Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Cannes: irmãos Cohen contam história do folk, mas deixam Dylan de fora

O filme agradou, mas os Cohen não conseguiram explicar muito bem como vão lidar com tão ultrajante omissão



Dylan não foi o primeiro, mas por ser o herdeiro mais bem sucedido da tradição da música de raiz norte-americana, é como se antes dele, todos os que investiram no veio tivessem sucumbido ao amadorismo, ou no máximo, alcançado algum restrito sucesso. "Dylan é uma presença massacrante", diriam os franceses do Studio Canal, distribuidores do filme dos irmãos americanos.

Greenwich

Bem, o filme dos Cohen não tem propriamente uma história, mas envolve o espectador no universo particular do cantor e violonista folk Llewyn Davis. Ele erra pelas ruas do Greenwich Village, na segunda metade da década de 1950. Vagueia de esquina em esquina por um período quase totalmente ignorado pela maioria dos fãs e historiadores do gênero, os quais costumam cortar caminho passando diretamente de Peter Seeger (ao menos um predecessor sempre lembrado nas biografias do famoso astro) a Bob Dylan. É uma cena original, formada por músicos amadores, sinceros e entusiastas, que fazem quase um voto de pobreza em nome do folk. Sobretudo, cultuam os sons da América rural e detestam um já existente "pop-folk", apontado como música comercial e enquadrada. Weavers e Harry Belafonte, entre seus representantes. É gente arredia que toca por gorjeta, olhando para os próprios pés, sem qualquer preocupação com afixar nome em cartaz.

Pelo filtro sempre muito particular por meio do qual os irmãos Cohen fazem seu cinema, o que lhes interessou foi a relação tortuosa de Llwynn com a vida, onde a música e a ambiência em torno dela são mais importantes do que uma história fechada. O original Llwyn Davis, o músico Dave Van Ronk (de cuja autobiografia nasceu o filme), obviamente perdeu o interesse no gênero quando este se democratizou e virou um produto comercial. Restou-lhe a fama de ser uma das figuras de destaque da corrente inicial.

Um dia, pesquisando sobre seu tema favorito na livraria Folklore Center, no Greenwich Village, Dave Ron Ronk cruzou por um jovem récem-chegado a Nova Iorque. Era janeiro de 1961. A partir dali a história do folk e da música popular americana nunca mais seria a mesma.