Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Premiações em artes visuais não têm impacto apenas em artistas e público

Eles podem apontar o nome de quem estará nos livros escolares e movimentar o mercado e a economia criativa




Prêmios funcionam como um motor na cadeia produtiva da arte contemporânea, um impulso com o poder de impactar da geração de empregos à formação de público. Para quem passa longe de galerias e não compreende a relevância da arte contemporânea, acompanhar uma exposição resultante de uma honraria pode ser uma excelente maneira de começar a entender do assunto. Para os que precisam de números, basta saber que o Serviço Social da Indústria (Sesi), em parceria com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), que defende os interesses da indústria nacional, investe todos os anos mais de R$ 300 mil em um prêmio nacional que mapeia a arte brasileira.

O Brasil tem poucos salões e concursos de arte. Por isso, vale destacar que Brasília é privilegiada com dois prêmios locais que ajudam a fazer um mapeamento da produção da cidade. O Vera Brant e o Transborda Brasília ; o primeiro com duas edições e o segundo, com três ; são iniciativas locais, tocadas por pessoas que acreditam no valor simbólico e financeiro gerado pelos projetos. Já o Marcantônio Vilaça, criado há 15 anos pelo Sesi e pela CNI, nasceu da visão de que o caráter inovador e questionador na arte contemporânea brasileira tem uma relação com a própria indústria nacional.

Para Virgínia Manfrinato, uma das idealizadoras do Transborda Brasília, uma das motivações para investir na criação de um prêmio de artes plásticas local está no próprio mercado. ;Uma das maiores contribuições é reunir gente que está produzindo na cidade. É um jeito de manter o mercado de arte de Brasília aquecido e ativo sem que a gente tenha que sair daqui. É um jeito de ter visibilidade aqui. Só de mídia espontânea do Transborda é uma coisa absurda de grana, de movimentação financeira;, diz Virgínia. O Transborda contempla os ganhadores com valores de R$ 5 mil e R$ 15 mil e, em três edições, premiou 10 artistas. A ideia é fazer um mapeamento da produção brasiliense e dar visibilidade a esses artistas.

No Vera Brant, criado por Leonardo Góis e Rogério Carvalho e atualmente com exposição em cartaz no Espaço Cultural Renato Russo, o foco também está na arte assinada por nomes da cidade, mas a intenção é descobrir novos talentos e privilegiar o processo de produção dos trabalhos. Pedro Gandra, contemplado como artista em edição passada, reconhece que artes visuais ;é um nicho fechado;, mas enxerga nos prêmios uma importância que se projeta no futuro e, assim, pode afetar a vida de quem não frequenta exposições.

;O tempo vai passar e os prêmios ajudam a dar visibilidade a momentos e movimentos específicos que vão ser importantes para a história da cultura brasileira. A pessoa pode achar ou não importante, mas o que ela acha vai ficar irrelevante porque vai ser maior;, explica, lembrando que história da arte faz parte do currículo escolar. ;Futuramente ,o filho ou neto dessa pessoa estará estudando sobre esses artistas que os pais ou avós achavam irrelevantes. O tempo, na verdade, é que vai mostrar a relevância.;

O Prêmio Marcantônio Vilaça é um dos mais longevos no cenário da arte contemporânea. Nasceu em 2004 por iniciativa do Sesi e da CNI com a ideia de apontar talentos em todo o país. De olho nos profissionais do futuro e na indústria 4.0, as instituições acreditam que a arte pode ser um ponto estratégico nas mudanças trazidas pela tecnologia.

;O caráter inovador e questionador da produção contemporânea brasileira tem uma relação com a própria indústria no sentido de que estamos caminhando para uma indústria 4.0, na qual todos os conhecimentos vão mudar. Precisamos de profissionais que saibam fazer perguntas, em vez de dar respostas. E a arte contemporânea tem esse papel;, avisa Agnes Mileris, coordenadora do Marcantonio Vilaça.

;O Sesi entende que estimular a arte contemporânea estimula o pensamento crítico, a inovação e novas formas de trabalhar com materiais que já existem. Existe uma relação entre a arte e a indústria.; O Prêmio contempla cinco artistas com bolsas de R$ 50 mil para cada e seleciona 30, que recebem um pró-labore de R$ 2 mil para produzir a obra.

Economia

Os prêmios também movimentam a economia criativa e geram empregos, já que é necessária toda uma cadeia produtiva ao longo dos seis meses que costumam correr entre o lançamento de uma inscrição e a premiação em si. São moldureiros, marceneiros, iluminadores, equipes de montagem e de arte educação, motoristas, professores e outros que participam do processo de colocar uma obra dentro da galeria ou do museu.

;Prêmios ajudam a registrar e contar nossa história, formar e provocar novos públicos, além de movimentar uma grande cadeia de profissionais, gerando empregos e contribuindo com o crescimento econômico do país. Estudos mostram que para cada real investido em cultura, cerca de R$ 1,50 retorna ao país;, aponta Leonardo Góis.

Sem contar o próprio artista, que acaba inserido em um mercado que chegou a movimentar mais de US$ 63 bilhões em 2017 no planeta, segundo levantamento da Art Basel, a maior feira de arte do mundo. ;Prêmios trazem o que tem de mais recente e mais novo na arte contemporânea do país. São um portal para curadores e galerias. E fui convidada para exposições por pessoas que me conheceram por meio do Pipa. E é muito difícil circular porque acaba que as pessoas só te conhecem quando vêm a Brasília e veem o seu trabalho;, conta Cecília Bona, indicada ao Pipa em 2018 e ao Transborda duas vezes.


A circulação dos artistas é outro aspecto a ser considerado. Iniciativas como o Pipa e o Marcantonio Vilaça potencializam uma visibilidade que pode ser financeiramente impossível se empreendida individualmente. E essa visibilidade não é um ganho apenas para o artista: o público também se beneficia, já que quanto mais exposições disponíveis, maior é o acesso à arte, mesmo por parte daqueles que não se sentem envolvidos. Para os que não enxergam relevância na produção artística contemporânea ou acreditam que arte é algo supérfluo, a curadora Cinara Barbosa propõe um exercício de comparação com o turismo. Vencedora do Vera Brant este ano na categoria curadoria, ela aponta a arte como portadora de valor agregado fundamental.

Dar visibilidade à cidade é uma das consequências dos prêmios, mas há outras. ;Com o que artistas e pessoas da cultura trabalham? Eles trabalham também com uma camada do campo simbólico. É muito difícil para pessoas entenderem isso quando elas têm em mente um campo de resultados muito imediato. O campo simbólico agrega um valor inestimável;, garante Cinara. ;O turismo atua no campo do simbólico e agrega um valor que é inestimável para aquele produto em questão. Quando falamos de artes visuais, falamos de um campo de visibilidade para outros mercados e conjecturas que é inestimável.;
II Prêmio Vera Brant de Arte Contemporânea
Visitação até 9 de junho, de terça a sábado, das 10h às 20h, e domingo, das 10h às 19h, no Espaço Cultural Renato Russo (508 Sul)