera. Maria o abraça. Luís a abraça. Maria o namora. Luís a namora. Maria o beija. Luís a beija.
Olho vivo
É isso. Encontrar a cara-metade é difícil. Segure-a. Dizer paquerar com, namorar com, lhe beijar, lhe abraçar? Valha-nos, senhores dos ventos, das águas e das tempestades! Com o descuido, adeus, grande amor.
Tropeço na crase
“Regina Duarte vai à Brasília conhecer a Secretaria da Cultura”, escreveu na telinha a GloboNews na Edição das 10. Uiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii! Tropeçou na crase. Brasília não aceita artigo. Por isso não ocorre o casamento de dois aa.
Como saber se cidades, estados e países pedem artigo? Nos tempos em que a escola ensinava e o aluno aprendia, os professores citavam um versinho que mostra o caminho das pedras. Ele manda trocar o verbo ir por trocar e, depois, seguir a dica:
Se, ao voltar volta da, crase no a.
Se, ao voltar, volto de, crase pra quê?
Com o troca-troca, temos:
Regina Duarte volta de Brasília.
Volta de? Crase pra quê? Melhor: Regina Duarte vai a Brasília.
Outros exemplos
Regina vai à Bahia. (Regina volta da Bahia.)
Jair vai à Índia. (Jair volta da Índia).
Brasileiros vão a Portugal. (Brasileiros voltam de Portugal.)
Eu vou à França e a Cuba. (Eu volto da França e de Cuba.)
Vamos a São Paulo e à Paraíba. (Voltamos de São Paulo e da Paraíba.)
Um só
Etc. tem ponto no final? Tem. Coincide com o ponto no fim da frase? Sem problema. Fique com um só: Comprei laranja, maçã, pêssego, abacaxi etc. (A vírgula antes do etc. é facultativa.)
Súplica
Atenção, galera. Na fala descontraída, a preposição para fica preguiçosa que só. Vira pra e torna-se leve como a pluma no ar. Por isso, a hedonista faz uma súplica: “Não me deem o peso de um acento. Livrar-se de um fardo e ganhar outro? Seria trocar seis por meia dúzia. Nada inteligente”: Pra frente, Brasil. Trabalhei pra burro. Gasta dinheiro pra chuchu. Acende uma vela pra Deus e uma pro diabo.
Mais eufemismos
Silvestre Gorgulho leu a coluna de quarta, “Eufemismos à solta”. Mal terminou, mais exemplos lhe vieram à cabeça. Animado, escreveu: “Não há como lembrar os maiores eufemismos que saltaram aos olhos nas últimas décadas — caixa dois, dinheiro pra campanha, apoio financeiro para partido. Ao contrário do que quer fazer crer o filme Democracia em vertigem, de Petra Costa, eles são eufemismos para o verbo roubar.
Leitor pergunta
A palavra brechó tem a ver com o príncipe Belchior, que foi visitar Maria e Jesus? Consta que ele era vendedor.
Uriel Villas, Santos
Indiretamente, sim. O primeiro comerciante brasileiro de objetos velhos e usados chamava-se Belchior. Ele abriu a loja no Rio de Janeiro no final do século 19. Com o tempo, entrou em vigor a lei do menor esforço. Belchior virou brechó.
Tentando fazer que ele encontre? Tentando fazer com que ele encontre? Com ou sem preposição?
Carlos Gama, lugar incerto
O Dicionário de verbos e regimes, de Francisco Fernandes (o melhor que temos na praça), admite as duas formas. É acertar ou acertar.