Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Seleção final do Festival de Brasília tem mais de 80 filmes

Festival de Brasília terá diversidade e, seleção com mais de 80 filmes

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Para quem tinha dúvidas da manutenção crítica a nortear o mais importante evento cinematográfico do país, o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em termos de tendências e conteúdos, o momento é de alívio. Foi preservado o registro da diversidade, bem como o teor polêmico e urgente que sempre se fez presente desde meados dos anos de 1960, data da criação do evento. O pacote de mais de 700 filmes inscritos foi aberto pelos curadores Marcus Ligocki, Anna Karina de Carvalho e Erica Lewis (subsecretária de Economia Criativa), em time completado pelos críticos de cinema Tiago Belotti e Flávia Guerra.

A seleção final, anunciada ontem, traz mais de 80 filmes a serem exibidos, entre 22 de novembro e 1; de dezembro, no Cine Brasília (EQS 106/107) e ainda no Museu Nacional da República. As regiões administrativas em que os filmes serão projetados ainda não foram definidas, e há incertezas quanto ao troféu a ser conquistado pelos realizadores locais, depois que a Câmara Legislativa do DF (parceira habitual da festa) desistiu de patrocinar o prêmio. Um possível retorno à Mostra Brasília está em discussão, nos bastidores. Quanto à infraestrutura, as obras em andamento para a nova estação de metrô (na EQS 106/107) não afetarão a área do estacionamento.

Presente ao evento de divulgação do formato da festa, o secretário de cultura Adão Cândido comentou do salto de orçamento para a casa dos R$ 4 milhões, incluída a captação junto à iniciativa público-tprivada, com aporte do banco BRB (agora com nome vinculado à Mostra Brasília). O conteúdo dos filmes de longa-metragem em competição oficial se destaca, afiado: o pernambucano Cláudio Assis (com fitas multipremiadas no evento) retorna com Piedade, exame de um núcleo familiar em conflito; a denúncia de perseguição a mulheres move o documentário brasiliense O tempo que resta (assinado por Thais Borges) e, examinando temas como impeachment e polarização dos brasileiros, o documentário O mês que não terminou traz narração de Fernanda Torres e codireção dividida entre Francisco Bosco e Raul Mourão.

Desde já, dono de gritante apelo popular, Alice Jr. (de Gil Baroni) foca numa youtuber trans, pronta para beijar na boca, mas que se vê numa camisa de força para se ajustar (ou não) a moldes conservadores. Completam o certame: Loop, filme de estreia de Bruno Bini, com Bruno Gagliasso, que fabula em torno de voltas no tempo, com enredo romântico e deslocamentos de tempo e espaço; Volume morto (de Kauê Telloli) que adota humor negro para relacionar bullying e espiar culpas, dentro de uma sala de aula e o internacionalmente premiado A febre (de Maya Da-Rin), ficção que flerta com a realidade para tratar de um índio inserido no mundo capitalista (como operário), em conflito com suas origens.

Simpatia internacional

Antes da largada de trabalho para o corpo de jurados fomado por personalidades como Cacá Diegues, Bianca De Fellipes, Artur Xexéo, Jimi Figueiredo e Bruna Linzmeyer, ao lado dos pesquisadores de cinema Carmen Luz e Pablo Villaça, o festival terá uma célebre abertura: O traidor (coprodução assinada pelo italiano Marco Bellocchio) terá a primeira exibição no país. ;O Brasil tem cada vez mais coproduzindo com a Europa;, destacou Anna Karina, exaltando o produtivo momento dos filmes brasileiros. Entre 14 curtas-metragens selecionados, oito estados nacionais têm representação, contemplado o DF, com a obra documental de João Inácio chamada Chico Mendes ; Um legado a defender.

Em momentos de celebração, haverá homenagens de profissionais do porte de Stepan Nercessian, para o antigo coordenador da festa Fernando Adolfo e ainda para os diretores Daniel Filho (com nova versão para o clássico Boca de Ouro) e Vladimir Carvalho, que assina o filme de encerramento (Giocondo Dias ; Ilustre clandestino). ;O ex-governador José Aparecido de Oliveira (protagonista de documentário fora de competição) foi responsável, entre outras coisas, pelo tombamento de Brasília;, comentou Marcus Ligocki. Também contemplado nas homenagens, o produtor Márcio Curi (morto há três anos), generoso articulador das realizações locais em cinema, teve concluído Campus Santo, longa a ser projetado em caráter especial.

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Representação local

No campo amplo das mostras ; estendidas para segmentos denominados Território Brasil, Vozes, Novos Realizadores, Guerrilha e Futuro Brasil, além da Mostra Brasília ; haverá rememoração de personagens ímpares para o destino da capital. O fotógrafo Luis Humberto e a atriz teatral Dulcina de Moraes estão no caldeirão de filmes. ;Estão porque, como talvez JK viesse a responder, Brasília é a metassíntese, ao refletir um ideal de integração. Convivi com Paulo Emílio (Salles Gomes), fui distinguido por José Aparecido, e acho que Dulcina plantou o teatro em Brasília. São pessoas que não estão aqui por acaso. Testemunho, desde 1969, esta realidade;, observou Vladimir Carvalho. Acerca do longa Giocondo Dias, ele adianta: ;Fui um homem que viveu dois terços da jornada na clandestinidade. Nem por isso perdeu sensos de identidade e de lucidez, quando se fala em história política do país;.

Na disputa por R$ 150 mil em premiações, a Mostra Brasília BRB trará longas-metragens assinados por diretores como Glória Teixeira, Adriana Vasconcelos, Gustavo Galvão e pela dupla Rama de Oliveira e André Luiz Oliveira. Oito curtas também competem. Integrante (ao lado do codiretor Neto Borges) da mostra paralela Território Brasil, com o longa Servidão, o diretor Renato Barbieri comemorou a vitrine ao lado de mais 17 colegas. ;Foram anos de pesquisa e, no filme, tratamos do trabalho escravo contemporâneo na Amazônia. Como presidente do Conne (a Conexão Audiovisual, Centro-Oeste, Norte e Nordeste), criada em 2016, vejo avanço na nacionalização do cinema brasileiro, e a mostra do Festival de Brasília propicia exame de retratos criados, em filmes, por todas as regiões do Brasil;, disse.