Os corpos dos bailarinos estão enfileirados no chão, completamente nus. Só não rodopiam no ar porque as páginas do livro (ainda) não permitem uma experiência tridimensional. Mas seus torsos, pernas e movimentos engenhosos parecem superar a distância regulamentar com o leitor, mantida pela frieza do papel. As palavras da autora do livro, a bailarina Luciana Lara, também ganharam uma bossa diferente. Foram coreografadas. Pouco antes de completar 25 anos à frente da Antistatusquo Cia. de Dança, ela lançou, na última semana, a obra Arqueologia de um processo criativo, que, apesar do nome pomposo, faz o contrário de glamourizar: abre as entranhas da construção de um espetáculo, em todas as suas etapas.
;A criação envolve um volume enorme de coisas. São conversas, escritos, reflexões, mas na hora de entregar ao espectador, tudo isso fica de fora;, lamenta Luciana, que elegeu o processo da coreografia Cidade em plano para a publicação. Para ela, revelar o lado escuro que antecede a estreia permite ao público enxergar a dança por um outro viés, com mais confiança e consciência da própria percepção. Bailarinos como Yara de Cunto e Lenora Lobo, fotógrafos, artistas gráficos e equipe técnica também contribuem para este desnudamento do fértil ambiente de bastidores.