Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Livro 'Você', de José Carlos Vieira, envolve leitor com boa poesia

Para Wilson Pereira, a poesia de JCV, a partir do título do livro, revela uma aura poética simples e comunicativa

. Antes, porém, de comentar o livro, foco desta resenha, faço uma breve consideração sobre o editor do caderno Diversão & Arte do Correio Braziliense. JCV tem dado espaço constante e privilegiado a literatura produzida em Brasília, divulgando poemas de poetas da cidade na coluna Tantas Palavras, anunciando lançamentos de livros, além de publicar resenhas de autores e sobre autores de Brasília. Não me lembro de momento em que os escritores desta capital tenham frequentado tanto as páginas do jornal.

Portanto, registro, em nome dos escritores brasilienses, pelo menos de boa parte deles, o reconhecimento e a gratidão ao JCV, pelo seu generoso procedimento que, aliás, se deve à sua sensibilidade de poeta e à seriedade com que ele exerce a profissão jornalística.

A poesia de JCV, a partir do título do livro, revela uma aura poética simples e comunicativa, que estabelece linha direta com a intersubjetividade do leitor. Sem rodeios estilísticos, sem artimanhas sofisticadas, o poeta diz o que lhe brota da veia lírica de forma clara e sempre sintonizada com os sentimentos de todos nós. Mas a simplicidade é apenas aparente, porque vem permeada de sugestões, de conotações sutis e refinadas pela sensibilidade criativa do poeta. Afinal, o bom poema sempre sugere o que lhe vai oculto, sob a pele das palavras. E o poeta alerta, logo no primeiro poema:

Lá vem você
dizendo
que minha poesia
não é poesia
eu sei
mas abra os olhos.

JCV não se rende, portanto, aos cânones da poesia de cunho intelectual, com a primazia da forma, mas não perde o ritmo nem a essência poética, que se manifesta, em muitos poemas curtos, como um raio iluminando a página. É o que se nota neste dístico:
o caçador de cigarras

não sabia que era surdo.

ou neste outro:

meu coração
bate mais
que mereço...

Veja-se mais este exemplo
de feliz realização poética:
saudade
de quando seus joelhos
me olhavam
debaixo do vestido.

Nem só de poemas curtos se compõe o livro. Há poemas de maior fôlego, mas sempre pautados pela síntese, pois o poeta busca o essencial, com a expressividade que lhe permite o poema bem-acabado. E mesmo quando aborda situações do cotidiano, à primeira vista antipoéticas, o autor faz construções surpreendentes e bem aplicadas ao contexto, como o último verso do poema 3 ; ; Alô... foi daí que pediram uma pizza metade solidão, metade desespero?

A irreverência, presente, de forma sutil, com disfarces metafóricos, em alguns momentos, aparece de forma explícita, agora alimentada pela desilusão do poeta diante da aridez da vida, no poema de número 25, do qual citamos os seguintes versos: explodo palavras/saboto sonhos/destruo saudades/a lua vazia é minha cúmplice/ergo a bandeira dos desiludidos/no castelo dos sozinhos.

Veio também explorado no livro são os poemas de sentido lírico amoroso, nos quais predomina o sentimento de perda da companheira e a consequente saudade que decorre da separação. Mas nesses poemas o autor procura inserir algo de atual, como algumas expressões próprias da linguagem das mídias sociais, conforme se nota nos seguintes versos do poema 36: nem sei se você dorme /com meu travesseiro/se deleta poemas desesperados/que a madrugada enviou/ou se me bloqueia...

Uma das paixões do poeta é a música, principalmente o rock;n;roll, como se percebe pelas referências ao ;disco de led zeppelin; (poema 27), a ;beatles, só abbey road/de kerouac, on de the road; e, especialmente, pela reverência, no poema de número 8: ;há um céu/dos roqueiros mortos;.

Enfim, Poemas de paixões e coisas parecidas é um livro que envolve o leitor com a aura mágica da boa poesia.

*Wilson Pereira é poeta, contista, cronista e autor de livros infantojuvenis.