Quando entrou na primeira sala da exposição Entre nós ; A figura humana no acervo do Masp, o historiador e professor da Universidade Regional do Cariri, no Ceará, Darlan Reis, pensou primeiro na quantidade de brasileiros que não têm acesso à arte. Encantado com a primeira sala da exposição ; na qual estão, lado a lado, obras de Pierre-Auguste Renoir, Pablo Picasso, Vincent Van Gogh, Amadeo Modigliani, Edgar Degas, Paul Gaugin e Paul Cézanne ; queria que o Brasil inteiro pudesse ver como a pintura é capaz de despertar a sensibilidade. ;Fiquei pensando em como seria se as pessoas tivessem mais acesso;, conta. ;Eu, que moro no interior, percebi o quanto tudo isso está distante da população. Arte e cultura são importantes para a reflexão.;
A história social e política da sociedade encontra reflexos na arte, e o professor ficou surpreso com o que viu na segunda sala. A mostra reúne obras do acervo do Museu de Arte de São Paulo (Masp) em torno do tema corpo. A ideia é mostrar como as representações do corpo aparecem em várias escolas e momentos da produção artística mundial. E, na segunda sala, Darlan Reis encontrou o próprio tema de pesquisa: os trabalhadores. ;Muito legal, esses quadros retratam o século 19, uma época em que eles começam a retratar os trabalhadores;, explica o historiador de 45 anos, que nunca havia estado diante de um quadro de Picasso ou de Renoir ao vivo.
E ver ao vivo é algo que o economista Guilherme Irffi aprendeu a saborear ao visitar museus no Brasil e no mundo. ;Van Gogh é uma coisa que nunca achei que veria ao vivo, mas no Masp ,tem;, diz o economista. ;Ver ao vivo é importante. A priori, você pensa que tudo isso está muito distante de você, mas é factível de ser visto. A sociedade brasileira não tem o hábito de frequentar museus, mas quando sai do Brasil, vai. Isso é uma coisa que tem que ensinar desde a escola.;
Viagem
Entre nós ; A figura humana no acervo do Masp reúne 100 obras selecionadas pelos curadores Rodrigo Moura e Luciano Migliaccio dentre a coleção da instituição paulista. A ideia é provocar o diálogo entre diferentes nomes, épocas e escolas da história da arte por meio da maneira como abordaram a representação do corpo humano. É um tema amplo que permite uma verdadeira viagem por séculos de produção artística.
Em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), a exposição tem algumas obras de referência do acervo e está dividida em núcleos que vão desde a abordagem religiosa até a fotografia contemporânea, passando pelo modernismo, pelas escolas brasileiras, pelo retrato e pela representação do trabalho.
[SAIBAMAIS]
Estudante de mestrado em história, Luciana Biffi já conhecia uma parte da coleção, mas ficou surpresa com a abordagem. Exposições com clássicos europeus nem sempre propõem um diálogo com tema atemporal e Entre nós consegue trazer o passado para o mundo de hoje. ;Esses modernos dialogam com o nosso tempo;, garante Luciana, ao observar a banhista de Pierre-Auguste Renoir. ;Somos, ainda, muito modernos. As preocupações deles são parecidas com as de hoje, questões como o corpo, gênero. São questões que agora estamos aprofundando, mas que começam no século 20.;
Fã de Modigliani, a historiadora não se cansa de observar o retrato do italiano. ;Querendo ou não, são artistas muito famosos, mas a grande questão é o contato com a obra, ter o corpo a corpo, ter uma perspectiva do tamanho, porque você pode olhar na tela do seu computador, mas, às vezes, não percebe o tamanho. E o contato com a obra desenvolve a sensibilidade;, acredita. É, também, o que acredita o servidor público Gabriel Borges, que ficou feliz de ver um Renoir ao vivo. ;Sou mais fã do clássico. Van Gogh tinha uns probleminhas de visão. Picasso é mais voltado para o moderno, para a novidade, para o cubismo. Gosto mais desse clássico;, afirma, diante da temática da banhista produzida pelo mestre francês.
Importância
Para a professora Joelma Nascimento, que dá aulas de artes na rede pública de ensino, a exposição é uma oportunidade de ensinar mais aos alunos sobre arte brasileira, já que há um núcleo com pintores nacionais. ;Gosto muito de Renoir, de Van Gogh e de Picasso, mas sinto que, no Brasil, tendemos a valorizar as coisas de fora e gosto de dar importância ao que é nosso;, diz a professora, que foi à mostra com a filha, Luiza, 13. ;A exposição é fantástica, dificilmente você vai ver uma mostra que conjuga todos esses artistas.;
Ela cita especialmente o retrato O menino, de Arthur Timótheo da Costa, um óleo sobre tela de 1917 feito por um dos poucos artistas negros a ingressar na Escola Nacional de Belas Artes no final do século 19. O retrato também fisgou o olhar de Aldamir Scaramella. A pedagoga não conhecia o pintor. ;É uma maravilha aquele menino;, disse. A exposição já passou pelos CCBBs do Rio de Janeiro e de Belo Horizonte, onde foi visto, respectivamente, por 244 mil e 159 mil pessoas. Em Brasília, a média de visitação tem sido de 3 mil pessoas por dia, com fluxos maiores entre o final da tarde e a noite.
Entre nós ; A figura humana no acervo do Masp
Abertura hoje, às 19h30, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Visitação até 18 de setembro, de terça a domingo, das 9h às 21h.
;Van Gogh é uma coisa que nunca achei que veria ao vivo;
Guilherme Irffi, economista