Fotógrafo da agência Magnum (organização francesa por onde passaram nomes como Sebastião Salgado e Cartier Bresson), o norueguês Jonas Bendiksen viveu em uma família em que a fé não era uma questão. Apesar disso, Bendiksen sempre foi fascinado pelos mistérios que envolviam o tema e quis entender como e por que as pessoas acreditavam.
Para isso, ele começou um projeto ousado: acompanhar homens, mundo afora, que acreditam ser o próprio Jesus, filho de Deus. Do brasileiro (e radicado em Brasília) Inri Cristo a um Messias russo, Bendiksen conviveu com esses homens e seus seguidores e tentou se aproximar da crença.
;O projeto foi um caminho para explorar a fé, entender como é acreditar e no que as pessoas podem crer. Quando descobri esses Messias, pensei que era uma oportunidade incrível. Quem iria perder a chance de ir falar com o próprio Divino?;, explica Bendiksen em entrevista ao Correio.
A pesquisa rendeu o livro The last testament, em que são retratados os supostos Messias e as pessoas que, em alguns casos, largaram toda uma vida para segui-los. A fotografia, explica Bendiksen, foi a linguagem usada para expressar as experiências que teve durante o período. ;Eu sempre tento trabalhar de forma simples e calma. Eu realmente não tenho muita ;técnica;. Meu trabalho é tentar experimentar algo e explorar as questões nas quais eu tenho curiosidade com o uso de uma câmera. A fotografia é uma língua;, analisa.
Ele conta que as pessoas, em geral, foram abertas e solícitas. Elas compartilharam com o fotógrafo as crenças e experiências que tinham e aceitaram a presença de Bendiksen naquele meio. ;Eu acho que pensaram que era uma coisa positiva eu estar ali, e realmente tentei não julgar quem estava certo e quem estava errado.;
Muito mais do que decidir o que era real ou não, Bendiksen quis tentar ver com os olhos de quem crê e imaginar como seria o mundo a partir daquele ponto de vista. ;Eu pensava: ;Vamos dizer que esta pessoa é verdadeiramente o Messias, o que o mundo parece ser a partir dessa perspectiva? Quais são as implicações para a humanidade?;;, reflete.
As pessoas que se dizem Jesus e seus seguidores não são, na visão de Bendiksen, mal intencionadas ou oportunistas. ;Eu não quero analisar demais isso, mas eu não percebi que era algo feito por poder ou ganho pessoal.; No fundo, a percepção que ele teve era de que elas realmente acreditam naquilo.
;Na maioria dos casos, as pessoas que conheci têm boas intenções. Eles tiveram uma revelação, de acordo com eles mesmos, do próprio Deus, e estão simplesmente agindo por isso, com o que creem que é o melhor para todos nós;, detalha o fotógrafo. ;No fim das contas, quem pode dizer que a teologia da palavra de Inri Cristo é menos plausível do que todas as outras coisas em que as pessoas acreditam em todo o mundo?;
No Brasil
Bendiksen veio duas vezes para o Brasil. Aqui no Distrito Federal, mais especificamente no Gama, ele conheceu e teve contato com Inri Cristo. O Messias brasileiro vive cercado de seguidores que abandonaram tudo para viver ao seu lado e defendem que ele seja, de fato, Jesus.
A visão que o público, em geral, tem de Inri não é compartilhada pelo fotógrafo. ;As pessoas geralmente têm um monte de ideias e preconceitos sobre Inri e seus seguidores, que provavelmente derivam de todo o material que está on-line;, acredita. Segundo ele, os discípulos de Inri são pessoas inteligentes e reflexivas, que encontraram ali um significado para a própria vida.
Eles tiveram também paciência e disponibilidade para falar extensamente com o fotógrafo. Durante a visita de Bendiksen, os discípulos e Inri passaram bastante tempo conversando e expondo ao fotógrafo as crenças que têm. ;Eles realmente levaram muito a sério a tarefa de explicar a sua posição e teologia, e me mostraram seu mundo.;
Depois de conhecer tantas pessoas que têm a fé como um ponto fundamental para a vida, uma pergunta se torna incontornável para o fotógrafo: ele passou a acreditar? E a resposta é não. ;Eu não posso dizer que a minha própria arquitetura pessoal mudou. Ainda sou o racionalista e cético que sempre fui. Mas tive uma oportunidade de tocar e sentir o que é a fé ; e vejo que, em vários aspectos, ela é uma coisa mágica e bela em muitos casos;, justifica.
O mais difícil de tudo, revela Bendiksen, é deixar agora o projeto para trás e voltar para a vida cotidiana. ;Foram algumas das experiências mais memoráveis da?? minha vida e foi muito especial visitar esse mundo mágico. É difícil agora voltar para minha própria cinza e normal existência comum;, garante.
"O projeto foi um caminho para explorar a fé, entender como é acreditar e no que as pessoas podem crer;"
Jonas Bendiksen, fotógrafo