Há sete anos, Tabet encabeçava aquele que é o canal mais acessado e relevante do YouTube Brasil, o Porta dos Fundos, que já conta com mais de 1,5 bilhão de visualizações. ;O Gregório (Duvivier, parceiro do empreendimento) disse uma vez que sou a pessoa que ele conhece que mais flerta com o sucesso;, explica. Se Duvivier está certo ou não, o fato é que o toque de Antônio Tabet, 40 anos, publicitário, roteirista, ator, produtor e apresentador de tevê, costuma fazer com que tudo dê certo. Em entrevista ao Correio, Antônio Pedro Osório Tabet ; o Kibe ou Tabet ; fala sobre a ascensão do Porta dos Fundos, as polêmicas do canal e a importância da internet.
Carreira
A comunicação, de um forma geral, está muito integrada. Quando fala em um microfone de uma rádio, você está atuando de alguma forma; ao fazer uma campanha publicitária, está sempre escrevendo. O processo criativo não é muito diferente. O que difere é a forma do conteúdo, a linguagem. Eu sempre me vi como roteirista. Hoje em dia, consigo produzir o que gosto e não o que minha profissão me obrigava. É muito melhor fazer algo como o Porta dos Fundos do que um slogan para a televisão.
Sucesso do Tabet
Gosto de fazer internet para um público grande. Tem muitos que fazem para nicho, para galerinha de Twitter. Não quero isso. Quero internet para o povão. Quanto mais, melhor. Quero a inclusão digital, que, para mim, sempre foi boa. Não tenho essa falsa vaidade de fazer conteúdo hipster. Sabe aquela galera que gosta de uma banda e quando ela fica conhecida não gosta mais? Pois é, não penso assim. Quero fazer sucesso, e eu consigo enxergar o mérito e o valor no que é popular.
Cinema
Este ano, vou participar de cinco longas. O primeiro estreia em 26 de fevereiro. Depois, faço uma participação como vilão no filme B.O. ; Boletim de ocorrência, que também conta com Cléo Pires. Vai ser meu primeiro filme sério. Para mim, é muito legal, é uma estrutura muito maior e é bom trabalhar com outras pessoas. Você não fica preso a uma única coisa.
Talk-show
O talk-show que eu fiz na TBS (canal por assinatura) é diferente. Muitas vezes, os convidados dão entrevista sem saber que estão sendo entrevistados. Tivemos que gravar essa ;pegadinha; antes de ir ao ar. Acredito que existem várias formas para se diferenciar nesse meio. Sou amigo dos três apresentadores dos maiores programas de entrevista (Rafinha Bastos, Danilo Gentili, Jô Soares). Acho que cada um tem uma maneira completamente diferente. Sou muito fã do Jô, acho que ele é um dos maiores comediantes da história do Brasil.
Sucesso do Porta
Acho que não é pelo fato de ser feito na internet que o Porta dos Fundos faz sucesso. O diferencial é o conteúdo, o roteiro, a filmagem e a edição. Tudo é bom. Se ele tivesse surgido na tevê, certamente teria repercussão positiva, pois a televisão é uma espécie de lareira da sala. Talvez, ele encontrassse um pouco mais de resistência, porque a audiência é compartilhada ; você assiste ao lado da sua mãe, do seu pai; Na internet, as pessoas se permitem ver e ouvir coisas sem se preocupar com o constrangimento de outras, é um veículo mais direto. Naturalmente, como produzimos algo com qualidade de tevê para a web, as pessoas fizeram muito essa associação. Nós somos o poste mijando no cachorro. Agora existem programas tentando fazer o que nós realizamos na tevê, mas eles vão ter que ir além, pois sempre vamos estar um passo a frente.
humor mastigado
Não adianta fazer exatamente como a gente, tem que tentar chegar a pessoa que quer atingir, e isso que é difícil. Por exemplo, o brasileiro gosta de bordão. Apesar de nenhum vídeo ter um desses, as pessoas formaram uma espécie de bordão para o Porta dos Fundos, com frases ditas em um vídeo, uma única vez, como o ;errou feio, errou rude;. A tevê se acostumou a fazer um conteúdo muito mastigado, pois sempre subestimou, de certa forma, o próprio público. Então, fez algo mais ruminável por entender que, talvez, os espectadores não sacariam. No início do Porta dos Fundos, quem parava a gente na rua era o executivo de terno e gravata de 50 anos, agora, é o office boy, é o cobrador de ônibus. A integração digital permitiu que chegássemos a esse ponto, quanto mais pessoas acessam a internet, mais isso vai aumentar, e é por isso que programas de humor estão passando por reformulação.
