Diversão e Arte

Vira Lata da Via Láctea: Tom Zé debate o funk e o sertanejo universitário

O artista volta o olhar para a geração Y, acostumada a ter o ritmo moldado pela internet, além de tentar prever o que ditará os costumes do futuro

postado em 03/11/2014 08:04 / atualizado em 19/10/2020 14:42

O artista volta o olhar para a geração Y, acostumada a ter o ritmo  moldado pela internet, além de tentar prever o que ditará os costumes do futuro

No novo disco Vira Lata da Via Láctea, Tom Zé prevê o futuro por meio de um importante oráculo: as novas tecnologias que moldam o ritmo da Geração Y, que, inclusive, dá nome à primeira faixa do álbum. Para o profeta da cidade baiana de Irará, o que virá da atual geração não será diferente das gerações Z, Saúde e Coca-cola. “Daqui a alguns anos / vamos ter de governar, infelizmente governar / Oh, e os nossos ideais, ai, quem diria / no mesmo camburão da burguesia / Uma renca de parentes atender / nos ritos e delitos do poder / Puta, que tragédia / desaba sobre nós! / logo depois que a ilusão tem voz”, canta.



Em entrevista ao Correio, o compositor discorreu sobre a importância de prestar atenção ao que nasce, às novidades, sem torcer o nariz, sem preconceito. Não acredita que o compartilhamento de músicas pela internet seja um problema para o artista e diz que procura reinventar-se a cada novo trabalho.



Neste novo disco, você confirma uma característica sua que é a reinvenção. É necessário sempre se reinventar? Como consegue isso?
Eu não sei direito como os outros artistas pensam. Eu só penso em gravar um disco, quando tenho interesse de falar de algum assunto. No caso desse disco era a Geração Y, esquerda, grana e direita. Eu também tinha feito a música Retrato na Praça da Sé, então, ficou cheio dessa Via Láctea.

O que você acha dessas novas tecnologias que marcam a Geração Y retratada na primeira faixa do disco?
Tenho uma tendência para ter curiosidade, para me aproximar de toda geração que começou a tocar. Eu fui da geração do tropicalismo e, em 1970, começou o rock, e por todas as outras gerações que apareceram eu tive interesse. E, além disso, tem uma coisa que eu acho muito simpática, porque na minha infância era uma coisa muito sacrificada naquele mundo em que eu vivia em Irará, na Bahia. Na cidade com 3 mil habitantes, a ética era uma coisa falada no dia a dia das pessoas. Eu ouvia os adultos conversarem, meu avô, ou outros fazendeiros. Então, uma das coisas que essa juventude coloca em primeiro lugar na sua relação com o mundo é uma ótica de respeito. Essas coisas me interessam muito, além do que as outras gerações já me conquistavam.

Você fez análises de algumas músicas de funk, sertanejo… Essas músicas se encaixam nisso também?

Essa coisa da música Tô ficando atoladinha é o seguinte: no mundo, a mulher é maltratada em todo lugar. E, principalmente, no universo particular da música funk, onde a mulher, quando entra no espaço onde vai acontecer o baile, tem que assinar um papel, autorizando a fazerem o que quiserem com ela… Não sei se isso continua. E, logo lá, é que foi surgir um grito de liberdade muito significante da questão sexual, em que a mulher é sempre maltratada. Eu cheguei a fazer um disco sobre essa coisa da segregação do amor… E nessa música Tô ficando atoladinha tem aquele refrão, que é excepcional, que é o “metarefrão microtonal plurissemiótico”, que é um grito.

Sobre essas novas categorias de sertanejo universitário, forró universitário, como você avalia isso?
Uma vez, eu fui lá na Paraíba e o Chico César disse: “Forró, matéria plástica, com dinheiro público, não!”. Quando cheguei a São Paulo, fiz uma carta pra ele e disse: “Rapaz, não faça isso, não. Toda coisa nova que acontece, mesmo quando parece que é apelativa, muitas vezes tem qualidade muito grande. Eu, às vezes, peço aqui à secretária que busque músicas de forró que chamam de “matéria plástica”… E já vi muita música que tive inveja e mostro para as pessoas e digo “olha que coisa linda, olha que ritmo interessantíssimo”. Então, sempre que vou ouvir, acabo encontrando coisas boas. Um estilo não se forma sem uma agregação de pensamento criativo que transforma aquilo em algo que todo mundo acompanha e chama, justamente, de estilo. O estilo não se forma à toa. E a gente deve ouvir tudo.

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