Desde o ano passado, com o lançamento do álbum Duas cidades, a banda Baiana System ganhou destaque no mundo da música. O material, composto por 12 faixas, chamou atenção para o grupo formado em 2009 por Russo Passapusso, Roberto Barreto e SekoBass.
A dificuldade em definir o estilo da banda é um dos principais atrativos em relação ao trabalho do coletivo. O grupo bebe de diversas fontes: da cultura da Bahia, com a presença da guitarra baiana; da África, com a percussão; e da Jamaica, com os sistemas de sound system. O discurso politizado também é outro ponto de destaque do Baiana System.
Neste ano, a banda também se firmou como o grupo com o melhor show do país. As apresentações do Baiana System nos festivais Lollapalooza e Rock in Rio foram consideradas as melhores dos eventos. Esse título também poderia valer para o show da banda no festival Porão do Rock, em Brasília, quando o coletivo colocou todo mundo para dançar mesmo sob forte chuva. Em entrevista ao Correio, o guitarrista Roberto Barreto lembra o início do grupo e fala sobre os futuros projetos.
ENTREVISTA / ROBERTO BARRETO
O que vocês pensaram na hora de criar o conceito do Baiana System?
O Baiana System surge com a ideia de trazer um ambiente e um trabalho com a guitarra baiana. Por isso, o nome, que vem da guitarra baiana com o system, que são os sistemas de sons jamaicanos e que têm toda uma cultura em volta. Que é a cultura de fazer isso na rua, de ter bases produzidas e músicas sendo tocadas em cima. Então, dentro dessa cultura de sound system, começamos o Baiana System, usando a guitarra baiana, que deu origem aos trios elétricos aqui na Bahia, como esse instrumento e uma das vozes desse sound system. E usando o sound system como essa estética em que usamos e produzimos bases para que a possamos partir para as músicas. E também tem toda uma coisa visual já embutida. Então essa ideia inicial já veio muito agregada às imagens e às ilustrações. A partir disso fomos para uma experimentação.
Existe uma dificuldade na hora de definir o estilo da banda. Como você definiria?
Não tem como e não definimos. E nem tem porque se definir. Se definindo você se limita e acaba criando umas amarras. Nos últimos anos temos mais elementos de rock. A formatação mudou um pouco. A guitarra entrou com a guitarra baiana e isso deu um outro peso. A própria postura e forma do show transita muito como um show de rock. Em alguns momentos a coisa do reggae fica mais clara, em outros a música mais afro percussiva e baiana fica mais forte. Então não tem (como definir) e não sentimos muito essa necessidade.
Como você falou, nos shows a banda mostra vários lados e as apresentações já ganharam títulos de as melhores do Brasil. Como vocês recebem isso?
Para quem está no meio desse processo fica meio difícil identificar isso. Muitas vezes temos um lado de uma dualidade (sobre isso). Ficamos felizes em receber esse feedback. Ao mesmo tempo, isso nos dá uma responsabilidade muito grande no sentido de fazer com que aquilo fique melhor e que não fique parado, de uma forma que tenha uma mobilidade, que nosso show possa evoluir. Acho que talvez o que tenha de mais forte é a nossa interação. O nosso show muda muito de acordo com o público, com o lugar que a estamos tocando, com a resposta e isso é muito verdadeiro e muito claro para quem está lá. Não teria como funcionar se a tivéssemos um roteiro fechado. Temos um desenho e algo pré-definido, mas aquilo muda muito. É muito vivo e experimental nesse sentido. Acho que isso traz uma verdade, além de ser um show que é muito dançante. Acho que tudo isso traz realidade para as pessoas.
As músicas de vocês têm sempre discurso politizado e social. Qual é a importância de tocar em temas que são importantes para o país?
Eu não diria que sempre. Fazemos músicas que abordam outros elementos. O Russo, que é muito quem escreve as letras, tem essa coisa de observar o cotidiano e fazer meio que crônicas do que ele está vivendo. Mas acho que no momento em que estamos vivendo é inevitável que você toque nesses assuntos. Acho que hoje o que perpassa todo o discurso da sociedade é justamente um posicionamento político e social e que acaba influenciando, não são coisas dissociadas. O discurso político nos influencia como artistas, no que fazemos e em como circulamos. Esse assunto é o grande tema hoje e de todos. E não tem como você não falar nisso. Mas fazemos sem que isso seja uma bandeira ou um compromisso, fazemos simplesmente para as pessoas pensarem. Isso tem sido uma tônica nos nossos dias e acaba se refletindo na nossa música.
Há uma comparação entre o Baiana System e a Nação Zumbi, principalmente, ao que a banda foi para o movimento no Recife. Como você vê essa comparação?
Eu não usaria a palavra comparação. Eu acho que é mais o que você falou, em ter uma relação com o que a Nação simboliza e representa para a cultura pernambucana. Os símbolos que eles usam e a forma como eles juntam elementos tradicionais com o pop, o rock e o hip-hop. A relação e o olhar deles para dentro e a força para a cultura natural. E isso, de certa forma, é o que o Baiana vem fazendo. A relação com o carnaval, com a percussão afrobaiana, com a guitarra baiana e com os elementos de rua da Bahia dialogando. Nesse sentido, vemos uma ligação e ficamos honrados das pessoas enxergarem isso. Temos uma relação próxima com eles, fizemos shows e algumas coisas juntos. É uma honra e mais uma responsabilidade sermos comparados com a Nação Zumbi.
Vocês lançaram no ano passado Duas cidades. Já estão trabalhando em algum novo projeto?
Sempre estamos gravando coisas e produzindo. É algo que faz parte da nossa forma de trabalhar. Mas vamos deixar as coisas amadurecerem por elas. Provavelmente em 2018 devemos lançar um disco, porque estamos com bastante material. Mas seguimos fazendo os shows do Duas cidades, no meio disso tem o carnaval e as colaborações que fazemos com outros artistas. Estamos da mesma forma que começamos: trabalhando, produzindo e pensando em coisas juntos e separados.
Falando em carnaval, teremos Navio Pirata no carnaval de Salvador?
Provavelmente, sim. O Navio Pirata é meio uma necessidade nossa, tanto artística quanto de relação com o público. O carnaval em Salvador funciona de maneira meio caótica e nunca se organiza com muita antecedência. Mas estamos tentando fazer com o que o Navio pirata saia. Sem dúvida, vamos participar do carnaval de alguma forma.