Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Companhia de teatro Udi Grudi completa 37 anos de muito teatro

Tradicional na cena teatral brasileira, companhia comemora 37 anos com temporada de verão no Espaço Cultural Renato Russo



O palco do Espaço Cultural Renato Russo, às margens da W3 Sul, se transforma para receber o espetáculo Ovo. Nos dois últimos fins de semana de fevereiro, a temporada de verão da companhia de teatro circense Udi Grudi abrilhanta a cena do Distrito Federal. ;É um espetáculo para adultos que agrada as crianças também. São várias camadas da percepção do espetáculo;, explica Luciano Porto, membro do grupo.

As apresentações ocorrem às 20h neste sábado e às 19h no domingo. Os horários se repetem no próximo fim de semana. Ovo fala da fome e da escassez, da reciclagem e do lixo, como define Luciano. ;Não é um espetáculo que fala: ;Você tem que reciclar;. A gente faz isso, a gente transforma as coisas;, ressalta a diretora Leo Sykes. De maneira didática, descontraída e com linguagem cômica grotesca atrelada à música, três homens criam e refazem o que tocam por viverem cercados por lixo.

Ovo existe desde 2003 e recebeu, em 2008, o Prêmio Villanueva da União dos Artistas Cênicos de Cuba (Uneac). Viajou uma parte considerável do globo, foi apresentado ao respeitável público de Itália, do México, Estados Unidos, Alemanha, Dinamarca, Escócia e Cuba. ;Tratamos do tema da escassez e a solução que a gente dá é a transformação. Nós transformamos lixo em comida, lixo em poesia;, explica Luciano. ;Reforçamos que a grande solução é a criatividade, usar a inventividade para solucionar problemas;

No palco, atuam os palhaços Marcelo Beré, Márcio Vieira e Luciano Porto. A londrina Leo Sykes é responsável pela direção. É de Márcio Vieira a autoria dos instrumentos musicais usados no espetáculo, composto de materiais que, à primeira vista, podem parecer lixo. Os figurinos e a cenografia também seguem a mesma linha.

História

A companhia Udi Grudi surgiu em Brasília em 1982, a partir da montagem de uma peça de nome Circo Udi Grudi, de Jeanne Marie. Luciano, Marcelo e Márcio então formaram o grupo que, no ano seguinte, montou a primeira peça Gambira goiaba. No começo da trajetória pelo Distrito Federal, o grupo desenvolveu projetos culturais enquanto emergia em intensa pesquisa sobre a linguagem circense. ;Os meninos aprenderam muita coisa do circo tradicional, como malabares e acrobacia;, explica Leo.

O grupo montou, posteriormente, o espetáculo Menina dos olhos, sob direção de Hugo Rodas. Dentre os prêmios conquistados pelo trabalho, três prêmios APAC-DF (Melhor trilha sonora, melhor espetáculo infantil e melhor cenário) e o prêmio Concorrência Fiat de 1989. Foi a partir de 1998, que entrou em cena a diretora Leo Sykes, dirigindo os palhaços da Udi Grudi na nova peça O cano. ;Foi a primeira vez que o grupo saiu do Distrito Federal e proximidades;, ela relembra.

É preciso, para a diretora, ordenar em ordem alfabética os países por onde o espetáculo passou para conseguir lembrar de todos. Ela conta como o grupo foi recebido no festival Sesc de São Paulo, em 1999. ;Éramos desconhecidos de Brasília, colocaram a gente para se apresentar às 10h da manhã, mas fizemos muito sucesso lá. Um produtor suíço nos levou para o festival de Edimburgo. A apresentação também foi marcada para 10 horas e de novo, éramos como desconhecidos também;, ela relembra.

O cano fez muito sucesso em Edimburgo, o que garantiu para o Udi Grudi diversas avaliações positivas da crítica e uma infinidade de convites para outros festivais. O grupo ganhou, no festival de Edimburgo, o prêmio The Herald Angel Award. Os palhaços também já foram presenteados com a comenda da Ordem do Mérito Cultural do Distrito Federal.

Olhares

Neste ano, a trupe completa 37 anos de existência com inúmeras participações em festivais nacionais e internacionais, passaporte carimbado para vários países e muitos prêmios na bagagem. ;Quando os Udi Grudi eram jovens, eram quase os únicos. Agora não, tem muita gente fazendo trabalhos maravilhosos;, pontua Leo. ;É difícil viver artisticamente, há o risco de beirar o amadorismo por não conseguir manter o espetáculo, levá-lo para outros lugares.;

Para a diretora, o tempo passou rápido demais. ;Depois de uns cinco ou sete anos juntos, eu pude reconhecer que a gente tinha uma linguagem nossa, talvez ela estivesse ali antes, mas só consegui reconhecer a partir daí. Depois disso, o desafio passou a ser não se repetir e se renovar;, ela relembra.

Luciano ressalta que, apesar dos anos, a energia continua. ;Sentimos já o peso dos anos, mas, ao mesmo tempo, a cena nos estimula e nos rejuvenesce;, ele ressalta. ;O palhaço busca não só atingir a criança como achar a criança dentro de cada um, inclusive do próprio palhaço;

Para o grupo, os projetos pessoais são de essencial importância. Leo exemplifica com o conceito de forças centrífugas, de Eugênio Barba. ;São projetos individuais ou não do grupo inteiro que fazem os membros voltar com mais gás para as atividades do grupo;, ela define. A diretora também reconhece que, no DF, os grupos acabam vítimas de um certo isolamento devido ao alto custo para levar os espetáculos para outros lugares.

;Talvez, o isolamento até nos ajude, nós viramos um ambiente e temos identidade artística. Todo mundo se conhece e se vê, existe uma polinização entre os grupos que eu acho muito boa;, ela ressalta. Para 2019, além da temporada de verão, parte dos membros está envolvida com o projeto do parque sonoro DiverSom, um playground que percorrerá sete parques públicos do DF a partir de maio, ainda sem itinerário definido.

Também está em desenvolvimento o longa Vidas de cachorro, um desenvolvimento do espetáculo Ovo que misturará alguns elementos de outros espetáculos numa ;ficção maluca;. O palhaço Marcelo Beré desenvolve, ao lado de Leo, um solo sobre a velhice, ainda sem data de estreia ou nome definido.

* Estagiária sob supervisão de Igor Silveira


Temporada de verão da Companhia Udi Grudi

Espaço Cultural Renato Russo (508 Sul). Sábado, às 20h e domingo, às 19h, nos dias 17, 23 e 24 de fevereiro. Ingressos: R$ 20 (meia-entrada). Classificação indicativa livre.