Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Cantores se arriscam como escritores e lançam primeiros livros da carreira

Enquanto Alceu Valença publica poesias reunidas, artistas da nova geração reúnem colagens e comentários sobre composições

A música e a literatura podem compor boas parcerias. No último mês, quatro artistas anunciaram obras literárias: Alceu Valença, Karina Buhr, Letícia Novaes, da banda Letuce, e Lucas, do grupo Fresno. A maioria dos artistas apresenta em seus materiais poesias, crônicas e pensamentos. Alguns acabam levando a experiência musical para as páginas, seja com canções e composições, seja contando experiências sobre o repertório da carreira. Conheça um pouco sobre o trabalho de cada um deles nos livros.

A estreia de Alceu


[SAIBAMAIS]No ano passado, o cantor Alceu Valença estreou como diretor com o longa A luneta do tempo, exibido no festival Cine PE. Este ano, decidiu lançar-se na literatura pela primeira vez com O poeta da madrugada, livro que reúne poesias do intérprete de La belle du jour. Algumas composições do seu vasto cancioneiro e que não haviam sido musicadas também entraram na publicação, a exemplo de Sino de ouro.

As poesias não são exatamente uma novidade na vida de um dos mais importantes cantores brasileiros em atividade. Ele as escreve desde 1969. Frequentador de saraus desde menino, no interior de Pernambuco, Alceu optou pela composição musical, mas nunca abandonou os escritos que tanto lhe davam prazer e que, como o nome da obra sugere, são frutos de madrugadas em claro. (Colaborou Luiza Maia)

O poeta da madrugada
Chiado Editora, 160 páginas. Preço médio: R$ 28.

Literatura antes da música


Baiana de nascença e pernambucana de coração, Karina Buhr está entre os cantores que decidiram se enveredar no mundo literário. A pedido de um editora, ela escreveu Desperdiçando rima, primeiro livro da carreira, que será lançado na Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP) em julho. ;Fiquei muito feliz porque, apesar de escrever bastante, acabo jogando minha energia no meu trabalho como cantora. Se fosse por minha iniciativa, viria um livro sim, mas não seria agora;, conta Karina Buhr.

A obra reúne crônicas, poemas, desenhos e textos inéditos da artista. Apenas a letra de Falta de sorte, gravada pela banda Comadre Fulozinha, da qual Karina faz parte, representa o lado compositora da baiana. Desperdiçando rima mostra a faceta de Karina Buhr como escritora, que, na carreira de cantora, está latente em suas composições. ;É uma forma de conhecer mais as coisas que escrevo. Alguns temas do livro vão acabar virando música;, adianta.

Desperdiçando rima
De Karina Buhr. Editora Rocco, 192 páginas. Preço médio: R$ 24,50.

Duas perguntas // Karina Buhr

O livro traz contos, cartas, poesias, crônicas e desenhos. Como foi o seu processo de criação do material?
A maior parte do livro é de material inédito. Tem alguns textos que foram publicados na coluna que tenho na Revista da Cultura, mas de toda forma, quando passei pro livro, já fui modificando também eles. E as ilustrações são todas inéditas.

Além de você, outros cantores costumam se enveredar no campo da literatura. Acha que é uma tendência?
Não acho que seja uma tendência, acho que as pessoas sempre fizeram de tudo um pouco. No meu caso escrever veio bem antes de cantar e é também uma coisa que faço com mais propriedade que cantar. Inclusive costumo falar que só canto porque são minhas letras e músicas, que se fosse pra eu ser uma cantora de repertório de outros compositores eu não seria cantora. Escrevo desde sempre e depois passei a canalizar isso fazendo as letras das músicas dos meus trabalhos, tanto o solo, como em banda, como a Comadre Fulozinha e o Eddie, lá pelos anos 90.

Histórias da infância


Letícia Novaes, a vocalista da banda Letuce, também lançará o primeiro livro da carreira neste ano. Zaralha ; Abri minha pasta é um sonho antigo da cantora que sempre teve o costume de guardar agendas, diários e anotações desde a infância. ;Queria muito fazer um livro com essas coisas. Em Zaralha, tem exercícios da minha infância, da época que eu lidava com a dislexia, imagens, mensagens de celular engraçadas, colagens... É uma forma de mostrar minha construção humana;, explica.


Com previsão de publicação em agosto, Zaralha ; Abri minha pasta está passando por um processo de financiamento coletivo no Catarse, site de crowdfunding. Letícia precisa arrecadar R$ 23 mil para a impressão de dois mil exemplares. Os apoios variam de R$ 35 a R$ 175 e ainda há opção de doar R$ 10, mas sem direito ao livro. ;Essa editora é nova e tem apoiado novos artistas. Se fosse ser um livro só de poesia, seria barato. Mas como terá imagens e colagens, tudo isso encarece a obra. Já fiz isso antes com um álbum do Letuce e achei que seria uma boa ideia;, afirma.

Zaralha ; Abri minha pasta
De Letícia Novaes. Editora Guarda-Chuva. Preço médio: R$ 35.

Autobiografia musical


Para o cantor Lucas Silveira, vocalista da banda Fresno, o primeiro livro, Eu não sei lidar, é uma autobiografia musical. A obra passeia por 16 canções compostas em diferentes momentos da carreira da banda gaúcha. O frontman do grupo também ilustra cada capítulo.

;Mesmo escrevendo as músicas de forma direta, várias pessoas entendiam as canções de um jeito totalmente pessoal, muitas vezes mais interessantes do que a interpretação que eu tinha;, conta. Mas os textos fogem de explicações literais. O objetivo do recém-lançado escritor é construir uma narrativa não-linear, contextualizando as composições com memórias que o moldaram como artista.

Eu não sei lidar
Editora Dublinense, 160 páginas. Preço médio: R$ 32,90.

Duas perguntas // Lucas Silveira, do Fresno

Considera o livro inteiramente autobiográfico?
Só não digo que é um autobiografia porque ela tem recortes de momentos, e não a descrição detalhada deles. Achei engraçado vê-la na seção memória em alguns sites. Mesmo escrevendo as músicas de forma direta, várias pessoas entendiam as canções de um jeito totalmente pessoal, muitas vezes mais interessantes do que a interpretação que eu tinha. Comecei a sentir a necessidade falar disso. A galera tinha esse demanda, saber o que me motivou a escrever cada canção. As pessoas acham que eu vivo uma vida muito espetaculosa a ponto dela gerar as músicas, quando na verdade é uma vida normal. A diferença é que escrevo sobre o cotidiano, por isso o nome Eu não sei lidar. Tento encontrar nas pessoas um espelho daquilo que escrevi. Sabe aquela cena dos Alcoólicos Anônimos quando o cara chega, conta tudo o que está passando e os colegas entendem tudo aquilo, por vivem a mesma coisa? O livro é mais ou menos isso. Somente quando a obra estava na metade eu percebi que parecia uma autobiografia.

Quando sentiu a necessidade contar essas histórias por trás das canções?
Acredito que toda vez que uma pessoa ouve uma música e presta atenção em uma letras, aquilo bate em ti de alguma maneira, há identificação momentânea. Se o cara esta apaixonado e ouve uma música sobre amor, a partir daquele momento, se eu explicar a ele que a fiz por outra maneira, não mudo o sentido que aquelas palavras ganharam para ele, nem mudo a experiência que ele teve. Foi necessário expandir o significado para o fã entender a música de uma maneira diferente. As histórias deixam claro quem eu sou, pois escrevo sem nenhuma barreira. Falo sobre minha mãe, sobre como eu era no colégio; Tudo isso explica como cheguei a cada música.

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