Impulsionados pela versatilidade do estilo e a possibilidade de misturar diferentes linguagens por meio da criação corporal, grupos brasilienses renovam a dança contemporânea na capital. Dizer sem palavras e fazer poesia com os movimentos: é isso que buscam os bailarinos de grupos que esforçam por criar novos projetos e movimentar a criação artística na cidade. Os movimentos contemporâneos se inspiram na ruptura com as estruturas clássicas e na autonomia para que cada intérprete construa sua forma de expressão.
Grupos tradicionais da capital dividem espaço com jovens artistas, como os do grupo Rodrigo Cruz Cia. de Dança. Rodrigo, fundador da companhia, começou a dançar ainda criança, em um projeto social em Samambaia, e completa 21 anos de treino em diversas modalidades. Depois de passar por experiências no jazz, ballet clássico e moderno e dança afro, ele decidiu se empenhar na pesquisa e atuação da estética contemporânea.
Sua companhia de dança é um projeto social que, atualmente, acontece no centro cultural da Ceilândia e na Escola Parque da Ceilândia. Para Rodrigo, é preciso que os grupos atuais e antigos da cidade se empenhem mais em movimentar o cenário da capital, equilibrando a teoria e a tradição dos grandes nomes com o fomento da criação atual.
Para o artista, a falta de diálogo entre os grupos em formação e os profissionais tradicionais da cidade, além de maior abertura para diálogo entre as companhias, colabora para que a nova geração da dança em Brasília encontre dificuldades para formar um bom cenário. ;O que pode ser feito para melhorar também a circulação de público é priorizar também o ensino da dança nas escolas, torná-la natural. Acredito que a dança tem uma potência muito grande em temos de comunicação;, destaca.
A dança contemporânea busca retratar seu próprio mundo ao redor, sendo um reflexo da arte e das transformações de seu tempo. Existem diferentes metodologias e estilos para chegar ao ponto pessoal de expressão de cada grupo, entre o trabalho de improviso e o treino árduo. O trabalho dos bailarinos passa por condicionamento físico, expressividade corporal e atenção aos movimentos. ;A criação dos nossos espetáculos gira em torno, quase sempre, do que está acontecendo no mundo (violência, questões de gênero, liberdade, direitos civis, etc); temos um estilo bem peculiar, gostamos de falar do nosso país, então usamos muitas músicas brasileiras;, destaca Rodrigo Cruz.
Inovação
O coreógrafo da Foco cia de dança, Renato Fernandes, se prepara atualmente para a primeira apresentação do mais recente espetáculo da companhia, parte do projeto TR3S. O projeto reúne o trabalho de três coreógrafos em uma noite para celebrar os três anos de existência da jovem companhia e promoveu parcerias com coreógrafos de outros estados para auxiliar na pesquisa corporal dos bailarinos. Assim, artistas do Rio de Janeiro e Brasília se encontram para compor um espetáculo inovador e de qualidade, que estreia em 15 de novembro.
A proposta é que, em cada ato, os bailarinos dancem com uma linha de pesquisa diferente. Renato trabalha há 18 anos com a dança e acredita que Brasília tem caminhado por uma trilha irregular em sua produção artística através do corpo. ;Muitas companhias sobrevivem do zero e arcam com todos os custos para sua manutenção. Mas o trabalho continua, seja na ocupação de espaços públicos, faculdades, salas e auditórios espalhados pela cidade, a arte resiste e se transforma;, destaca.
O artista lembra que a dança proporciona um caminho de disciplina e comprometimento, dificilmente quem não se aprofunda chegará a alcançar lugares altos. ;É preciso sair da zona de conforto e olhar acima da cerca do vizinho, buscar entender o que se passa no mundo é a melhor maneira de gerar a constante pesquisa no que chamamos de dança contemporânea neste momento;, afirma Renato.
Tradição e renovação
Luciana Lara é um dos nomes mais fortes da dança contemporânea de Brasília e trabalhou por 28 anos ininterruptos como diretora e coreógrafa da Anti Status Quo Companhia de dança. A artista destaca que Brasília tem o potencial artístico e humano para ser um cenário forte de dança contemporânea, com tradição na vanguarda criativa. Para ela, a dança contemporânea é uma arte que nada contra a maré. ;Em tempos de velocidade, capitalismo selvagem, neoliberalismo e a moda da ideia de empreendedorismo cultural como salvação e arte como produto, garantir continuidade, experimentação e pesquisa em dança parecem ideias surreais, irreais, mas muito necessárias para o nosso desenvolvimento artístico e cultural;.
A abertura do Centro de Dança de Brasília, um antigo espaço de desenvolvimento, troca entre gerações e apresentações, é esperada com ansiedade pela bailarina e coreógrafa. O trabalho mais recente da Anti Status Quo, chamado De carne e concreto ; uma instalação coreográfica, tem viajado para se apresentar em diversas regiões do país, como a abertura do Festival Vivadança, em Salvador. Para Luciana, levar o trabalho para outras cidades e países por meio de festivais de artes cênicas ou turnês, coloca o trabalho em perspectiva.
Além de difundir e ampliar o alcance público do trabalho, a experiência é um momento de amadurecimento. A exposição do trabalho em diferentes contextos daquele em que foi produzido pode revelar novas dimensões e repercussões de seu impacto artístico, além de fomentar a autocrítica. O grande desafio é ampliar constantemente o interesse de diferentes espectadores, permitindo que um público maior tenha acesso aos trabalhos de qualidade produzidos no Distrito Federal.
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Tempo de trabalho de Luciana Lara na Anti Status Quo cia de dança
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Tempo de envolvimento de Rodrigo Cruz com a dança contemporânea