Ao longo do mês de agosto, dois projetos invadiram a Ceilândia e o Recanto das Emas com muito rock;n;roll, solidariedade e conscientização para os alunos das escolas públicas dessas cidades. O projeto 1kg de rock ocupou o Céu das Artes, na samambaia, em todas as sextas-feiras do mês, e terá uma última edição no próximo dia 30. Já o Ferrock ; Arte nas escolas levou 12 bandas a escolas de todos os setores da Ceilândia entre 5 e 20 de agosto.
Apesar de neste ano contarem com upgrade do patrocínio do FAC, ambos os projetos são realizados há muitos anos e fazem a diferença em suas comunidades. A premissa é a mesma: o rock;n;roll pode ser uma importante ferramenta de transformação social, individual e coletiva, e deve ser levado às novas gerações. Formação de artistas e plateias, emancipação por meio da expressão e conscientização por meio da cultura são palavras-chave para tais iniciativas.
Solidariedade
O nome do projeto 1kg de rock poderia fazer alusão ao rock pesado praticado pelas pessoas que propõem as atividades. Mas a história tem outro viés: ;O nome surgiu porque é uma característica da cultura do rock a galera ser solidária. Como a gente já vinha valorizando algumas atividades nas escolas, surgiu a ideia de fazer uma matinê, e surgiu a questão de fazer doações. Não é um nome inovador, mas define a característica principal projeto;, esclarece o idealizador Geldo Araújo.
Além de figura engajada na cena roqueira do DF, Geldo é professor de matemática do Centro de Ensino Médio 11 do Recanto das Emas desde 2004. Desde que entrou no colégio, as funções do professor vão muito além do ensino de fórmulas e equações. As lições da produção underground também passaram a integrar o currículo escolar, quando Geldo trouxe figuras da produção independente para compartilhar suas experiências com os alunos. ;A cultura do rock não é só show, tem outras faces que também são importantes;, conta o professor.
;No começo, não havia recurso, mas, como eu era da escola e era conhecido na cidade, tinha facilidade em convidar meus amigos, que tinham bandas e produziam. Eu propunha: ;vamos fazer uma palestra sobre audiovisual no rock;n;roll?; O cara topava, vinha de forma gratuita, levava a galera pra uma sala e conversava sobre aquilo;, lembra Geldo.
Esta foi a gênese do projeto que, chegando à sétima edição neste ano, e contando com suporte financeiro, realizou quatro eventos no Céu das Artes, voltado para o público estudantil de todas as idades, com apresentações de bandas, palestras com representantes da cena (que falaram sobre assuntos que extrapolam a música) e exibição de filmes. O evento que encerra a temporada, nesta sexta-feira, contará com as bandas Mitsein, Lamina, e Função Inversa, cujo nome é uma homenagem ao professor de matemática que, há alguns anos, criou um projeto de iniciação musical na qual surgiu a banda.
Outra banda formada por ex-alunos de Geldo é a Desonra, cujo vocalista, Cleiber Mota, teve aulas com ele. Mike, o baixista da banda, comenta a importância do projeto: ;Vimos que a molecada que viu a palestra se interessou muito mais pelo show. Conseguimos atacar o coração dessa molecada. Não é sempre que temos essa oportunidade;, comenta.
Cultura popular
Enquanto isso, o projeto Ferrock ; Arte nas escolas, é tão antigo quanto o próprio Ferrock, um dos maiores, mais antigos e importantes festivais de rock da cidade. ;Era mais ou menos como é hoje, mas na época era mais difícil;, lembra Ari de Barros, fundador e idealizador do festival. ;A expansão do Setor O foi entregue só com os lotes, mas não tinha casa. Depois, faltaram as escolas. Começamos a fazer campanhas, palestras e passeatas reivindicando escolas;, relata.
;A gente faz além do show. Trabalhamos com oficinas de cultura popular, catira, teatro de boneco, argila, brinquedos populares;, enumera Ari. Neste ano, o projeto levou 12 bandas a escolas do Setor O, Sol Nascente e todos os setores da Ceilândia. ;A gente acredita que, trazendo a cultura do rock pra dentro da escola, conseguimos transmitir um pouco do que nós acreditamos. Nada melhor do que começar desde criança. E as crianças estão dentro da escola;, sintetiza Ari.
O guitarrista Felipe Rodriguez, da banda Vox Lugosi, que se apresentou no Centro Educacional 15 do Setor O, comenta a experiência: ;Creio que, para alguns ali, foi a primeira vez que viram uma banda de rock ao vivo. O primeiro momento foi de timidez, mas logo se renderam ao charme dos góticos tropicais tocando no recreio;, brinca. ;Esse tipo de evento transforma vidas. Lembro quando rolou um na minha escola e posso dizer que aquilo me influenciou bastante;, recorda.
*Estagiário sob supervisão de Severino Francisco