O produtor Eduardo Bidlovski, mais conhecido como BiD, estava em um barco no mar caribenho quando colocou para tocar o CD Francisco, forró y frevo, de Chico César. Enquanto o som rolava, o condutor da embarcação cantarolava as músicas em “jamaicanês”. Foi aí que veio o insight de BiD. “Vou fazer o disco assim! E será um disco-livro. Vamos misturar músicos brasileiros e jamaicanos!”, conta o multi-instrumentista, responsável pela produção do antológico Afrociberdelia, de Chico Science e Nação Zumbi. “Quando cheguei ao Brasil, o conceito já estava pronto na minha cabeça. Esse projeto chegou muito forte para mim. Eu tinha um monte de músicas prontas, mas decidi deixá-las mais para frente.”
E assim surgiu Bambas dois. Com grande parte das composições em inglês (a maioria escrita por BiD e Fernando Nunes, ex-baixista da cantora Cássia Eller), o álbum preza pelo ineditismo (exceto em Something, de George Harrison) neste intercâmbio Brasil-Jamaica. “A brincadeira do xote e do baião com o reggae já estava comprovada. Gilberto Gil já tinha pensado nisso. Mas fui vendo que outros ritmos, como o arrasta-pé, têm muito a ver com o ska, com o rocksteady. E o maracatu com o dancehall, com o raggamuffin. Os nossos ritmos do Norte e do Nordeste são os que realmente conversam com os do Caribe. Por isso, deixei de colocar samba e bossa nova”, explica.
“Vi Bob Marley pela primeira vez em 1972, em uma viagem com Gilberto Gil, com quem comentei: ‘Se colocasse um triângulozinho, virava um xote’”, lembra Dominguinhos no trailer do projeto, disponível em www.bambasdois.com.br. O sanfoneiro pernambucano é um dos convidados especiais do CD, que conta com Luiz Melodia, Chico César, The Heptones, Queen Ifrica e Ky-Mani Marley, entre outros.
“Em primeiro lugar, a busca foi por amigos com quem eu já tinha trabalhado e admiro”, conta Bid. “O segundo critério era escolher, dentro desse grupo, quais eram os mais autênticos em cada área. Por exemplo, quando se tratava de sanfona, era o Dominguinhos. Tambores de maracatu, era a Nação Zumbi. Percussão? O Papete, que conhece toda a cultura de pandeirão de São Luís. Para tocar a zabumba, chamei o Pitoco, que acompanha o Antonio Nóbrega”, detalha.
Making of
Em duas versões (disco-livro ou só o disco), Bambas dois foi feito “com capricho do começo ao fim”. A dedicação às músicas (refeitas até que agradassem os ouvidos dos artistas) também está no encarte especial O intrigante caso do barquinho e do produtor brasileiro no reino de Bob Marley, que inclui ensaios fotográficos; ilustrações inspiradas em xilogravura; dicionário de instrumentos musicais brasileiros e textos de Otávio Rodrigues. “O CD-livro é uma coisa mais especial do que um simples CD. É um produto diferente, que as pessoas vão querer ter”, destaca BiD.
Além do livreto, o projeto conta com um making of do disco, com imagens das gravações no Brasil e na Jamaica. O ponto alto do DVD — previsto para o segundo semestre deste ano — é o registro nos estúdios mais importantes de Kingston, Tuff Gong (da família Marley) e Anchor Studios. “Eu queria gravar em Tuff Gong de qualquer jeito. Lá tem o Grammy do Bob Marley, fotos, quadros, um órgão original Hammond, que nós usamos. Lá, as paredes falam!”
Convidado-surpresa
» A produção de um CD pode ser uma caixinha de surpresas. Com Bambas dois, não foi diferente. Para a faixa de abertura, Music for all, Bid recebeu uma visita ilustre e inesperada. “É muito louco como correm as notícias. No primeiro dia, a gente gravou com o Ky-Mani Marley. No segundo, artistas começaram a chegar ao estúdio, querendo participar, porque tinham ouvido falar do Bambas dois. No terceiro dia, The Heptones apareceram e disseram: ‘Oi, nós somos The Heptones e descobrimos que está rolando um projeto. Queremos saber o que é e se tem música para a gente participar’. Eles não estavam no plano, mas entraram no disco. Eles escreveram a música em uma noite e, na manhã seguinte, gravamos. No fim, o destino acabou botando os caras para abrir o disco”, conta.