Diversão e Arte

Aos 70 anos, Meryl Streep vive esplendor da carreira

Atriz foi indicada ao Oscar 21 vezes e completa sete décadas com lista de personagens pioneiras no currículo

Ricardo Daehn
postado em 22/06/2019 06:30

Na cerimônia do Oscar, Meryl Streep, 21 vezes candidata, paira praticamente como instituição de excelência

Ao completar 70 anos, hoje, a atriz Meryl Streep vive um momento especial e até engraçado, diante de toda a grandiosidade da postura progressista que sempre defendeu: está atrelada a dois projetos que têm nomes diminutivos, e associados a feminismo ; Little women e Big little lies. De pequenas, as revolucionárias personagens que constroem o romance de Louisa May Alcott, Little women (que chegará às telas de cinema em dezembro, pelas mãos da diretora Greta Gerwig), não têm nada: crescem juntas, amparadas pela amizade, em tempos muito difíceis. Já em Big little lies, com trama que alinha variadas mulheres embaladas por descomunal empilhamento de mentiras, Streep rouba a cena, na pele da sogra de Nicole Kidman. Vive o esplendor de uma unanimidade cada vez mais incontestável.

Existem inúmeros personagens interessantes que cercam o mito Streep: na vida, tem vocação para ser porta-voz de ideais humanitários; na filmografia, coleciona espantosa galeria de complexos e diversificados tipos e, ainda no palco, nas infinitas homenagens, ano a ano, a atriz desfila a simpatia e renova um repertório de agradecimentos que testam até mesmo sua capacidade cênica. A americana, que fez carreira na Broadway, depois de passar pela Yale School of Drama, foi saudada pelo conjunto da obra em festivais como os de Berlim e em premiações como as do Globo de Ouro. Mas é no supraestimado Oscar, com direito ao recorde de 21 indicações (entre prêmios), que ela nada de braçada.

"Acho fascinante sondar a vida de outra pessoa e se ver encaminhada para a jornada que ela cumpre;, declarou, recentemente, no exterior, a "grande estrela dos anos de 1980", na visão (já ultrapassada) do The New York Times, a mesma mulher que estampou a capa da revista Time (em 1981), sob a chamada de ;A mágica Meryl;.

Numa das mais novas entrevistas, concedida ao The Sydney Morning Herald, a soberania de Streep foi explicada, com certa modéstia, pela protagonista dos holofotes: ;Tive a chance de representar mulheres pioneiras, num momento em que, para Hollywood, estas pontuações em filmes foram muito populares;.

É muito difícil pinçar, dentro de um campo tão vasto, performances definitivas da atriz tão consagrada. Do Emmy conquistado pelo papel televisivo em Holocausto (1978), passando pelos papéis cômicos ; que a aproximaram de público mais amplo, caso de Ela é o diabo (1989) e A morte lhe cai bem (1992) ;, Streep é imbatível, quando em retrospectiva, se pensa nas mães-coragem personificadas em dramas como A escolha de Sofia (1982), A difícil arte de amar (1986) e Um amor verdadeiro (1998), pelo qual disputou a estatueta da Academia com Fernanda Montenegro.

Na única vitória como melhor atriz, pelo Festival de Cannes, Streep foi consagrada por Um grito no escuro (1988), um filme muito oportuno para ser visto nos dias atuais, repleto de julgamentos apressados. No filme, baseado em episódio real, ela dá vida a Lindy Chamberlain, acusada de ter matado o próprio bebê.

Faz apenas sete anos, que Meryl Streep, dentro de casa, viu o último rebento deixar a casa, numa família na qual criou quatro filhos. Isso motivou a ida para Nova York, na qual se estabeleceu em Tribeca, ao lado do escultor e marido, Donald Gummer. ;Fui a mãe tigresa de quatro filhos;, ela sempre faz questão de frisar, em referência aos filhos de um casamento que dura 40 anos.

Justo, em 1979, veio a consagração com o primeiro Oscar (de coadjuvante), vivendo a arrependida mãe de Kramer vs. Kramer ; outras glórias vieram com A escolha de Sofia e A Dama de Ferro. Nas demandas atuais, a estrela, que, vira-e-mexe, peita o presidente Trump, tem solicitado e feito eco por mais histórias sobre mulheres. Dona de estripulias pela carreira, Meryl Streep encarou até mesmo o corre-corre das fitas com ação, caso de O rio selvagem (1994).

Força e empoderamento

;Em mim, toca forte o tema de as mulheres terem o direito a maiores escolhas na vida;, disse Streep, em entrevista. E a palavra vem daquela que multiplicou vertentes de representações: foi da amável autora de receitas gastronômicas Julia Child à indigesta estilista Miranda Priestley, sem que se possa esquecer de sua recente composição da editora Katharine Graham, em The Post. Escolhas coerentes, para uma atriz que verifica e externa que, cada vez mais, as mulheres têm repulsa de serem ;polidas e silenciosas;. O legado crítico a estrela atribui ao fundamento da educação vinda de casa, numa família em que a lucidez da avó pesou.

No legado, Streep se vê combativa à ideia de ;as mulheres verem sentido na beleza, para se encaixarem no mundo;. Natural, portanto, que na telona, não tema se enfeiar para viver personagens complexos como a alcoólatra e moradora de rua Helen Archer, ao lado do astro Jack Nicholson, em Ironweed (1987), conduzido pelo brasileiro Hector Babenco. Quanto à técnica invejável, a estrela sintetiza: ;imito gestos;.

Não só gestos ; sotaques também são uma constante, atestada há anos com filmes como A vida íntima de um político (1979) e Entre dois amores (1985). Uma verdadeira fortaleza de pessoa, e de atriz que trabalhou com mestres como Mike Nichols, Woody Allen e Robert Altman, Streep se derrete mesmo é na paixão pelo canto e diante do poder da música. Basta lembrar que, aos 12 anos, já buscava aperfeiçoar a voz, em aulas de ópera e dos shows das performances musicais em Lembranças de Hollywood (1990) e Música do coração (1999).

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