Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

2017: o ano do close e da 'fechação' das Drag Queens

Apesar de o Brasil ser o país que mais mata LGBTs nas Américas, o sucesso dessas artistas é nítido e tende a crescer ainda mais, contrariando a onda de conservadorismo que tem assolado o país e o mundo

O ano de 2017 foi um marco para a história das drags queens. As representantes da cultura LGBTs estão conquistando cada vez mais o espaço no mercado musical brasileiro e derrubando preconceitos. Com vários hits e mistura de ritmos, elas vêm mostrando que ser drag é muito mais do que peruca e maquiagem. É uma arte e, como qualquer outra, merece respeito. De acordo com o relatório da Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros e Intersexuais (ILGA), o Brasil é o país que mais mata LGBT;s nas Américas. Apesar dessa realidade, o sucesso dessas artistas é nítido e tende a crescer ainda mais, contrariando a onda de conservadorismo que tem assolado o Brasil e o mundo.
No último sábado (25/11), no NET Live, ocorreu a festa de comemoração de 6 anos da boate Victoria Haus, que contou com as apresentações das drags Pabllo Vittar, a mais famosa do mundo, Mulher Pepita, Aretuza Lovi, Gloria Groove e Lia Clark. As três últimas, em conversa com o Correio, dão dicas para quem quer se tornar uma rainha drag, falam da importância da representatividade no meio musical e da luta contra o preconceito.

Quem são

Lia Clark lançou em janeiro de 2016 a canção Trava Trava, sucesso no qual conquistou a segunda posição das canções mais virais nas plataformas de streaming. Em setembro do mesmo ano, a artista lançou seu primeiro EP, intitulado Clark Boom, que conta com sete canções, e uma delas é Chifrudo, uma parceria com a funkeira Mulher Pepita. O videoclipe foi lançado em janeiro deste ano e já passa de oito milhões de visualizações.
Aretuza Lovi bombou com o single Catuaba, uma parceria com Gloria Groove, hit que já passou dos cinco milhões de visualizações. Neste ano, a drag lançou o videoclipe da canção Vagabundo. A cantora já prepara Mercadinho ; próximo álbum da artista sem data de lançamento ;, e uma das canções é uma parceria com Pabllo Vittar e Gloria Groove, chamada Joga Bunda.
Gloria Groove ganhou visibilidade na mídia com o videoclipe da música Dona. Em poucos meses o vídeo alcançou mais de um milhão de visualizações. Neste ano, a cantora lançou seu primeiro álbum ; Proceder ;, que conta com singles como Gloriosa e Império, este último sendo o mais visualizado da artista.

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Entrevista

1 ; Como você define a sua drag queen?

Gloria Groove: A Gloria Groove passou há muito tempo de um status de personagem, a cada dia eu percebo que não passa de um nome artístico, porque representa 100% do que eu, como Daniel, também acredito que é bonito, que é legal, interessante e divertido. Quando a Gloria apareceu na minha vida, coisas começaram a acontecer, eu acho que precisei me olhar no espelho, montada, para vir desencadeando várias outras coisas na minha cabeça.
Lia Clark: A Lia Clark é uma pessoa muito divertido, extrovertida, que gosta de espalhar muita diversão para o mundo. É uma pessoa que adora mostrar o corpo. Eu sou uma "piriguete" mesmo.
Aretuza Lovi: O Correio é um jornal que sempre abriu muito espaço para mim, desde o começo, eu fico muito feliz com isso. Eu nasci no interior de Goiás, mas a minha vida artística começou aqui em Brasília. Nós drags ainda temos pouco espaço, temos muita visibilidade, mas poucas oportunidades de se consagrar como artistas, mas aos poucos essas as coisas estão mudando.

2 ; O que uma pessoa tem que ter pra se tornar uma drag?

Gloria Groove: Tem que ter originalidade, singularidade, vir com alguma coisa que ninguém ainda viu. Se baste em um nível que você é a única pessoa que precisa para correr atrás desse sonho. Vai ter muita gente no meio do caminho falando que não vale a pena, que não é legal e não é válido, mas se você tiver com uma saúde mental muito boa, e se existir um propósito muito da hora por trás, principalmente, pode ter certeza que vai evoluir da melhor forma.
Lia Clark: Você tem que ser verdadeiro consigo mesmo, com sua própria arte, não pode seguir tendência. Acredito que se você entregar a realidade que está dentro de si, você vai além. Eu não sou uma drag regular, eu sou bem diferente, eu sou funkeira, mostro o corpo, uso uns looks exagerados, acho que você tem que seguir o que o seu coração manda e uma hora vai dar certo, é só ter fé.
Aretuza Lovi: As pessoas precisam entender o que é drag, não banalizar, não sexualizar. Drag é um homem vestido de mulher, mas tem um contexto de uma arte, não é só colocar uma maquiagem e uma peruca, você tem que entender aquilo como uma essência artística.

3 ; O que precisa ser feito para que o preconceito diminua na sociedade?

Gloria Groove: Nós vivemos no país que mais mata LGBT;s no mundo. É catártico pensar que estamos fazendo sucesso e barulho, no mesmo lugar que acontece isso. Eu não vejo ali no horizonte, o final do preconceito, isso é uma ilusão. Existe uma falsa visão de que porque a gente tem sucesso, notoriedade e visibilidade, o preconceito magicamente acabou, sendo que não, validação é muito diferente de aceitação, uma pessoa pode me validar artisticamente e não necessariamente aceitar quem eu sou.
Lia Clark: O preconceito existe desde sempre, eu acho que o que podemos fazer é nos desconstruir e estudar mais. A Lia Clark me ajudou a ter uma mente muito aberta, e eu sei que as pessoas não tem essa minha visão. O mundo é tão livre que temos que parar com essas amarras.
Aretuza Lovi: O preconceito é uma coisa que nunca vai acabar, vai de geração em geração. A nossa sociedade dá dez passos para a frente e vinte para trás. Nós temos uma bancada no Senado que tem uma visão podre, você não cura o amor, eu não sou doente.

*Estagiário sob supervisão de Anderson Costolli.