"Sou humano e tudo que é humano me diz respeito.; É com esta frase, dita por Alexandre Ribondi, que o jovem ator Gustavo Haeser, guia seus passos pelo entendimento do que é ser artista. Aos 19 anos, o brasiliense estudante de artes cênicas venceu o Prêmio Sesc do Teatro de Candango de 2016 ao lado de sua primeira professora de teatro dentro do mundo acadêmico, Giselle Rodrigues, que se consagrou, neste ano, como melhor atriz da premiação. Parte de diferentes gerações que trilharam os caminhos da produção cultural da cidade, os artistas mostram que a cena teatral do Distrito Federal é forte, criativa e consolidada. A poética do envelhecer e a vivacidade da juventude entram em cena e mostram que o palco promove o encontro das mais diversas e singulares trajetórias.
[SAIBAMAIS]
Giselle Rodrigues é um dos nomes consagrados da cena brasiliense. Com mais de duas décadas de pesquisa, produção e trabalho no campo das artes cênicas, a bailarina, diretora e professora da Universidade de Brasília, sentiu sede de estar novamente nos palcos. O impulso resultou no processo que culminou na peça Fio a fio. Protagonizada pela artista, a produção foi a que venceu mais categorias na premiação deste ano, entre elas: melhor espetáculo, melhor atriz, cenografia, figurino e sonoplastia.
O início da construção cênica de Fio a fio deu-se pelo desejo da artista e do colega de cena, Edi Oliveira, em criar e atuar juntos, sem que existisse a tradicional distinção entre direção e interpretação. A vontade que impulsionava a criação da dupla era experimentar de maneira livre diversos assuntos, colocando o corpo em movimento constante.
Após um intenso trabalho de improvisação, o surgimento de cenas que falavam a respeito da velhice tornou-se cada vez mais constante, direcionando os rumos da nova criação e proporcionando uma abordagem sutil e poética sobre processo de envelhecer. O experimento se coloca entre o teatro e a dança, destacando a versatilidade de seus criadores e intérpretes e Giselle lembra: ;Vejo que vou amadurecendo e me transformando a cada processo criativo. Talvez, neste momento, eu esteja mais desapegada, mais solta para o experimento, querendo arriscar;.
O caminho profissional da artista sempre esteve conectado entre a dança e o teatro. Com a criação de seu grupo, o Basirah, em 1997, o trabalho continuou a ser realizado entre a presença de atores e bailarinos, criando um campo híbrido de atuação. ;Não acredito mais nessas separações das artes cênicas. Nas artes contemporâneas cada vez mais se borram as fronteiras.;
A ideia é desenvolver um espaço de crianção cada vez mais diverso, possibilitando as nuances e encontros das mais diferentes linguagens em cena, como o teatro, a dança e a performance. ;Agora estou me dando tempo para exercitar-me mais como intérprete, e não só como diretora. Acho que isso fortalece o trabalho, ajuda amadurecer questões, rever pontos de vista.;
Juventude em cena
Giselle Rodrigues destaca que a cena teatral de Brasília está borbulhando e, além dos veteranos, cada vez mais jovens atores se mostram sedentos por criar e conquistar seus espaços. É o caso de Gustavo Haeser, o ator que dividiu com ela o prazer de ter reconhecido seu trabalho nos palcos. Haeser levou o prêmio de melhor ator com a peça Entre quartos, criada e produzida pelo talentoso grupo Tripé, composto por ele e pelos jovens artistas Ana Quintas, Davi Maia e Miguel Peixoto. O grupo se inspira nos problemas e conflitos humanos, principalmente os da juventude. Para o ator, o contato com a criação teatral começou como uma brincadeira, que continua orientando seus processos criativos.
Para Gustavo, a percepção da seriedade e do sentido sagrado do ofício do ator, além de suas aplicações práticas no cotidiano, chegaram como ponto decisivo para continuar e se empenhar cada vez mais na profissão. ;Iniciei meu processo teatral durante as aulas no Teatro Mapati e depois fui para as oficinas do Circo Íntimo, com o Abaetê Queiroz e a Juliana Drummond, que são para mim exemplos do exímio profissional das artes cênicas. Com eles, aprendiz que o teatro não se faz como fim, e sim como meio, principalmente por suas consequências na vida cotidiana;, conta o ator.
Para ele, o fazer teatral é um modo de vida, uma maneira de se colocar no espaço, entender as relações, analisar o contexto em que se vive e fazer política através da arte. ;Sou artista para conhecer pessoas, para entendê-las e saber dos seus segredos, suas formas de pensar, de agir, de se relacionar. O ser humano é meu objeto de estudo.;
O espetáculo Entre quartos ficou pronto em 2014, quando o ator tinha ainda 15 anos. Os experimentos em cena foram constantes, com dois anos de tentativas, ensaios, mudanças e demonstrações de processo. Haeser conta que o processo foi sempre intenso, forte e arrebatador. ;É uma peça que foi criada pelo desejo de fazer, pela vontade. É uma peça sobre amor, que fala diretamente com os jovens, que não são só nosso maior público, mas são os nossos amigos, da nossa idade. Nós somos o nosso próprio público-alvo.; É neles, entre jovens e adolescentes, que o artista conta ter visto ressoar aquilo que acredita e que o impulsiona no fazer artístico. Seu principal ponto de pesquisa é a arte do encontro, a criação que nasce do encontro entre o artista e o outro, que seria, talvez, o próprio espectador.
Confira os vencedores do Prêmio Sesc de Teatro Candango de 2016
- Espetáculo: Fio a fio
- Direção: Edi Oliveira, Giselle Rodrigues e Kênia Dias (Fio a fio)
- Atriz: Giselle Rodrigues (Fio a fio)
- Ator: Gustavo Haeser (Entre quartos)
- Cenografia: Roustang Carrilho (Fio a fio)
- Iluminação: Marcelo Augusto (O silêncio do mundo ; velejando solitário)
- Figurino: Roustang Carrilho (Fio a fio)
- Sonoplastia: Tomás Seferim (Fio a fio)
- Dramaturgia: Grupo Tripé e Karinne Ribeiro (Entre quartos)
- Espetáculo de rua: Poéticas urbanas (Andaime cia. de teatro)
- Espetáculo infantil: Toco (Grupo Pirilampo teatro de bonecos e atores)