Rio de Janeiro - Na trajetória que o levou à consagração nacional, um episódio é revelador do papel de Luiz Gonzaga em prol da cultura nordestina. Mais importante emissora da América Latina na época, a Rádio Nacional exigia que os cantores e músicos de seu elenco vestissem traje a rigor em suas apresentações no auditório.
Com o sanfoneiro não foi diferente. Quando começou a fazer sucesso, era de smoking que ele se apresentava. Certo dia, porém, ele descobriu que havia uma exceção: o também sanfoneiro Pedro Raimundo, gaúcho que fazia parte dos quadros da emissora, se apresentava usando a bombacha típica dos pampas.
Gonzaga reivindicou o direito de usar um figurino que marcasse sua identidade nordestina, a exemplo do que o colega fazia com o Rio Grande do Sul. Ele apareceu na rádio com a típica vestimenta de vaqueiro da região, mas foi impedido de atuar pelo então diretor artístico da emissora, Floriano Faissal.
;Marginal, não. Roupa de cangaceiro aqui não;, teria dito Faissal. Em meados dos anos 1940, o traje típico do sertanejo nordestino ainda era associado ao bando de Lampião, morto pela polícia poucos anos antes, em 1938.
Contemporâneo de Luiz Gonzaga na Rádio Nacional, o veterano radioator e apresentador Gerdal dos Santos, que até hoje integra os quadros da emissora, confirma o preconceito. ;Existia, de fato, naquela época, na cultura urbana do Rio, uma valorização do bolero, do foxtrote, das músicas que faziam a trilha sonora dos filmes americanos e, por conta disto, um certo preconceito com relação à música nordestina. E isto se estendia à vestimenta;, diz Gerdal.
Luiz Gonzaga foi aperfeiçoando o traje, que usava em suas apresentações fora da rádio, até que conseguiu impor na emissora sua imagem e o figurino. A partir daí, pôde trabalhar com o chapéu de couro e as demais peças que haveriam de ser sua marca por décadas.