Ricardo Daehn
postado em 14/02/2019 06:31
Não é de hoje que o Oscar tem se ajustado a repassar um sentimento de inclusão, contemplando representantes de diversos países na lista dos indicados. Mas a realidade da 91; celebração da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas traz uma série de nomes incomuns dentro do seleto grupo hollywoodiano, ampliando representatividade. Entre as cinco animações selecionadas, por exemplo, está a produção japonesa Mirai; enquanto entre as atrizes há presenças raras de mexicanas, como Yalitza Aparício e Marina de Tavira (ambas de Roma), precedidas apenas, no painel histórico do Oscar, por interpretações em espanhol de Penélope Cruz, Catalina Sandino Moreno e Adriana Barraza.
A lista dos cinco diretores selecionados para a disputa também traz abundância de estrangeiros: apenas Spike Lee (de Infiltrado na Klan) e Adam McKay (de Vice) são norte-americanos. Há 31 anos, uma situação similar alinhou o italiano Bernardo Bertolucci, o sueco Lasse Hallstr;m, e os ingleses John Boorman e Adrian Lyne, além do canadense Norman Jewison. Mas a verdade é que os três últimos traziam fitas faladas em inglês e nem tão distanciadas de produção em Hollywood.
Lembrando dobradinhas de candidatos do passado, como Ingmar Bergman e Lina Wertmüller (indicados em 1977), como a dupla Akira Kurosawa e Hector Babenco (em 1986), e dos concorrentes Pedro Almodóvar e Roman Polanski (2003) e Ang Lee e Michael Haneke (2013); este ano, a categoria de direção alinha os cineastas Alfonso Cuarón (mexicano), Pawel Pawlikowski (polonês, que, no passado, venceu o Oscar por Ida), e o grego Yorgos Lanthimos. Os dois primeiros da lista defendem, respectivamente, Roma e Guerra Fria, filmes genuinamente associados à cultura original de cada realizador.
Já Yorgos Lanthimos (que, há dois anos, competiu pelo roteiro original do longa O lagosta) está à frente de A favorita, um dos recordistas de indicações (são 10, ao todo), mas que trata de eventos relacionados ao conturbado período em que a rainha Ana, no século 18, imperou na Grã-Bretanha.
Roma, na 91; edição do Oscar, crava momento histórico, sendo o quinto filme a concorrer como melhor filme e melhor filme estrangeiro, depois apenas de O tigre e o dragão, Z, A vida é bela e Amor. E mais ainda: é um produto criado pela Netflix que atende ao serviço de streaming, sem ampla distribuição por salas de cinema. Outra peculiaridade que cerca as dez indicações ao Oscar do filme de Cuarón está no fato de ele mesmo alavancar uma das maiores qualidades da fita ; o aspecto visual, elaborado a partir de sua técnica como diretor de fotografia.
Os antecedentes de premiação para estrangeiros, nesta categoria, são extremamente recompensadores, como confirma a penca de vitoriosos: do italiano Mauro Fiori ao mexicano Guillermo Navarro, passando pelo chileno Claudio Miranda e pelo sueco Linus Sandgren, isso sem desprezar o mexicano Emmanuel Lubezki (dono do feito de ter três prêmios Oscar consecutivos) ou esquecer dos geniais Sven Nykvist e Vittorio Storaro.
Fotografia
Além de ter Cuarón como candidato de peso, a categoria de direção de fotografia está particularmente integrada por profissionais de matrizes internacionais. A começar por Matthew Libatique, de Nasce uma estrela, que é filho de imigrantes filipinos e sempre é associado à parceria com Darren Aronofsky, de Cisne negro. Além do irlandês Robbie Ryan, que usou praticamente luz do sol e iluminações de velas e lareiras para o longa, ser lembrado pelo esforço em A favorita, o próprio americano Caleb Deschanel está candidato, mas por um filme ítalo-germânico batizado de Nunca deixe de lembrar.
Da terra do lendário diretor de fotografia polonês Janusz Kaminski (dono de um dos maiores casamentos artísticos com Steven Spielberg), Lukasz Zal ; que já havia concorrido, há quatro anos, pelo longa Ida ; é o quinto profissional na lista da Academia, destacado pelo monumental trabalho em preto e branco registrado em Guerra Fria.
Finalmente, na categoria dos cinco longas elencados para melhor filme estrangeiro, afora o franco-favorito Roma, há chance de Cafarnaum, um comovente drama sobre crianças criadas ao léu, render à diretora libanesa Nadine Labaki (vencedora do Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes) um Oscar. O histórico para a façanha é animador: em 2010, a dinamarquesa Susanne Bier venceu, por Em um mundo melhor, enquanto, em 2001 e 1995, respectivamente as diretoras Caroline Link (alemã) e Marleen Gorris (holandesa) conquistaram Oscar de filme estrangeiro por Lugar nenhum na África e A excêntrica família de Antônia. Relacionados a temas bélicos, os concorrentes para o feito de Labaki são Nunca deixe de lembrar (Florian Henckel von Donnersmarck, que já venceu estatueta, por A vida dos outros) e Guerra Fria se juntam ao vencedor da Palma de Ouro em Cannes Assunto de família (do Japão).
Curiosidades
; O diretor polonês Roman Polanski venceu Oscar de direção por O pianista (2002), que tinha o enredo desenvolvido em russo, inglês e alemão.
; Uma completa babilônia na comunicação em tâmil, francês, inglês, japonês, chinês e híndi desponta em As aventuras de Pi (2012), filme que rendeu Oscar ao taiwanês Ang Lee.
; Comandado pelo italiano Bernado Bertolucci, O último imperador (1988) encheu a tela com diálogos em japonês, mandarim e inglês.