No País em que a atividade cinematográfica tem sido demonizada e produtores e diretores reclamam dos cortes de patrocínio e da não liberação de recursos já autorizados, Karim Aïnouz faz figura de exceção. Ele não apenas está na disputa para uma vaga no Oscar de melhor filme internacional com A Vida Invisível como tem dois trabalhos em andamento, mais um terceiro em vias de viabilizar-se. Depois de filmar A Vida Invisível como homenagem à geração de sua mãe, Karim partiu em busca do pai no mundo árabe. Foi fazer um documentário sobre a família dele na Argélia. Terminou documentando protestos nas ruas, que viraram tema para um outro filme.
Cinema, cinema, cinema. A Vida Invisível estreia nesta quinta, 21, depois de vencer a mostra Un Certain Regard, no Festival de Cannes, em maio, e ter tido duas galas no Brasil. Uma, no Teatro Municipal, durante a Mostra INternacional de Cinema, e outra na abertura do Cine Ceará. As perguntas que não querem calar: A Vida Invisível passará na peneira da longlist de dez pré-selecionados que serão anunciados em dezembro? Ficará entre os cinco indicados, em janeiro? Fernanda Montenegro, que já foi indicada para melhor atriz, por Central do Brasil, de Walter Salles, em 1998, cavará uma indicação para melhor coadjuvante? Por enquanto, são conjeturas, possibilidades.
Karim Aïnouz tem perfeita consciência do filme que fez. A Vida Invisível nasceu, para ele, de um luto. Sua mãe morreu e ele escreveu um texto que distribuiu entre os que compareceram ao velório. O texto de um filho que agradecia à guerreira que o criou sozinha - com a ajuda da avó e de quatro tias - e traçava o perfil de uma lutadora. Como era, no Brasil dos anos 1950, no Nordeste, com todo o preconceito e machismo, ser mulher e mãe sozinha? No velório, estavam as amigas da falecida e Karim começou a divagar. Pensou em todas aquelas mulheres - uma coisa geracional. Mas a ideia do filme só veio a partir do livro de Martha Batalha, A Vida Invisível de Eurídice Gusmão.
"O livro me forneceu uma ferramenta, mas minhas referências foram Douglas Sirk e Rainer Werner Fassbinder. É verdade que incluí Uma Mulher Sob Influência, de John Cassavetes, na preparação das atrizes, mas o melodrama social de Sirk e a reinvenção da linguagem do melodrama por Fassbinder me impulsionaram. Imitação da Vida e O Medo Devora a Alma. Queria, conscientemente, fazer um melodrama de recorte feminista, mas sabia que tinha de evitar o panfleto. Cinema não é discurso. A verdade do cinema está nas personagens, e elas, as irmãs do filme, Eurídice e Guida, tinham de ser verdadeiras." Foi um longo processo, no qual as atrizes foram viscerais. Carol Duarte, Júlia Stocker e Fernanda Montenegro. "Era um sonho antigo filmar com Fernanda. Sabia que ela seria grande e mudei o final do filme, em relação ao livro, para apostar nela. Tudo o que queria, ela superou." E agora, Karim? "Sabe o que eu quero de verdade? Sou louco para dirigir uma ópera."
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.