Diversão e Arte

Costa-gavras conta bastidores do Urso de Ouro de Tropa de Elite

Cineasta fala ao Correio sobre o avanço da internet, da selvageria do liberalismo econômico e da esquerda pelo mundo

Rodrigo Fonseca - Especial para o Correio
postado em 19/05/2015 08:02

Costa-Gavras:

Cannes (França) ; Papa dos thrillers políticos, hoje com 82 anos, o cineasta franco-grego Costa-Gavras deu uma pausa no roteiro de seu novo longa-metragem (sobre o mal-estar moral do Velho Mundo) para vir ao 68; Festival de Cannes cumprir duas missões. A primeira é diplomática: o realizador de sucessos como Missing (1982), O quarto poder (1997) e O corte (2005) veio à Croisette como representante oficial da classe cinematográfica francesa numa ação da Comissão Europeia da Cultura em combate à pirataria e ao dowonload ilegal de filmes na internet, causando polêmica ao defender uma revisão do processo de democratização dos meios digitais.

A segunda missão é artística: lançar a versão restaurada do clássico que o projetou mundialmente, Z, de 1969. Ganhadora dos Oscars de melhor filme estrangeiro e melhor montagem, a produção ; baseada no assassinato do deputado grego Grigoris Lambrakis em 1963 ; revolucionou as narrativas de suspense, com sua movimentação de câmera quase delirante, com um pé na linguagem documental.

Ao rever Z na mesma telona de Cannes, de onde saiu com o prêmio do júri há 46 anos, Costa-Gavras sentiu que um outro episódio trágico da Europa precisa com urgência ser retratado pelo cinema: os atos de violência fundamentalista por trás de episódios como a chacina no jornal Charlie Hebdo, em Paris, em janeiro.

Nesta entrevista exclusiva ao Correio, ele explica o porquê do tema ser abordado, assim como fala da condição ética da esquerda hoje e contar os bastidores da conquista do Urso de Ouro por Tropa de elite, de José Padilha, no ano no qual ele presidiu o júri do Festival de Berlim.

No domingo, a Comissão Europeia de Cultura trouxe o senhor a Cannes para discutir a tomada de novas medidas acerca da pirataria no cinema. O que ficou decidido?
Vim aqui para mostrar que os produtores de cultura devem ser os primeiros aliados dessa atitude da Comissão Europeia, que deseja apenas falar da democracia no acesso à imagem. Portais importantes de busca na internet, como Google e Yahoo, não são inimigos de quem faz cinema. Eles são aliados que levam cultura cinematográfica às pessoas. O importante é saber como os governos europeus querem fazer para facilitar o acesso das pessoas ao consumo dos filmes fora dos meios digitais.

O senhor acredita que a atividade cinematográfica se enfraqueceu com novas plataformas de exibição digitais na internet, hoje mais próximas da tevê, como o Netflix?
Não é questão de enfraquecer. Hoje, existem muitas plataformas e a televisão é a que, talvez, mais tenha se beneficiado da ocupação de espaço nos meios digitais. Muita gente migrou para a televisão e eu mesmo já tive um projeto, há muitos anos, de fazer um telefilme de cerca de quatro horas sobre o Caso Dreyfus, um episódio de traição política que marcou a França no século 19. Mas era numa época na qual o máximo que alguém poderia pensar em fazer com o formato telefilme era um produto de duas horas. Hoje, pelo que vemos das séries americanos, essa noção de tempo mudou. Talvez seja hora de eu me reposicionar e retomar aquela ideia. Mas, antes, tenho um filme para terminar de roteirizar e quero acompanhar esse resgate de Z que começa aqui em Cannes.

[SAIBAMAIS]O senhor trouxe uma grande alegria ao cinema brasileiro ao conceder o Urso de Ouro a Tropa de elite, de José Padilha, quando presidiu o júri do Festival de Berlim em 2008. O senhor inclusive foi homenageado por ele no segundo filme, numa cena em que mostra o filho e a ex-mulher do Capitão Nascimento saindo de uma retrospectiva de seus filmes, num cinema de rua no Rio. O que mais lhe impressionou no longa de Padilha?
Fora suas qualidades técnicas impecáveis como narrativa, Tropa de elite mostra o que pode ocorrer de desastroso para uma sociedade quando o governo confere à polícia controle sobre suas ações. Falaram que o filme era fascista? Não, não. O que ele faz é denunciar o fascismo ao mostrar desajuste de um agente da lei cercado de poderes absolutos. Quando falei dessa minha percepção para meus colegas jurados, a decisão de premiar Tropa; foi imediata, agradou a todos e foi precisa.

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