Internet
A internet é fundamental para a exposição de conteúdo, pois você pode se tornar um editor de si mesmo. É uma catapulta para o lançamento de pessoas que, em outros tempos, não poderiam aparecer, pois não havia espaço. Acabou isso de assistir apenas o canal 10, o 12, o 6, o 4. Quem tem celular pode ser produtor, editor, distribuidor, tudo ao alcance da mão. Abriu uma porteira cujo critério é a meritocracia, se você sabe fazer algo bom e produzir algo bom, não precisa mais fazer teste de sofá nem mais ser amigo do amigo para ter uma chance.
Na televisão
A gente nunca disse não à tevê, demos não a diversas propostas. Por que? A gente nunca precisou dela. Acontece que até então, as propostas não nos agradavam, não eram financeiramente ou editorialmente boas. A Fox foi a primeira que nos agradou e, de certa forma, também era a mais confortável, pois usamos, em um primeiro momento, vídeos já publicados na internet. Foi muito bom, atingimos um público que não está na internet. Triplicamos a audiência deles ; foi maior do que Os Simpsons, no mesmo horário.
na Justiça
Não houve muitos embates. O que houve foi uma ou outra pessoa normalmente tentando aparecer ou se fazer notar na mídia, querendo chamar a atenção da Justiça. Mas, normalmente, quando faz isso, a pessoa tenta desvirtuar o conteúdo e acaba expondo um preconceito que ela mesma tem. Nunca houve preconceito em nada que a gente fez. Em via de regra, esses problemas acabaram caindo por terra. Há, no imaginário, que somos processados diariamente, que tem um oficial de Justiça de plantão em nossa porta. E isso não é verdade. Nós fomos acionados pouquíssimas vezes e, em todas, a Justiça intercedeu ao nosso favor. Nenhum conteúdo é postado sem reflexão. Isso passa por uma primeira visão, revisão, por uma série de filtros. Somos cinco criativos pensando, revendo os prós e os contras.
Conservadores ?
A sociedade brasileira não é conservadora, ela é hipócrita. Ela é muito conservadora ou liberal quando é interessante ser. Quando entra um terrorista na Charlie Hebdo e um cartunista inocente é morto, todo mundo posta no Facebook: ;Je suis Charlie;. Quando Os Simpsons fazem um desenho sacaneando o Brasil, é capaz de ter invasor no Twitter do criador pra intimidar o cara falando que: ;Aqui é Brasil, p****;. Enquanto a Dilma defende a liberdade de expressão, lembro do Lula querendo extraditar jornalista porque o cara falou que ele tinha problema com bebida. Então, na verdade, não somos conservadores, somos hipócritas. Ninguém é conservador no carnaval. Ninguém é conservador entre quatro paredes.
Criticar o criticável
Nossa ideia é criticar o que é criticável. Até porque dentro do Porta, não temos essa ambição de criar uma consciência política em quem nos assiste. Nós mesmos somos um grupo bastante heterogêneo. Por exemplo, eu penso de um jeito e o Gregório de outro. Ainda assim, adoro o que ele escreve e ele adora o que eu escrevo. Há vídeos que parecem um manifesto da direita e outros que parecem ser de esquerda, mas nosso objetivo é fazer rir, o que o espectador vai fazer depois disso é problema dele.
Humor é arte?
Humor é arte, é proposta, é anestesia, é educação. Costumo receber e-mails de professores agradecendo, pois os alunos passaram a se interessar por determinado assunto que foi abordado no Porta dos Fundos ou no Kibe Loco. O humor é escape, é protesto, é dedo na ferida, talvez seja a mais completa forma de arte. O humor mata com gente ilesa.
Limites
Não se deve ter limite para o humor, quem deve ter limite é o humorista. Você tem o direito de fazer a piada sobre o que você quiser, mas tem que arcar com as consequências disso. Vivemos num mundo maluco. Fazer humor é que nem dirigir de madrugada: sinal verde, você pode passar a 100km/h se aquilo for permitido. Eu sou aquele cara que mesmo sabendo que posso passar a 100km/h, vou olhar para um lado e para o outro para ver se dá para ir.
Com informações de Mateus Vidigal