postado em 10/07/2019 07:00
;Eu me sinto um bicho trabalhador. Não sei fazer outra coisa. Para mim, a palavra sagrada é trabalho, depois vêm as outras;, afirma o diretor de teatro uruguaio-candango Hugo Rodas. Após o ensaio da peça Os saltimbancos, que estreia amanhã no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), ele aproveita a temática do texto para comentar sobre os seus 80 anos de idade, completados em maio deste ano.
Mestre do teatro corporal e tido como um dos diretores mais criativos que o país já teve, Hugo é categórico: ;A criatividade está relacionada à crença e ao pensamento real de que se você parar de trabalhar, você para tudo;. Apesar da limitação no caminhar, a mente continua fervilhando. Enquanto a Agrupação Teatral Amacaca (ATA) canta, dança e interpreta o texto adaptado por Chico Buarque no palco, o diretor, na primeira fileira da plateia, presta atenção em cada detalhe. Luz, figurino, voz e, principalmente, expressividade.
Pouco mais de 40 anos depois, Hugo Rodas reapresenta ao público a peça que marcou a carreira do diretor, tendo lhe rendido o Prêmio do Serviço Nacional do Teatro em 1977. A encenação também foi determinante para a velha guarda da arte cênica brasiliense, o Grupo Pitú, e faz parte da história cultural de Brasília. ;Foi um sucesso na época. Tinha sessões duplas e supercheias, com filas que davam voltas;, relembra.
Se, naquele momento, vivia-se um período de repressão e censura do regime militar, no qual a revolução dos bichos mandava um recado, hoje, a mensagem também é válida. ;A remontagem foi uma coisa inacreditável, porque estamos vivendo um momento muito especial. Não exatamente igual ao da ditadura, mas, sim, muito especial. Um momento de desunião total e isso nos afeta de uma maneira fortíssima. Uma vez mais ;todos juntos somos fortes; tem alguma validade;, avalia o diretor.
Vida a tudo
Com um figurino simples e um cenário colorido, o time de futebol comandado pelo uruguaio dá vida aos animais de Saltimbancos. Sem grandes recursos cênicos, o foco é no trabalho do ator, dos vários corpos em cena, uma assinatura do diretor. Ao contrário da primeira versão, feita por uma geração de ;não brasilienses-brasilienses;, o grupo ATA interpreta, dança, canta e toca. ;Todos trabalhamos e estamos no palco dando vida a tudo, às músicas, às letras, ao movimento. É a primeira vez que tenho um elenco que consigo unir tudo e não ter a música separada;, comenta.
Para Hugo, a orquestra de atores da ATA, criada em 2009 a partir de uma disciplina de extensão da Universidade de Brasília (UnB), é a síntese daquilo que ele construiu no decorrer da carreira como ator, diretor, bailarino, coreógrafo, cenógrafo, figurinista e professor de teatro. ;Tenho muito desejo de continuar com esse trabalho. Esse grupo é, realmente, a junção de tudo o que trabalhei nos diferentes grupos tanto musicalmente como corporalmente, como oralmente. Tem sido uma evolução e um crescente sempre;, avalia.
A trajetória profissional do artista esteve e está ligada aos coletivos. Desde o Grupo Pitú, passando pelo Teatro Universitário Candango (Tucan), assim como pela Companhia dos Sonhos. ;A vida é que nos conduz para isso. Eu me sinto um animal igual a eles e creio que todos nós nos sentimos da mesma maneira. Até quando vamos ser animais que não defendemos uns aos outros? Até quando você vai considerar que o cachorro é inimigo do gato? Até quando nós não vamos entender que somos todos iguais e que é, absolutamente, necessário que a gente esteja junto para poder criar algo?;, questiona. Da ficção para a vida real, Hugo representa a reunião, a coletividade.
Aos 80 anos, o estrangeiro que se apaixonou pelas mil possibilidades da nova capital do país segue inquieto e inspirado. Dirigindo um grupo de jovens atores, é alicerce de conhecimento, de referência e de paixão pelo teatro. ;É muito divertido isso da idade. Tenho 80 anos para todo mundo, menos para mim. Nunca passou o tempo para mim, sempre está igual e sempre passa, claro. Caminho diferente, tenho problemas diferentes, mas na cabeça está tudo igual e sempre trabalhando, tentando ser melhor;.
Os Saltimbancos
Centro Cultural Banco do Brasil (Setor Clubes Esportivos Sul, Trecho 2, Lote 22). De amanhã a domingo às 16h, com temporada até 4 de agosto e com sessões também às quintas. Com direção de Hugo Rodas e elenco formado por integrantes da companhia ATA. Ingressos: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia-entrada e clientes do Banco do Brasil), à venda na bilheteria do CCBB e no site Eventim pelo link: http://bit.ly/2JeLuBf. Classificação indicativa livre. Informações: 3108-7600.
(...) Todos juntos somos fortes
Somos flecha e somos arco
Todos nós no mesmo barco
Não há nada pra temer
; Ao meu lado há um amigo
Que é preciso proteger
Todos juntos somos fortes
Não há nada pra temer (;)
Trecho da música Todos juntos