João Gilberto chega à Itália. O ano é 1963. Para os nativos, o Brasil é um lugar ;sensual e indolente;, onde se planta café, fala-se espanhol e o povo dança os ritmos latinos o dia inteiro. A bossa nova gilbertiana havia atingido apenas o restrito circuito jazzista do país. Mas a figura de João já era conhecida por alguns: no ano anterior, o diretor italiano Steno passara um carnaval no Rio de Janeiro para filmar a comédia Copacabana Palace. Música alegre, escolas de samba e blocos de rua e uma cena inusitada: ao violão, João, acompanhado d;Os Cariocas, toca Só danço samba para um salão repleto de casais que se remexem em estranhos movimentos.
Na cabeça dos milhares de italianos que foram ao cinema, o som de João era mais uma das balançantes danças tropicais. A fim de reviver os momentos divertidos da película, vários deles foram à casa de shows na qual João se apresentaria em Milão. A decepção não poderia ser maior. De um lado, a plateia tentava encaixar suas acrobacias ao ritmo. Do outro, João, atônito e constrangido, assistia a tudo. Sua bossa não era tão convidativa quanto as canções do filme.
Essa história, até então inédita, faz parte de uma compilação de textos que a editora CosacNaify colocou este mês nas lojas. Organizado por Walter Garcia, o livro de mais de 500 páginas reúne entrevistas, reportagens, artigos, documentos e ensaios sobre aquele que é considerado o criador da batida diferente que se chamou de bossa nova. João Gilberto mergulha de cabeça na obra e na estética inovadora do cantor e violonista baiano.