Machado de Assis (1839-1908) sempre desafiou o ilustrador Cássio Loredano. Como leitor, ele ainda se fascina com a escrita precisa, elegante, sarcástica, do autor carioca. Como caricaturista, Loredano se surpreendia a cada vez que fazia um novo trabalho. "Machado aumenta de importância a cada releitura", conta ele, cujo primeiro desenho do Bruxo do Cosme Velho data do início dos anos 1970. "Ficou vergonhoso, eu ainda não tinha a segurança necessária para entender Machado."
Isso só aconteceu, ele acredita, nos anos 2000, quando produziu um desenho para o jornal espanhol El País, em que a figura de Machado era secundada pelo Pão de Açúcar. Por conta disso, foi menos difícil aceitar o convite do Instituto José Resende, que abre as portas de seu escritório paulistano neste sábado, 30, no bairro da Vila Nova Conceição. A inauguração será marcada por oito caricaturas inéditas que Loredano fez de Machado, uma espécie de passeio pela vida do escritor, desde as imagens que o mostram na juventude até aquela que é considerada sua última fotografia, publicada no ano de sua morte pelo jornal argentino Caras y Caretas.
Dono de um dos mais finos traços da atual caricatura brasileira, Loredano viu, ao longo dos anos, variações na figura de Machado, alterações que nasceram tanto da observação acurada das imagens do escritor como da constante releitura de sua obra. A famosa distorção na fisionomia, que marca o trabalho do caricaturista (tributária de uma tendência expressionista, de uma sensibilidade desenvolvida ao longo de muito tempo e de um grande respeito às possibilidades do acaso), permite que o espectador também descubra o detalhe do perfil do escritor que, no exato instante de nascimento do traço, interessou o caricaturista.
Em seu trabalho, Loredano não se apoia apenas nas fotografias disponíveis de Machado - leitor interessado, ele buscou subsídios em estudos machadianos, como no livro O Otelo Brasileiro de Machado de Assis, escrito pela americana Helen Caldwell nos anos 1960 e que estabelece a proximidade do personagem de Shakespeare com Dom Casmurro, justamente a obra machadiana preferida de Loredano - ela determinou uma nova forma de ver o possível adultério de Capitu, sem que a culpa recaísse unicamente sobre a personagem.
O caricaturista se apoia ainda nos estudos de brasilianistas, como o inglês John Gladstone e o francês Jean-Michel Massa, que se apoiaram de diferentes formas sobre a obra machadiana, expandindo a visão crítica para outros países. "É impressionante a riqueza de detalhes apresentados por eles", comenta Loredano, cuja arte gráfica estará ao lado do trabalho escultórico de José Resende, no novo instituto paulista.
No novo espaço, as obras dos dois artistas vão ocupar uma sala ao lado de outros trabalhos pertencentes ao marchand Paulo Fernandes, que mantém uma relação próxima com os dois. O lugar abriga, além das obras dos expositores, trabalhos de autores variados, de Rodin a Miguel Rio Branco.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.