Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Em entrevista, Djavan fala sobre trajetória profissional e show em Brasília

O cantor Djavan conta, em entrevista, como quase se tornou jogador de futebol

Poucos sabem, mas a música popular brasileira quase perdeu um dos seus mestres para o futebol. Na adolescência, em Maceió, Djavan Caetano Viana, filho de um vendedor ambulante e de uma lavadeira, foi meio de campo do time juvenil do CSA e poderia ter feito carreira profissional. Mas prevaleceu a paixão pelo violão, instrumento que aprendeu a tocar aos 16 anos.


Os pais, que costumavam ouvir Ângela Maria e Nelson Gonçalves em casa, o queriam militar e pensavam encaminhá-lo à Academia das Agulhas Negras, em Resende (RJ). Sem se entusiasmar pela ideia, ele os driblou, fugindo para a casa de um parente, no Recife. E foi lá que se decidiu pela carreira de artista.

Aos 23 anos, depois de se radicar no Rio de Janeiro, Djavan decolou para a fama e o sucesso. Em trajetória de quatro décadas, transformou-se numa importante referência da moderna MPB. A data vem sendo celebrada desde fevereiro de 2016, com a turnê do show Vidas pra contar, nome também do seu 20; álbum de estúdio. O cantor e compositor alagoano lançou ainda um disco gravado ao vivo, com 2 milhões de cópias comercializadas, e outros quatro lançados no exterior e voltados para os mercados de língua inglesa e espanhola.

Vidas pra contar, assistido pelo brasiliense no primeiro semestre do ano passado, no auditório master do Centro de Convenções Ulysses Guimarães, está de volta amanhã, às 22h, àquele palco. Djavan, que assina a direção do espetáculo, tem a companhia em cena da banda formada por Carlos Bala (bateria), Marcelo Mariano (baixo), João Castilho (guitarra e violão), Jessé Sadoc (trompete e flugelhorn), Marcelo Martins (flauta e saxofone) e Paulo Calasans (piano e teclados). No repertório, as canções do novo CD.



Entrevista // Djavan


É lenda ou verdade a história de que, antes de se tornar artista, você quis ser jogador de futebol?
Sempre gostei de futebol e desde criança jogava minhas peladas. Entre os 13 e 15 anos eu fui meio-campista do time juvenil do CSA e achavam que eu tinha algum talento. Mas aos 16 anos, descobri o violão e me apaixonei pela música. À época, estava morando em Recife, com um primo, fugindo de casa apavorado, porque meus pais queriam me mandar para a Academia das Agulhas Negras, em Resende (RJ). Quando voltei para Maceió, decidido a ser cantor, eles aceitaram a ideia. Aí, com amigos, fundei a banda LSD, que fazia cover dos Beatles e passamos a tocar em bares. Paralelamente, eu fazia shows solo de voz e violão, e um dos lugares onde me apresentava era o restaurante A Portuguesa, no CRB, clube rival do CSA.

Naquele tempo você já compunha alguma coisa?
Comecei a compor aos 18 anos, mas não era nada que tenha valido a pena. Daquela produção inicial, guardei apenas a canção Quantas voltas dá meu mundo, que incluí no repertório do A voz, o violão, a música de Djavan, o meu disco de estreia, lançado em 1976. Aí, eu já estava morando no Rio de Janeiro.

Você enfrentou dificuldades quando chegou ao Rio, disposto a conquistar seu espaço na MPB?
Inicialmente, não tive facilidade. Não conhecia ninguém, mas procurei me situar. O Adelson Alves era um radialista famoso naquela época que apresentava o programa O amigo da madrugada, na Rádio Nacional. Fui à emissora incontáveis vezes para mostrar o que estava fazendo. Até que um dia, me ouviu cantar. Mas me desencorajou, ao dizer que seu programa era voltado para o samba tradicional e que a música que eu fazia não se adequava à programação. Aí sugeriu que eu procurasse o João Melo, na Som Livre. O João também achou minha música ;estranha; e perguntou se eu não fazia algo semelhante aos sambas da dupla baiana Antônio Carlos e Jocafi, que estava em voga. Por meio dele, conheci Waltel Branco, que também era produtor da gravadora. Ele disse que, minha música realmente era estranha, mas que eu não mudasse nada.

Seu primeiro disco saiu pela Som Livre. Quem foi seu padrinho artístico naquele momento?
Por meio do João Melo e do Waltel, João Araújo, pai do Cazuza e diretor da Som Livre, tomou conhecimento de Fato consumado, uma das primeiras músicas que compus no Rio. Ele não só a inscreveu no festival Abertura, em 1975, como se tornou meu tutor. Ele, por exemplo, avalizou o aluguel do apartamento que passei a morar. Aí, pude trazer minha mulher para morar no Rio. Fato consumado ficou em segundo lugar no festival e as coisas começaram a acontecer para mim.

