O cheiro de papel, o toque macio de um livro nas mãos, uma história novinha em folha a ser reconhecida na ponta dos dedos. O uso de e-books vem aumentando nos últimos anos, mas, para diversos leitores — mesmo os jovens, que já nasceram no meio digital —, nada substitui o verdadeiro livro de papel.
É assim com o casal Larissa Yassunaga, de 18 anos, e Marcelo Felipe de Moura, 20. Um dos passatempos dos dois é ler livros. “Quando você está lendo livro físico, você se desconecta de celular, tecnologia e de coisas do tipo”, defende o jogador de pôquer, que ainda não se adaptou à leitura on-line — por tablet, computador ou celular. Foi influenciado primeiro pela mãe, que era professora; depois, já adolescente, pelo jogo, a fim de buscar conhecimento e melhorar o desempenho.
“Eu gosto de ter o livro em mãos, de poder colocar marcadores em todas as partes que me emocionaram, me fizeram rir ou que simplesmente gostei”, acrescenta a estudante, que pretende montar a própria biblioteca. “Eu gosto de ter o livro, não é só ter o livro físico”, completa o jovem, que compra quase todos os que lê.
Quando perguntada sobre um livro marcante, Larissa não hesita: “Outros jeitos de usar a boca (2014), da Rupi Kaur”. Sucesso de vendas, o livro da poeta feminista indiana fez com que a jovem descobrisse novas perspectivas sobre a vida. “Ela lê até mais do que eu”, diverte-se Marcelo, que tem na literatura de autoajuda o gênero favorito.
Impressão literária
“Cresci rodeada de mulheres contadoras de histórias”, relembra a poeta Meimei Bastos, 28, sobre a mãe e a avó. Influenciada por elas, a jovem brincava de ser escritora durante a infância. “Quando você ouve uma história e vai contá-la depois, você cria em cima dela”, continua. Tomar gosto por lazer não foi suficiente: por isso, lançou o livro Um verso e mei (2018), da editora brasiliense Malê, e trabalha com slam — poesia falada que versa sobre periferia, violência e preconceitos em geral.
“Acho que todas as vezes que uma mulher publica um livro, está ajudando, incentivando outras a tomarem posição e coragem para enfrentar desafios. Foi assim com Cora Coralina, Carolina Maria de Jesus e tantas outras que enveredaram por essa seara”, analisa a delegada Maria Aparecida Veras, 59, uma das autoras do livro Vida de delegada (2018).
A obra subverte a visão tradicional do que ocorre nas delegacias e traz à tona o ponto de vista feminino, sob a ótica das delegadas. “Leio gibis desde criança, então amo livro físico. Além disso, todas as escritoras são formadas em direito, o que significa que temos mania de sublinhar e colorir trechos de livros”, conta a escritora. “Também entendemos que o impresso atingiria um maior número de pessoas, considerando que muitas ainda têm dificuldades com plataformas digitais”, analisa ela, sobre o fato de a publicação ter sido impressa.
“Só consegui me imaginar escritora quando li Carolina (Maria de Jesus)”, complementa Meimei. Inspirada pelo trabalho da escritora mineira — uma das primeiras autoras negras do Brasil —, ela vê nas jovens e nas futuras gerações a continuidade para a literatura. A filha Sofia, 8, por exemplo, segue os passos da mãe e brinca de imaginar, criar e escrever histórias em quadrinhos. A perenidade, no entanto, foi além do exemplo dentro de casa: a poeta divulgou o trabalho em escolas e bibliotecas públicas.
“Biblioteca é um acervo vivo”, define o editor Andrey do Amaral, da editora Pergunta Fixar. Para o professor de literatura, elas são fundamentais. Atualmente, ele percebe o mercado editorial em declínio: o fechamento de livrarias e de distribuidoras, e a redução do comércio contribuem para o fato. “(Livros físicos) dependem de políticas públicas para formarem leitores, como a distribuição de novos exemplares nesses locais para renovar o acervo”, analisa.
“Gosto de sentir o cheiro dos livros, da tinta no papel”, descreve o editor, que se define como amante dos livros e apaixonado pelo papel. A biblioteca dele, por exemplo, já chegou aos 10 mil exemplares. “É como se fosse um alimento para a alma”, continua Amaral.
O profissional compara a impressão de livros à fabricação de discos de vinil: para ele, nenhum dos dois irá acabar, mas só chegará a um público segmentado. Segundo ele, o declínio do mercado abala a economia e chega às gráficas, que acabam ficando com menos papel e funcionários no quadro. Dessa forma, o preço do exemplares também sobe. Se o livro on-line surge como uma alternativa mais barata e acessível, não deve substituir os que são impressos: “O e-book é um complemento, uma nova mídia para novos públicos”, analisa.
*Estagiária sob supervisão de Severino Francisco.