Há tempos eles deixaram de ser locais voltados apenas para as compras. Com tanta variedade de produtos regionais, os mercados municipais tornaram-se ponto de encontro entre turistas e moradores das cidades. Não é à toa que a recomendação mais frequente, quando se visita localidades como Belém ou Recife, é a de visitar esses centros, onde é possível entender um pouco da cultura e dos costumes locais. Com oferta de roupas, artesanatos e muita comida, essas fundações carregam ainda tradição e história.
Considerado tão importante para a cidade quanto o Teatro Amazonas, o Mercado Municipal Adolpho Lisboa é um marco do desenvolvimento econômico de Manaus. Segundo a diretora de Operações do Manaus Cult, Grace Benayon, o centro foi fundado para atender as necessidades da população. ;O Adolpho Lisboa foi construído de frente para o Rio Negro, no período áureo da borracha, em estilo art noveau e foi oficialmente inaugurado em 1882;, informa.
Considerada uma réplica do extinto mercado Les Halles Centrales, de Paris, a construção possui um pavilhão central em alvenaria ladeado por dois pavilhões com estrutura em ferro fundido e forjado com pórtico de ferro rendilhado. De acordo com Grace, em 1906, o mercado foi arrendado para a empresa inglesa Manáos Markets, responsável pela construção das principais fachadas da Rua dos Barés e pelos dois pavilhões destinados à venda de carnes e peixes. O contrato foi rescindido em 1934 e o mercado voltou à administração municipal. ;Ele funciona até hoje como um centro de comercialização de produtos regionais;, descreve.
O Adolpho Lisboa foi construído no lugar onde funcionava o Ribeira dos Comestíveis, centro onde eram vendidos os produtos que até hoje são base da alimentação daquele povo, como peixes frescos e secos, carne fresca, aves, caças, quelônios, farinhas, frutas tropicais, legumes e grãos, vindos dos municípios vizinhos. ;A cidade, porém, crescia rapidamente e em pouco tempo viu-se diante da necessidade de ampliação daquele ponto de venda de alimentos;, conta Leyla Martins Leong, no livro Mercados de ferro do Brasil ; aromas e sabores. O mercado hoje está em reforma para melhorar a infraestrutura e a conservação de objetos de valor cultural.
Cartão-postal
Na mesma região do país, o famoso Mercado Municipal Ver-o-Peso é um ícone de Belém, capital paraense. De acordo com o historiador da Parátur, Paulo Almada, o nome do centro surgiu no século 17, antes mesmo de sua construção, em referência ao ato de medir o peso dos alimentos comercializados na área. Atualmente, o mercado é um complexo em que é possível encontrar de tudo um pouco. ;Existem as feiras do açaí, do peixe, da carne e dos artigos típicos, além da oferta de mercadorias no entorno;, descreve.
Almada conta que o Ver-o-Peso é o cartão-postal de Belém, um ponto de encontro para a troca de mercadorias, mas também para a troca de ideias. ;Os mercados têm função agregadora. São um espaço de socialização;, considera. Ele conta que o mercado paraense é um lugar que alimenta a cultura e os costumes com a comercialização das ervas e dos pratos regionais como a maniçoba, o tacacá (prato feito com caldo de camarão, jambu e tucupi) e os diferentes peixes. ;Sem contar os brinquedos e artigos do interior feitos com o miriti, que são uma marca registrada da cidade;, afirma.
Mistura
Como quase tudo na capital federal, o Mercado Municipal de Brasília, encravado na W3 Sul, é também uma obra planejada e totalmente integrada à proposta da cidade. Enquanto nos outros estados, os monumentos tiveram seus costumes desenvolvidos com o passar do tempo, o brasiliense foi criado trazendo um pouco dessas tradições para cá. De acordo com o jornalista do Correio Severino Francisco, autor do texto sobre o estabelecimento no livro Mercados de ferro, o interessante desse local é justamente a capacidade que ele teve em passar a fazer parte de forma harmoniosa no contexto moderno da cidade, ressaltando sempre a tradição de outros lugares.
;O projeto arquitetônico modernista de Brasília era voltado apenas para o futuro, sem contemplar as tradições. E uma cidade é formada e moldada pelas pessoas. Então, mesmo que o mercado seja planejado, ele consegue trazer um pouco dessas tradições que só foram inseridas em Brasília pelas pessoas;, observa. Na versão candanga, é possível encontrar itens como o famoso sanduíche de mortadela de São Paulo, carnes frescas, pães, bacalhau, cigarrilhas e mais uma infinidade de surpresas que merecem ser descobertas em um passeio pelo local. ;É possível encontrar um pouco das outras feiras, como o peixe maranhense, o pastel paulistano e, assim, ele vai se consolidando como um mercado de tradição, por ter ali produtos históricos;, opina.
Em Fortaleza, o Mercado dos Pinhões é destinado apenas para eventos culturais, mas no início atuava como Mercado da Carne. À época, era formado por dois galpões unidos por uma passagem coberta, conhecida como avenida. A estrutura foi montada para amenizar o clima quente da região. Ali corria o vento fresco e exalava o cheiro das carnes sangrentas de suínos, caprinos e bovinos. No entorno, como ocorre ainda hoje, eram comercializados artigos regionais como sapatos de couro, pratos típicos como cuscuz com coco, rapadura, entre outras delícias.
De acordo com a representante da Secretaria de Cultura Ethel de Paula, em 1938, a estrutura foi desmembrada e parte dela levada para a Praça Visconde de Pelotas, onde permanece até hoje. ;O Mercado dos Pinhões é um bem cultural tombado pela Prefeitura Municipal de Fortaleza;, diz.
Esqueleto de ferro
O mercado Les Halles Centrales foi encomendado por Napoleão III e projetado pelo arquiteto Victor Baltard. Com estrutura de ferro, ele ocupava uma área de 30 mil metros quadrados em que eram comercializados alimentos frescos. Atualmente, o espaço virou um complexo com shopping, jardim, locais de diversão e uma estação de metrô.
Lançamento em Brasília
O livro Mercados de ferro do Brasil ; aromas e sabores será lançado hoje no Mercado Municipal de Brasília, na 509 Sul, a partir das 20h. A obra reúne a história de seis mercados municipais brasileiros construídos com estrutura de ferro. Cada um é descrito por um escritor: Angela Barros Leal (Mercado dos Pinhões, Fortaleza); Jorge Derenji (Ver-o-Peso, Belém); Leyla Martins Leong (Adolpho Lisboa, Manaus); Marcelo Lins (Mercado São José, Recife); Ruth Levy, (Mercado Municipal do Rio de Janeiro); e Severino Francisco (Mercado Municipal de Brasília). A apresentação ficou a cargo do músico Fernando Brant.
Regional
Considerado a feijoada paraense, o prato é feito com folhas de maniva (mandioca) moída e cozida por até uma semana, tempo necessário para retirar o ácido cianídrico, que é venenoso. Após esse período, as carnes da feijoada, tais como pé, lombo e linguiça de porco, entre outras, são adicionadas ao caldo verde-escuro. Como acompanhamento, arroz e farinha.