Diversão e Arte

Cantores da nova geração do sertanejo resgatam a raiz do gênero com o modão

A dupla Matheus e Kauan é um dos expoentes

Adriana Izel
postado em 07/04/2019 06:00
Conhecidos na vertente universitária, Matheus & Kauan gravaram um disco dedicado a moda sertaneja
Sertanejo de raiz, sertanejo caipira, moda de viola, modão. Todos esses são termos usados para designar as músicas caipira e sertaneja, vertentes nascidas do mesmo estilo, mas que vivem um embate antigo por conta das evoluções, mudanças e interferências do ritmo. Durante muito tempo, o termo valia para ambos. Porém, quando a música sertaneja se aproximou do conceito urbano cantando o romantismo e adotando instrumentos elétricos, os estilos puderam se distinguir, pelo menos esteticamente e para os mais tradicionais que não queriam misturar o tal regionalismo com o urbanismo.

Em conceitos simples, a música caipira e a moda de viola são termos para explicar a música de raiz do sertanejo, gênero que foi defendido por artistas como Tonico & Tinoco, Tião Carreiro & Pardinho, Pedro Bento & Zé da Estrada, Inezita Barroso e Zé Mulato & Cassiano, que atuam até hoje ativamente na cena da viola do Distrito Federal. ;A moda de viola digamos que é a música de raiz, que vem da origem desse gênero musical. Cantada por duplas que pavimentaram todo esse caminho cantando a temática rural, do campo, da natureza e os sentimentos mais puros;, explica Edvan Antunes, autor do livro De caipira a universitário ; A história do sucesso da música sertaneja.

Quando se fala em sertanejo raiz e modão (ou simplesmente, moda), a referência nos dias de hoje é ao sertanejo que se diferenciou do caipira no fim dos anos 1980 e início dos anos 1990 com duplas como Chitãozinho & Xororó, Milionário & José Rico, João Mineiro & Marciano, Leandro & Leonardo e Christian & Ralf. ;Depois da urbanização do Brasil, houve uma migração da população do campo, ao se urbanizar os gêneros também foram acompanhando isso ; não só o sertanejo ; abordando essa temática romântica. E quando chegou aos anos 2000, a temática mudou novamente, indo mais para a balada, que é o sertanejo universitário;, complementa o pesquisador.
Milionário & José Rico integram os artistas do chamado modão, como é popularmente conhecido o sertanejo romântico

São principalmente os artistas do sertanejo universitário que usam o termo ;modão; para retratar a música feita por artistas dos anos 1980 e 1990 dentro do cenário sertanejo. ;Essa nova geração tem influência do pop e do rock. A levada deles é falar de relacionamentos sem compromisso, amores rápidos, baladas, bebida, retratando um universo próprio dos jovens. Então, para esses jovens tudo que tocava nos anos 1980 e 1990 eles designam como modão, para não falar que é música antiga;, afirma Antunes.

Mas o que define o modão? A partir desse conceito, a vertente tem como principal característica o romantismo, que canta a distância da pessoa amada, a ;dor de cotovelo;, aquele sertanejo que por muitos anos foi visto como ;de corno;. O oposto do universitário que busca a concretização do amor e o hedonismo individualista que não sofre com a relação amorosa não realizada, como destrincha Gustavo Afonso no livro Cowboys do asfalto ; Música sertaneja e modernização brasileira.

Resgate ao passado

Em março deste ano, a dupla Matheus & Kauan, que tem 10 anos de trajetória no mercado musical, lançou o álbum Tem moda pra tudo (ao vivo). Com 12 faixas inéditas, o disco bebe da fonte do sertanejo romântico na letra falando de amores mal resolvidos, enquanto na sonoridade e no conceito visual, busca o acústico da viola e o cenário rural. Ou seja, bebe tanto do modão quanto da moda de viola. ;Tínhamos vontade de fazer um projeto acústico porque já gravamos muitas músicas com influência de outros estilos musicais. A gente tinha essa vontade de fazer um projeto mais sertanejo. Até por isso, o DVD foi gravado em uma fazenda do Goiás;, justifica Kauan.

César Menotti & Fabiano foram uma das primeiras duplas da nova geração a fazer o resgate do sertanejo raiz
Demonstrando o conceito visto pela nova geração de modão, Matheus & Kauan cantam na faixa que inspira o título do álbum: ;Tem moda pra beber, tem moda pra chorar/ Tem moda pra tudo, só não tem pra desapaixonar/ Tem moda pra sofrer, tem moda pra voltar/ Então como é que eu faço pra esquecer de lembrar?;. E, apesar de se inspirarem na moda sertaneja, eles as misturam com conceitos atuais, falando de superação, como em Vou ter que superar (gravada com Marília Mendonça) e fazendo referências a bebidas, a exemplo de Cerveja, sal e limão, Quarta cadeira (dueto com Jorge & Mateus) e Bebeu, lembrou, características do sertanejo universitário.

Para Kauan, o lançamento de Tem moda pra tudo é uma forma da dupla trazer ao mercado uma inovação, por se diferenciar das canções tocadas atualmente nas rádios e nas plataformas digitais. Estratégia que foi usada há mais de 20 anos por Chitãozinho & Xororó, quando, em 1996, lançaram o álbum Clássicos sertanejos, composto por canções, como Cabocla Tereza (Raul Torres & Serrinha) e Saudade da minha terra (Belmonte & Amaraí), as chamadas modas de viola. O que também voltou ao cenário musical em 2004 quando César Menotti & Fabiano gravaram a música Quem não gosta de viola, no CD Palavras de amor, e 10 anos depois novamente com o material Memórias anos 80 & 90, que ganhou uma segunda parte em 2017.

;Há diversos artistas que flertam com o ;sertanejo raiz;. De Michel Teló a Paula Fernandes, de Jads & Jadson a João Carreiro & Capataz, todos já louvaram a tradição e regravaram canções de gerações hoje vistas como ;de raiz;. É importante dizer que, em parte, o sertanejo teve sua importância revitalizada por estes sertanejos modernos, que com frequência regravam canções de outras gerações em busca da legitimidade pela louvação da tradição. Curioso é perceber que o que era ;moderno; há algumas décadas, passa a ser legitimado pelo rótulo da ;tradição; e ;de raiz;;, afirma Gustavo Alonso.





Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação