Paris, França - Quem foi a modelo de "A origem do mundo", a famosa e provocativa pintura do francês Gustave Courbet? Agora, 152 anos depois de sua criação, o mistério foi resolvido.
Ela se chamava Constance Quéniaux e era bailarina da Ópera de Paris, segundo o livro "L;origine du monde, vie du mod;le", que será publicado na França em 4 de outubro.
Seu autor, Claude Schopp, laureado com o prestigioso prêmio Goncourt de Biografia em 2017, deparou-se sem querer com sua identidade enquanto analisava a correspondência entre os escritores Alexandre Dumas Filho e George Sand.
O objetivo deste pesquisador não era investigar "A origem do mundo", um nu sem rosto pintado pelo realista Gustave Courbet em 1866 e exposto no Museu d;Orsay de Paris desde 1995. Sua tarefa era analisar as "alusões" presentes nas trocas escritas entre ambos os autores com o objetivo de "esclarecê-las".
Mas Schopp encontrou uma inesperada errata de duas palavras que se escrevem se forma parecida em francês, interview e intérieur (entrevista e interior), na transcrição de uma carta de Dumas a Sand datada de junho de 1871.
O remetente, hostil à Comuna - movimento de insurreição que tomou brevemente o poder em Paris - vocifera contra um de seus apoios, Courbet. "Não se pode pintar com o pincel mais delicado e sonoro a entrevista (interview em francês) da Senhorita Queniault da Ópera", escreve Dumas.
"A entrevista? Isso não queria dizer nada", explica Schopp à AFP.
O especialista decidiu confrontar a transcrição com o manuscrito conservado na Biblioteca Nacional da França (BnF), e descobriu que não está escrito "entrevista", mas "interior" (intérieur).
"Foi como uma iluminação", recorda Schopp. "Normalmente, preciso trabalhar muito para fazer uma descoberta, desta vez foi sem procurar, foi injusto".
"Este testemunho de época descoberto por Claude me permite dizer que temos 99% de certeza de que a modelo de Courbet foi Constance Quéniaux", diz à AFP Sylvie Aubenas, diretora do departamento de fotografia da BnF.
Buquê de flores
Até agora, sabia-se que a obra tinha sido encomendada pelo diplomata turco-egípcio Jalil-Bey e que Courbet a havia pintado durante o verão de 1866.
Antes da descoberta de Schopp, haviam circulado vários nomes em relação à identidade da modelo, como Joanna Hiffernan, amante de Courbet durante esses meses, mas seu cabelo acaju e sua pele branca não correspondiam ao que é mostrado na obra.
Também se considerou a amante do diplomata otomano Jeanne de Tourbey, mas era uma figura muito destacada na sociedade para servir de modelo.
O cabelo preto de Constance e suas "belas sobrancelhas pretas", elogiadas pela crítica quando dançava na Ópera, estão mais de acordo com os pelos pubianos volumosos da modelo, explica Aubenas, cujo departamento conserva várias fotografias da bailarina.
Em 1866, tinha 34 anos. Não dançava havia sete anos e era uma das amantes de Jalil-Bey.
Por que seu nome não apareceu antes? Devia ser "um segredo conhecido por todos", sugere Aubenas. E se Dumas revelou seu nome, foi sobretudo por ressentimento em relação a Courbet. Com o tempo, Constance se tornou uma "mulher de bem", "respeitável" e entregue às obras filantrópicas.
Um último elemento reforça a descoberta de Schopp: durante a venda da herança de Constance, após sua morte, em 1908, apareceu um quadro de Courbet que representa um buquê de flores e várias plantas em vasos.
Na esquerda da composição, destacam-se flores primaverais e na direita, camélias vermelhas e brancas, "as flores destinadas às cortesãs desde Dumas Filho", autor "A Dama das Camélias", destaca Aubenas.
Mas sobretudo, no centro, uma planta se oferece ao espectador com uma corola vermelha, profunda e aberta: "O artista e o comprador não poderiam ter feito uma homenagem mais bela a Constance", acrescenta.