Nahima Maciel
postado em 15/03/2014 10:50
Elifas Andreato ainda não sabia ler nem escrever quando começou a desenhar. Garoto, aos 15 anos trabalhava na Fiat Lux e fazia charges para o jornal da fábrica de fósforos. Graças a uma assistente social atenciosa, evoluiu. A qualidade do desenho o elevou a decorador do salão de baile da fábrica. Também era responsável pelas músicas ouvidas durante as festas. Foi nessa época que colocou Dois na bossa, de Elis Regina e Jair Rodrigues, no toca-discos. Desde então, a música brasileira mudou bastante, mas o gosto de Andreato continua o mesmo. Autor de mais de 700 capas de LPs, CDs e DVDs para os nomes mais importantes da música brasileira, ele permanece atuante na indústria fonográfica, mas com menos gosto do que nas décadas em que Chico, Gil, Caetano, Caymmi e Vinicius eram as estrelas. ;Continuo fazendo coisas com parceiros que têm o que dizer, mas nos últimos anos a indústria fonográfica praticamente deixou de existir. Tem muita coisa nova acontecendo, mas boa parte não me agrada. Não ouço e não gosto;, avisa. ;Tem gente produzindo coisas muito boas e gente nova surgindo, gente com talento. Mas o que se está produzindo hoje e que faz muito sucesso em redes sociais e programas de TV é muito ruim. A música brasileira hoje é muito ruim.;
Três perguntas
Na apresentação do site do Almanque Brasil, você fala que acredita em um país melhor. Como seria esse Brasil?
Dediquei os melhores anos da minha vida à construção de uma pátria mais justa, mais generosa com suas crianças e mais solidária, com mais igualdade e menos concentração de riqueza. Isso é uma praga que assola este país: você tem uma concentração de riqueza nas mãos de tão pouca gente e a grande maioria do povo desassistido. Melhoramos um pouco, mas tudo é muito devagar. Acho que a democracia precisa de tempo. E eu sempre me lembro das conversas que tinha com Betinho e sempre chegávamos à mesma conclusão: se a gente não arrumar a educação nesse país a gente não vai consertar esse trem. E aí eu dizia: ;Mas a gente faz tão pouco;. Ele respondia: ;Elifas, você tem que se lembrar da fábula do beija-flor e do leão;. O leão zombava do beija-flor com seu biquinho tentando acabar com o incêndio da floresta. Quando questionado, o beija-flor respondia ;eu estou fazendo a minha parte;. Sinto-me assim.
Você diz que não gosta do que ouve hoje. Por que?
Nós sempre importamos não só o comportamento, mas também o lixo produzido fora sem se preocupar muito em adaptar. O que se tem produzido hoje na área da música é muito ruim. E tem, infelizmente ou desgraçadamente, uma popularidade incrível. Tem jovens compositores e cantores que levam milhares de pessoas para seus eventos, mas não vejo na obra dessa gente algo consistente a ponto de permanecer na história da música brasileira.
Por que as pessoas gostam?
É um enigma para mim. Quando vejo alguns desses jovens cantores mobilizando centenas de pessoas em shows e ouço o que estão cantando me assusto, porque é uma tremenda de uma besteira, letras com um besteirol incrível. Aí fico em dúvida: será que envelheci e, de repente, isso é o que está rolando mesmo? Mas não consigo engolir essa música produzida hoje no Brasil com esse enorme sucesso. E a mídia, especialmente a televisiva, vive disso: o povo gosta, o povo canta e você entope os programas da TV brasileira. Vejo pouca TV, não me arrisco porque corro o risco de ver uma coisa que vai me deixar de mau humor. Recentemente vi essa tal de (Valesca) Popozuda num coral do Banco do Brasil cantando com uma voz que não dá nem para entender direito a letra, acho que é uma coisa de beijinho no ombro. Vi no Facebook e três ou quatro dias depois tinha 25 mil de seguidores.
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