Se você é um dos 23 mil seguidores de Fernanda Takai no Instagram ou se leu as crônicas que publicou entre 2005 e 2011 no Estado de Minas, deve se lembrar de sua filha Nina, hoje com 10 anos, personagem constante em suas fotos e textos. Pois foi essa menina uma das responsáveis por estimular a cantora a apostar em seu lado compositora ; antes restrito ao Pato Fu ; ao gravar o quarto álbum solo, ;Na medida do impossível; (Deck/Natura Musical), lançado esta semana. A artista voltou a escrever música com maior frequência, dependeu menos do marido para fazer letras (John Ulhoa, colega no Pato Fu, ficou a cargo da esmerada produção e dos arranjos) e assumiu riscos ao lidar com agendas de outros artistas concorridos.
;Quis eliminar essa coisa de não gravar músicas minhas fora do Pato Fu. Comecei a quebrar isso no meu disco solo ;Luz negra;, no qual gravei a canção ;5 discos;. Pensava que poderia esvaziar o repertório da banda, mas fiquei pensando que seria interessante me conhecerem mais de perto e passou a me incomodar o fato de eu ficar conhecida só como intérprete. A Nina ficava me perguntando se essa ou aquela música era minha e eu dizia: ;Não, filha, essa é de outra pessoa;;, conta a cantora.
Para resolver esse ;dilema ético;, Fernanda resolveu chamar outros músicos para o disco e não escrever canções com John. ;Isso me deu alento. As pessoas vão enxergar qual é minha parte no Pato Fu como intérprete e compositora, será uma espécie de filtro;, observa. Ela afirma que o período em que atuou como cronista semanal no jornal ajudou a mostrar que ela era capaz de escrever sobre assuntos muito pessoais e com frequência. ;Antes, fazia harmonia e melodia e as palavras ficavam mais com o John, a partir de um rascunho de letra ou um tema. Estou mais à vontade para escrever;, diz.
[SAIBAMAIS]Foi assim com ;Doce companhia;, versão em português feita por ela mesma para a canção original da cantora norte-americana Julieta Venegas (;Dulce compañia;), que a brasileira conheceu ano passado e recebeu em sua casa para jantar. A faixa abre o repertório do disco, formado por miscelânea pop e bem-amarrada de parcerias (Pitty, Marcelo Bonfá, Charles di Pinto), estilos (new wave, brega, música católica, rock britânico), convidados (padre Fábio de Melo, Samuel Rosa e Zélia Duncan) e algumas releituras (como a da surpreendente ;Amar como Jesus amou;, de Padre Zezinho).
Videogame ;Deu trabalho definir a ordem dessas músicas. Escrevo o nome delas num papel, recorto e fico montando uma seguida da outra, para ver se o final de uma fica bem ao ser encaixado com o início da outra. Como se fosse um quebra-cabeça ou capítulos de um livro de contos;, lembra Fernanda. Também deu trabalho conseguir liberações de músicas de terceiros (como ;Pra curar essa dor;, versão de John para ;Heal the pain;, de George Michael) e, principalmente, alinhavar as participações especiais de Samuel Rosa (Skank), Zélia Duncan e padre Fábio de Melo. Isso para não falar da banda base, que conta com PJ (baixista do Jota Quest) e Glauco (baterista no Tianastácia), além do marido (violão, guitarra e vários instrumentos).
Sem dúvida, o convidado que primeiro chama a atenção é padre Fábio, que interpreta com a artista uma das canções mais conhecidas do cancioneiro católico, ;Amar como Jesus amou;. Fernanda estudou quase sempre em escolas católicas e, aos 8 anos, levava o violão para as aulas de religião para tocar essa e outras músicas. ;Quem tocava algum instrumento levava para a sala, era leve, um jeito diferente de encarar a religião;, avalia. Quando conheceu Fábio, percebeu que pensavam do mesmo jeito em relação ao tema.
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;Gosto do tom de voz dele e de como conversa com as pessoas. Não como padre, mas como um irmão mais velho. Um tom de humanidade como o papa tem trazido não só para os católicos, mas para o mundo. Padre Fábio representa isso no Brasil, essa igreja moderna, mas próxima da humanidade;, afirma Fernanda. O religioso aceitou o convite para gravar sem ter ouvido o arranjo, elaborado pelo japonês Toshiyuki Yasuda, com sons que parecem ter sido extraídos de videogame. ;Depois de ouvir a canção finalizada, ele disse que foi a melhor coisa que eu poderia ter feito pela música;, orgulha-se.
Sem chacota Já ;Mon amour, meu bem, ma femme; (Cleide), sucesso na voz do ídolo brega Reginaldo Rossi, é outra surpresa do disco. Zélia Duncan e Fernanda já haviam cantando juntas essa música em 2011 e para o registro atual foi providenciada uma releitura com gosto caribenho. ;Agora, ela está com um arranjo fino, classe A. Muita gente acha que essa música é algo menor, mas não vejo assim. Depende do jeito que você a apresenta para o público. Não quis fazer chacota e isso não quer dizer que quis deixá-la melhor;, diz. O Pato Fu, lembra, também já gravou música brega: ;Uma lágrima; (Odair José).
;Pra curar essa dor;, ótima versão em português feita por John para ;Heal the pain;, hit de George Michael, encerra a seção de participações. A faixa, que certamente vai tocar muito no rádio, teve Samuel Rosa a dividir os microfones com Fernanda. Completam o repertório faixas como a ótima ;De um jeito ou de outro; (letra dela e música de Marcelo Bonfá, no momento oitentista do disco), ;Como dizia o mestre; (de Benito di Paula; ;dá para fazer um disco em tributo a ele, como fiz com a Nara Leão;) e ;You and me and the bright blue sky; (com Charles Di Pinto), que remete imediatamente ao pop inglês.
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Depois da Copa
Por enquanto, Fernanda cuidará da divulgação do novo disco, deixando para fazer shows depois da Copa do Mundo. ;Gostaria que ocorresse como foi com meu disco solo ;Onde brilhem os olhos seus;. Quando fui para a estrada, todo mundo já estava amando as músicas;, recorda. Paralelamente, o trabalho com o Pato Fu continua e a artista revela que já tem quase todas as músicas que estarão no próximo disco da banda, que será só de inéditas. ;Ainda não gravamos nada, porque cada integrante está envolvido com seus projetos pessoais;, justifica. Não se sabe qual será a sonoridade do trabalho, que terá John como produtor.
Todas as faixas
; Doce companhia (Dulce compañia) ; Julieta Venegas, com versão em português de Fernanda Takai
; Como dizia o mestre ; Benito Di Paula
; De um jeito ou de outro ; Fernanda Takai e Marcelo Bonfá
; A pobreza (Paixão proibida) ; Renato Barros
; Seu tipo ; Fernanda Takai e Pitty
; You and me and the bright blue sky ; Fernanda Takai e Charles Di Pinto
; Mon amour, meu bem, ma femme ; Cleide (com Zélia Duncan)
; Quase desatento ; Fernanda Takai, Marina Lima e Climério Ferreira
; Amar como Jesus amou ; Padre Zezinho (com padre Fábio de Melo)
; Liz ; Robson e César de Merces
; Partida ; Fernanda Takai
; Pra curar essa dor (Heal the pain) ; George Michael, com versão em português de John Ulhoa (com Samuel Rosa)
; Depois que o sol brilhar ; Mary