Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Movimento dos barbeiros ganha força no Brasil e é retratado em filme

A nova onda se expande como a dança do passinho que tomou conta das periferias das grandes cidades. No filme Deixa na régua, Emílio Domingos revela a realidade dos salões

Há mais de 10 anos, o movimento do passinho (dança que mistura referências de vários estilos) tomou conta das comunidades do Rio de Janeiro e de São Paulo e, nos últimos anos, ganhou espaço pelo Brasil. De uma forma semelhante, o movimento dos barbeiros surgiu nas periferias brasileiras, criando uma nova cultura em relação aos salões e aos cortes de cabelo, principalmente, do ponto de vista dos homens, que, pintam as madeixas e apresentam diferentes desenhos e formas geométricas na cabeça. ;De certa maneira é algo que é sincrônico, que acontece no mundo inteiro. É um fenômeno global esse lance dos cortes de cabelo. Na periferia do Rio, eles ganham cores e estilos da cidade. Cada lugar tem o seu tempero;, explica o cineasta Emílio Domingos.

Encantado pelo movimento, ao conhecê-lo no subúrbio carioca, o diretor decidiu usar a cultura dos salões como tema do mais recente filme, Deixa na régua, que será exibido no Festival do Rio na segunda-feira e também foi selecionado para a 40; Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, com início em 20 de outubro. O longa é sucessor de A batalha do passinho (2014), exibido no Cine Brasília há dois anos durante a abertura do evento Sernegra, e faz parte de uma trilogia sobre o universo da periferia do Rio de Janeiro.

[VIDEO1]

[SAIBAMAIS]Em Deixa na régua, Emílio Domingos apresenta a realidade de três salões fluminenses. O filme é uma imersão dentro do cotidiano das barbearias mais populares da Zona Norte do Rio de Janeiro, por meio das vivências dos barbeiros Belo, Deivão e Ed, que foram acompanhados por quatro meses pelo cineasta. ;O filme surgiu durante a gravação de A batalha do passinho. Os meninos iam para o salão toda sexta-feira e isso foi algo que me chamou atenção. Resolvi conferir o que rolava e descobri que era uma experiência que durava o dia inteiro. Além dos cortes requintados, percebi que era um espaço de troca de ideias;, lembra.

Como os dançarinos de passinho, os barbeiros representam nas comunidades uma posição social pelo talento com as tesouras, as navalhas e as máquinas de barbear. A criatividade deles se revela nas cabeças dos homens, com formas geométricas e uso de cores. Enquanto isso, para os clientes, os cortes representam uma identidade estética e uma valorização da imagem. Já não bastasse a questão da autoestima em relação ao visual, as barbearias se tornaram nas periferias um ponto de encontro e de troca de ideias entre a comunidade.

Quatro perguntas // Emílio Domingos

O que representa o movimento dos barbeiros nas comunidades?

De certa maneira, representa a imagem que eles querem passar para a sociedade. Existe uma certa vaidade e uma afirmação da identidade estética. São nos salões onde as individualidades se afloram. É algo muito valorizado na periferia.

Como é a concepção de Deixa na régua?

É um filme bem diferente em relação A batalha do passinho. É um filme observacional. Eu não faço nenhuma pergunta. É tudo baseado na relação entre cliente e barbeiro. Mostra a estética e o que é feito nesses três salões. Eu convivi com os barbeiros durante quatro meses.

Para você, qual é a importância de passar esse filme em festivais de cinema?

É enorme porque quando você faz um filme você quer dividir aquelas histórias com as pessoas e enquanto não passa na tela, ele ainda não nasceu. Foi uma longa gestação esse filme. Foram quatro anos para fazer. Fico feliz de ter tido a oportunidade de ter registrados essas histórias.

Você disse que esse filme faz parte de uma trilogia. Como será essa próxima sequência?

Não foi algo pensando, um filme foi levando o outro. O próximo será sobre o universo feminino. Estou vendo os três como uma linha sobre o que está se discutindo através do corpo. Os corpos e suas ações nas comunidades, como eles são usados de forma criativa para gerar arte. No caso dos barbeiros, arte e um meio de resistência.

Expressão artística


O movimento dos barbeiros no Rio de Janeiro bebeu de muitas fontes do passinho. Dessa forma, assim como a dança, a profissão ganhou um campeonato, intitulado Batalha dos Barbeiros Brasil. Uma disputa entre barbeiros de diferentes locais do país, criada pela agitadora cultural Érica Nunes, 33 anos, mais conhecida como a madrinha dos barbeiros e responsável pela Escola de Barbeiros no Rio. ;Eu estava querendo expor o que acontece nas comunidades, esses cortes diferenciados do mundo da barbearia tradicional. A Batalha dos Barbeiros virou um movimento cultural. Porque afasta os meninos das drogas, do tráfico, com a profissionalização. Tem barbeiros que ganham até R$ 4 mil;, conta.


Érica promovia bailes no Rio e a pedido dos jovens abriu uma barbearia. Na época, ela não entendia nada de corte de cabelos. Se formou cabeleireira, montou a Batalha dos Barbeiros e resolveu ajudar os barbeiros a se profissionalizarem. ;Muitos aprenderam na raça. Eu quis fazer a Escola dos Barbeiros para ensinar não só os cortes, mas dar educação, ensinar sobre como se vestir e falar, apresentar técnicas de limpeza;, explica. Criado há dois anos, o instituto formou mais de 2 mil pessoas de diferentes estados no período. ;O movimento é muito grande no Rio, em Minas Gerais e em São Paulo. Mas está crescendo no Nordeste e em outras regiões;, garante Érica Nunes. Em novembro, ela promoverá o 2; Encontro de Barbeiros do Brasil no Rio de Janeiro.

Sobre o movimento, Érica explica que uma cultura da periferia, que modificou a barbearia tradicional. ;Hoje, as barbearias são points, onde as pessoas se reúnem. Tem chope, fliperama, venda de roupas. Vão as crianças, as mulheres... Na verdade, é um ponto de encontro onde as pessoas trocam ideias e figurinhas;, completa.

A matéria completa está disponível aqui para assinantes. Para assinar, clique aqui