Roger Mello sempre foi fascinado por mapas. Ilustrador premiado nove vezes com o Jabuti, ele encara a arte da cartografia como uma combinação perfeita e indissociável entre imagem e palavra. Se há uma superfície na qual as duas são quase a mesma coisa é no traçado de um mapa. Nada mais natural, então, do que escolher um copista como protagonista de W, primeiro romance do autor, cujo lançamento está marcado para hoje na Livraria Cultura. Não há ilustrações no livro e esse detalhe tem um propósito: a matéria de trabalho do protagonista era também alvo de alta confidencialidade nos tempos das grandes navegações. Logo, o mistério da imagem é necessário. Assim como a linguagem da Mello na narrativa.
O copista, que o leitor passa a conhecer apenas como W, trabalha ao lado de um cartógrafo, como assistente que, além de reproduzir (muito bem) o trabalho alheio, ajuda na confecção dos pigmentos e é responsável por preparar os pergaminhos que vão receber os mapas. A história se passa em Lisboa (Portugal), mas, segundo Mello, poderia ser em qualquer lugar. O tempo, como indica a importância da cartografia, é colonial, mas também há ousadias do autor ao sugerir um tempo flexível e embaralhar a certeza do leitor quando coloca o copista dentro de um avião rumo ao Pacífico. ;O livro se passa em qualquer lugar;, avisa o autor. ;Em tese, é em Portugal porque a Casa da Mina era em Portugal, mas o personagem está num não lugar. O lugar é o tempo. E quando você pergunta quem ele é, sou eu também. Mas não tenho nada a ver com esse personagem, não sou tão conturbado.;
W viaja por meio do mapa. Não chega a sair de Portugal fisicamente, mas mergulha nas navegações que levam a lugares distantes e, na maioria das vezes, desconhecido. Já Mello é um viajante real. Não há nada de imaginário nos 14 países que visitou no ano passado e dois deles são especialmente caros ao autor. ;Sou o rei do nomadismo;, brinca.
O próprio Mello não sabia ao certo onde a história iria levá-lo. Nem o personagem. ;Como a história é toda feita de vai e volta, de pistas, de digressões e de simulações, talvez o personagem falsifique também as informações. E algumas podem ser pistas falsas;, avisa.
W
De Roger Mello. Global Editora, 136 páginas. R$ 39. Lançamento neste sábado (3/3), às 16h na Livraria Cultura.