Os turistas continuam descendo de seus hotéis e pegando prostitutas no Setor Comercial Sul. Pessoas em situação de rua ainda ocupam grande parte dos becos do local. O entorno do Conic, de madrugada, segue ermo e propício para a venda e o uso de drogas. Panorama real, mas fadado à reversão. Pelo menos no que depender das produções culturais, que resolveram ocupar o espaço e investir na revitalização do SCS e do Conic, um processo já em andamento e com resultados práticos motivadores.
;Brasília está acompanhando uma tendência nacional e internacional de revitalização de espaços públicos degradados;, comenta a produtora Jenny Choe, que cita o Rio de Janeiro e cidades da Europa como exemplos. Depois de colaborar com a transformação de locais marginalizados em Belo Horizonte e em São Paulo, Jenny abraçou o movimento Dulcina Vive, que intenta reconfigurar a imagem do Conic por meio de eventos, festas e intervenções culturais.
;O bacana é convidar o brasiliense a estabelecer uma relação menos comercial com a cultura da cidade. Criarmos um senso coletivo de apropriação, de ocupação;, diz. De alguma maneira, o Dulcina Vive ofereceu um exemplo positivo de interferência construtiva, e acabou por incentivar outras iniciativas. ;Quanto mais gente circulando, maior a segurança;, aposta Daniel Spot, produtor e DJ, que também passou a considerar o SCS como cenário para as produções noturnas. ;Uma das premissas da Madre, nossa produtora voltada para o áudio, o social e o visual, é justamente ocupar os espaços largados, investir nas localidades que, supostamente, não são feitas para festas. Quem disse que não?;.
Olhar urbanístico
As propostas culturais, assim como o movimento noturno dos bares, a presença dos food trucks, entre outras ações, começam a ser apoiadas pela Prefeitura do Setor Comercial Sul, entidade de natureza privada responsável por repassar ao governo as principais demandas da região. ;Onde não há gente, não há coisa boa. Essa disposição em aumentar o movimento noturno revigora o espaço, auxilia na melhoria das estatísticas de criminalidade;, endossa Fernando Raposo, prefeito do SCS. Ele salienta que o poder público também interveio recentemente, colaborando com o quadro: ;Foi feito o ajuste viário dos acessos internos, soluções em paisagismo foram pensadas e a iluminação, renovada;.
No primeiro semestre do ano passado, foram registrados oito homicídios por ali. Em 2016, durante o mesmo período, nenhuma ocorrência dessa natureza foi constatada. Os roubos a pedestres e a veículos também caíram. Assim informou à reportagem a Secretaria de Segurança Pública e Paz Social do DF, que atribui a significativa queda nos índices às ações articuladas em prol da restauração do SCS.
Mas ainda é preciso ir além até que a população, de fato, perceba o SCS e o Conic como lugares apropriados para o lazer e para o convívio social seguro. O arquiteto Felipe Alencar defende que um estudo profundo da região seja conduzido de forma a diagnosticar as reais mudanças a serem implementadas. ;Precisamos compreender os fluxos de movimentos ; de pessoas, de carros, de tipos de público, de elementos naturais ; que caracterizam o local. Então, poderemos melhor entender o que se pode aproveitar, o que se pode eliminar e o que se pode adicionar;, esclarece.
Em uma rápida análise, Felipe levanta algumas questões: ;A acessibilidade para deficientes é precária. A falta de vagas segue problemática. Precisamos nos perguntar: é possível chegar lá com facilidade? Como estão as condições básicas de uso desse espaço? Aqueles que moram fora do Plano têm condições de aproveitar essa programação noturna?;.
O arquiteto concorda com a implementação de uma iluminação adequada e não questiona a influência de um belo projeto paisagístico e urbanístico para o SCS, pelo contrário, mas faz um lembrete: ;Não adianta investir só na maquiagem. Por mais lindo e estruturado que seja um parque, se não há frequência, permanecerá tomado pela marginalidade e pela insegurança. É preciso gerar movimento;. Um ciclo que, aparentemente, começa a tomar forma.