Mas, naquele período inicial, você cantou em boates da Zona Sul Carioca. O sustento vinha dali?
Por três anos, eu cantei na noite carioca, nas boates Number One e 706. Eu era crooner da banda de Osmar Milito, músico de muito prestígio. Mas eu só me tornei conhecido naquele meio. Quem me conhecia elogiava bastante minha interpretação. Houve até a tentativa de produzir um show em que seria acompanhado por Hélio Delmiro, Luizão Maia e outros músicos da banda de Elis Regina. Ensaiamos bastante, mas o show, que ficou bonito, não ocorreu, por falta de público.

O A voz, o violão, a música de Djavan, seu primeiro disco foi determinante para que um número maior de pessoas tomassem conhecimento do seu trabalho?
Com certeza. Embora eu tivesse incluído Fato consumado no repertório, a música que alavancou o LP foi Flor de lis, que viria a se tornar meu primeiro sucesso. É uma música que passei a cantar em todos os meus shows, até hoje.

Você teve boa acolhida dos companheiros de ofício, na primeira fase de sua carreira?
De alguns, sim. O Caetano Veloso, que fez show numa das eliminatórias do festival Abertura, quis conhecer mais do meu trabalho. Alguns artistas consagrados começaram a pedir música. Fiz A ilha, para Roberto Carlos; e Álibi, para Maria Bethânia. Essa canção deu título ao disco dela de 1980, que vendeu 1 milhão de cópias. Bethânia foi a primeira cantora da música popular brasileira a chegar a esse patamar de vendagem. Com o Chico, fui a um festival em Cuba e, na volta, compusemos em parceria Alumbramento, nome também do meu terceiro disco; e gravei com ele A rosa, nesse disco.

É com Caetano que você mais dialoga musicalmente?
São muitos os momentos na música em que Caetano e eu estamos juntos. Em Sina, me refiro a ele na frase de um verso ao cantar ;como querer caetanear;. Ele também gravou essa música no disco Cores e nomes, e retribui dizendo ;como querer djavanear;. Já em Eclipse oculto, ele canta ;desperdiçamos os blues de Djavan;; e em Eu te devoro, volto a ele afirmando ;noutro plano, te devoraria tal Caetano a Leonardo di Caprio. Somos parceiros em Linha do Equador (melodia de Djavan e letra de Caetano), que faz referência a Brasília e virou um clássico; e Invisível, gravada por Maria Bethânia, mas que não ficou muito conhecida.

Quais são seus discos mais emblemáticos?
O primeiro, sem dúvida, por me apresentar por inteiro ao público, que teve produção de Aloísio de Oliveira. Foi ele que escolheu Flor de lis, entre as mais de 60 que o entreguei, como música de trabalho. O segundo, Luz, que trazia músicas como Açaí, Pétala e Samurai e a participação de Steve Wonder, vendeu 600 mil cópias e me fez chegar a um número bem maior de pessoas também é muito importante em minha discografia. E cito ainda o Djavan ao Vivo, de 1999, que atingiu a marca de 2 milhões de cópias comercializadas.
Em Milagreiro, de 2001, há a participação de Cássia Eller. Como e quando a conheceu?
Lembro que a conheci numa dessas reuniões de artistas. Sempre gostei da voz, da interpretação e da atitude dela. Era uma cantora de grande força interpretativa. Na música Milagreiro, ela mostrou que tinha completo domínio do universo do flamenco. Me emociono ainda hoje quando ouço o duo que fizemos.

A turnê de Vidas pra contar é a mais longa das feitas por você?
Estou na estrada desde fevereiro de 2016 e prossigo até julho. Método de trabalho é o seguinte: durante um ano, cuido de criar composições e gravá-las. No outro, depois de lançar o disco, saio em turnê com o show. Mas o Vidas pra contar continua recebendo tantos pedidos para ser visto em cidades onde não foi apresentado; e, para voltar a outros lugares onde estive, como Brasília, que decidi continuar fazendo, mesmo já estando com a cabeça em novo projeto.

O show o traz de volta a Basília num momento em que a capital federal vive em completa ebulição, principalmente na área política. Como analisa esse momento da vida do país?
O Brasil está vivenciando um período inédito, purgando nossas mazelas, dentro de uma nova ordem constitucional. Tudo o que não queremos é a velha política, cheia de vícios. Precismos reverter essa situação, com uma política progressista, com uma agenda que tenha como foco a educação, a saúde, a economia, colocadas a serviço da população, do bem-estar do povo; e não apenas dos privilegiados. Não é fácil, mas dia menos dia, com a participação de todos cidadãos, isso vai acontecer.

Vidas pra contar

Show de Djavan e banda. Sábado, às 22h, no auditório master do Centro de Convenções Ulysses Guimarães (Eixo Monumental). Ingressos: R$ 240 (vip fã), R$ 180 (vip), R$ 140 (especial), R$ 80 (pista) ; valores referentes à meia- entrada. Pontos de venda: G2 do Brasília Shopping e www.eventim.com.br. Não recomendado para menores de 16 anos. Informações: www.facebook.com/VivaMPBrasília.