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Viúva de José Saramago fala ao Correio sobre livro inacabado do marido

Alabardas, alabardas, espingardas, espingardas, romance inacabado do Nobel de Literatura, acaba de chegar às livrarias brasileiras

postado em 26/10/2014 05:55

Pilar del Rio admite pensar mais na morte depois da perda do companheiro

O novo romance do escritor português José Saramago chegou às livrarias brasileiras, em setembro, com um alarde a mais além do título, que destaca em letras vermelhas trecho extraído da obra Exortação da guerra, de Gil Vicente: Alabardas, alabardas, espingardas, espingardas!. Acontece que Saramago morreu antes mesmo de concluir a história. A publicação do livro causou celeuma entre os críticos. Segundo eles, dificilmente o autor publicaria algo antes da finalização. A viúva do mestre, Pilar del Río, no entanto, afirma que se trata de uma obra acabada. Ela diz que Saramago finalizou as páginas, embora não tenha conseguido terminar o romance em si. A edição contém notas do autor com descrições dos passos da construção da narrativa, ideias, detalhes e dúvidas a respeito do título.

Antes de acabar o romance, Saramago, no entanto, sabia bem como terminaria. ;Creio que poderemos vir a ter um livro. O primeiro capítulo, refundido, não reescrito, saiu bem, apontando já algumas vias para a tal história ;humana;. Os caracteres de Felícia e do marido aparecem bastante definidos. O livro terminará com um sonoro ;Vá à merda;, proferido por ela. Um remate exemplar;, escreveu Saramago em uma das notas que compõem a publicação.




A história não terminou como Saramago previu. Aliás, não terminou. Faltou, inclusive, um ponto final ; o que deixa o texto tão aberto, que o crítico português Alberto Gonçalves sugere que Alabardas inaugura um novo gênero, o de romances ;praticamente por começar; e conclui: ;Meia dúzia de críticos hão de considerar estarmos perante um momento de ruptura na cultura universal;. No entanto, o estilo consagrado do polêmico escritor acaba se destacando, como sempre ocorreu antes mesmo da publicação de seus livros. O debate acerca da temática das obras começava logo no anúncio de lançamento de um romance.

;Num certo sentido, Alabardas consagra de fato o estilo do Nobel, que em vida fazia questão de anunciar, ele próprio, o caráter polêmico de cada livro antes mesmo de o livro chegar ao público. Devido a condicionantes óbvias (a morte do autor), agora o anúncio da polêmica ficou a cargo de terceiros, mas o processo é idêntico e com uma vantagem: se o hábito consiste em privilegiar a algazarra em detrimento do conteúdo, desta vez o conteúdo quase não existe e a algazarra abunda. Saramago vintage, de fato. E, desde que ignoremos os pechisbeques anexos, a minha obra preferida dele. As outras não se liam em horas. Conto não ler esta em 20 minutos;, diz o crítico.

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Entrevista / Pilar del Río

Ele chegou a revisar o texto? Acredita que ele publicaria um livro sem revisar?
Não sei se faria, porque nunca vou interpretar quem não está aqui. Sei, isso sim, que os capítulos que ele deixou estão acabados. Também sei que era fiel leitor de obras cujos autores não puderam terminar, como Camus e Mann.

A maioria das críticas sugere que Saramago não teria revisado o texto. E que isso comprometeria a obra. Como avalia isso?
O texto estava revisado, pronto. O autor ia mudar de nome e a morte veio quanto estudava outra frase. Digamos que o planejamento estava em finalização também, como se pode ver nas notas.

Como você vê que os textos complementares de Roberto Saviano, Fernando Gómez Aguilera e Luiz Eduardo contribuem no texto de Saramago?
Como disse um editor brasileiro na apresentação em Lisboa, o diálogo se produz no livro porque o autor não está aqui para mantê-lo fora. Estes três autores completam a função ética de Alabardas, a de dar uma porrada nas consciências adormecidas de tanta gente. Saramago estabelece a função literária e abre caminho para os demais.

Passou a ver a morte de uma maneira diferente depois que ele morreu?
Talvez a desejá-la mais. E que seja tão natural e tranquila como a que ele teve.


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[SAIBAMAIS]

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